
Existem momentos na carreira de uma banda em que todo mundo está meio cansado, física e artisticamente. Isso acarreta algumas separações ou guinadas no desenvolvimento de suas obras, por vezes incompreendidas. Que o digam o Metallica, Lou Reed, os Beatles e tantos outros.
Algumas vezes, esse cansaço faz o artista optar por se autoproduzir, evitando o contato com qualquer produtor ou executivo de gravadora que promova algum tipo de interferência no trabalho.
Essa talvez seja uma possível explicação para que o Black Sabbath tenha gravado em 1976 o álbum Technical Ecstasy com produção da própria banda (a bem da verdade, quem produziu foi o guitarrista Tony Iommi, com a ajuda do tecladista e arranjador Gerald “Jezz” Woodruffe, que já vinha desde o álbum anterior, Sabotage, ocupando o lugar que já foi de Rick Wakeman e posteriormente seria de Don Airey e Geoff Nicholls).
O disco é de ruptura, a começar pela arte da capa (trabalho do grupo britânico Hipgnosis, responsável pelo logo do Led Zeppelin, além de trabalhos com nomes como Pink Floyd, Rainbow, AC/DC, Scorpions, Paul McCartney & The Wings, entre muitos outros), branca com desenhos coloridos e com estética futurista, mostra dois robôs trocando fluidos enquanto se cruzam em dois sentidos de uma escada rolante. Rompe-se também a estética sombria, ainda que não seja exatamente um disco “ensolarado”, mas é mais “urbano” na temática e no som.
Com apenas 8 faixas, o disco transita em momentos de sonoridade puxada para o hard rock (conta-se que Tony Iommi andava fascinado pelo som de bandas como Queen e Foreigner, o que naturalmente não agradava aos seus colegas, mas não havia muito a fazer, dada a disposição do guitarrista em ser o mestre desta empreitada).
E o hard rock come solto já na abertura, com Back Street Kids, com Ozzy Osbourne experimentando vocais mais “rasgados” que o habitual, o que se repetiria ao longo de grande parte do disco. You Won’t Change Me vem pra relembrar dos sons um pouco mais misteriosos e sombrios, mas descamba para o baladão hard, com alguns momentos mais puxados para o progressivo, chegando a lembrar o Uriah Heep. Havia uma impressão por parte do vocalista de que a banda vinha passando por um processo de se influenciar por bandas que eram anteriormente influenciadas por eles.
Os riffs que fizeram história como uma espécie de assinatura de Iommi ainda continuavam presentes, mas o guitarrista explorou muito mais os solos neste disco, tanto nas já citadas músicas como em momentos de brilho como It’s Alright, escrita e cantada por Bill Ward e Gypsy, outro destaque do baterista, que abre a música com uma batucada de respeito.
O Black Sabbath clássico volta a dar as caras em All Moving Parts e na tradicional balada de violão e cordas que sempre dava as caras nos discos desta formação, aqui representada em She’s Gone. Já Rock n’ Roll Doctor introduz com um riff dos bons para depois cair no blues modal com direito a cowbell e piano de classic rock. Na sala ao lado de onde a banda gravava no Criteria Studios, em Miami, estavam os Eagles gravando seu Hotel California, sofrendo com a potência sonora do Sabbath, que vazava para os outros ambientes.
O disco encerra com Dirty Women, também um pouco próxima do som tradicional do grupo, mas mesclando com algumas passagens mais progressivas e viajantes em seus 7:07 minutos de duração.
O clima na banda não estava nada bom, como era de se notar, e culminou na primeira saída de Ozzy, substituído por um curto período por David Walker (ex-Savoy Brown e Fleetwood Mac, o que só provava a guinada que Tony Iommi vinha buscando naquele momento). O antigo vocalista voltaria para gravar mais um disco, Never Say Die, o último desta formação até aquele momento, que só voltaria a gravar junta décadas depois. Mas isso é história para outros clássicos.
Em 2021, o álbum ganhou um relançamento, com nova mixagem realizada por Steven Wilson e alguns bônus, com outtakes e versões ao vivo.
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