
A bossa nova está em pauta. Pra variar, você viu primeiro no Silêncio no Estúdio. Também colocamos a bossa na mira do “Clube do Disco”, algumas semanas atrás com o Tide, do Tom. Ontem foi a vez da renomada Pitchfork abrir a caixa de ferramentas com um review do Getz/Gilberto, de 1964. Um dos maiores clássicos de todos os tempos e, provavelmente, o motivo dos gringos conhecerem bossa nova até hoje.
Apesar da nota revoltante, o review é bom – espero sinceramente que estes 0,4 décimos tirados do álbum sejam em função de alguns dos solos insuportáveis do Getz. O texto tem algumas “gringuices” burras – como dizer que, em seu debut, Gilberto fez demandas “de louco” como pedir um microfone separado para o seu violão e sua voz. Mas, no geral, o texto é bem honesto, e mostra que Andy Beta, seu autor, fez o dever de casa. O rapaz cita detalhes da trajetória de Gilberto, como seu período em Diamantina e o conturbado início de carreira. É claro que todas essas informações são de fácil acesso – ele podia tê-las obtido até mesmo em nosso especial gigantesco sobre o gênio Gilberto. Ainda assim, é muito bom ver um gringo reconhecendo nosso patrimônio cultural. Pra variar um pouco.
Claro que, ainda que com as burrices de sempre. Por falar nelas, é de surpreender que o autor tenha traduzido um dos episódios mais icônicos das gravações deste álbum, quando Gilberto cutuca Tom e pede “diga a este gringo que ele é burro” (a tradução do Andy Beta foi impagável, parabéns). O episódio (que também referenciei em texto recente, aqui) aconteceu por divergências entre João e o gringo (Getz) em relação à escolha dos takes. É evidente que João deveria estar certo.
No final, não vou me estender muito nos detalhes do disco (que são muitos), porque isso é mais um “review do review“, mas é sempre bom lembrar que a trupe de brasileiros que invadiu os estúdios da Verve (Tom, João, Astrud, Milton Banana e Sebastião Neto – não creditado) produziu uma verdadeira revolução com a explosão internacional da bossa nova. Até hoje, lendo o review da P4K, dá pra perceber que a complexidade harmônica da bossa, casada aos vocais balbuciados, fora do tempo convencional e sem nenhum vibrato, é algo que entra na cabeça dos gringos. Deveria entrar na nossa também.
E é sempre bom lembrar, neste lugar, de Astrud. A “voz oficial” de todo esse contexto. A primeira mulher a ganhar o Grammy de Gravação do Ano, justamente na primeira gravação de sua vida: a versão em inglês de Garota de Ipanema. Astrud se separaria depois de Gilberto, mantendo o nome, e faria carreira nos EUA. Mas ainda sinto que é uma penas ela não ser tratada no Brasil como o que realmente é: a voz quintessencial não apenas da bossa nova, mas da canção brasileira.
Me convençam do contrário.



