
Eu já tinha até esquecido a sensação. Como é sua banda favorita lançar um disco foda? Acho que a última vez que vivi isso foi em 2009 quando, obcecado por Animal Collective, recebi o Merriweather Post Pavillion – uma obra prima.
Não é que eu não tenha bandas favoritas surgidas depois disso. Mas são poucas, e das quais infelizmente espero mais um hiato ou uma ruptura do que um novo álbum genial (uma rara exceção talvez seja a Big Thief).
Seja como for, Stereolab voltou com seu primeiro álbum de inéditas em 15 anos. A banda nunca terminou oficialmente, então isso não constitui um revival. Mas o meu ceticismo vinha de outro lugar. Como todos já devem saber a essa altura, Stereolab é uma banda muito singular, ao mesmo tempo que eclética. É a banda que consegue a raridade de mudar radicalmente de estilo e, ao mesmo tempo, manter uma assinatura inconfundível.
Por essas e outras, algumas coisas da banda, especialmente depois da morte de Mary Hansen em 2002, soam meio repetitivas. Por essas e outras também, eu sempre digo que a banda não nunca se apoiou exclusivamente nos álbuns de carreira pra soltar o seu melhor e mais diverso. Já falei isso em um estudo exaustivo publicado neste site no início do ano. No entanto, em 2025, com mais de 30 anos de carreira, a banda solta um disco que certamente poderá ser listado entre seus melhores álbuns oficiais (junto com Emperor Tomato Ketchup ou Dots And Loops). E eu não tô brincando.
Isso se dá, em partes, porque a banda realmente se reinventa aqui. Traz camadas menos repetitivas de loops, as guitarras estão mais marcadas e “cruas”, algumas músicas tem um “falso fim” (sendo seguidas por uma espécie de epílogo instrumental), etc, etc. Ou seja, há novidades aqui. Que já começam em Aerial Troubles, canção que reproduz o jogo vocal que Laetitia fazia com Hansen, mas com um arranjo bem mais direto e reto, com a guitarra explorando um riff melódico chicletudo durante quase toda a música. A canção também é responsável por um videoclipe magnífico em IA – até a presente data, a melhor produção audiovisual que já vi sendo feita com plataformas de inteligência artificial.
O disco segue maravilhoso, sem pontos fracos. Se Electrified Teenybop! resgata a sinfonia de synths que se ouviu em EPs da banda como Space Age Bachelor Pad Music, canções como Transmuted Matter e Flashes From Everywhere entregam melodias e refrões melódicos inesquecíveis. Essa última retoma o talento melódico da banda para acessar o big pop dos anos ’60 de um jeito até novo. Esemplastic Creeping Eruption é outra canção onde a guitarra exerce papel central, de forma relativamente diferente do restante da carreira da banda. Outro grande destaque é If You Remember I Forgot How To Dream Pt. 1, um pizcatto-indie que sustenta um dos conceitos mais mágicos do disco – se a banda segue abordando temas sociais inspirados por seu comunismo fervoroso (sim!), isso se dá porque eles não esqueceram como sonhar. Aulas.
Instant Holograms on Metal Film traz a façanha de ser um álbum que serve de catálogo de quase todas as sonoridades que o Stereolab já nos apresentou, ao mesmo tempo em que faz isso tudo soar diferente, por mudanças significativas em arranjos, melodias e estruturas. É certamente o melhor disco da banda desde a década de 90, e mostra que bandas veteranas não precisam fazer a mesma música por 30 anos, ou ficar criando rupturas e revivals para se mostrarem gigantes.
Do alto de sua (nunca abandonada) independência, Stereolab se consolida como um desses grupos históricos, que desafiam o tempo.