
A escala entre se vestir de guerreiro medieval e roupa do Chapolin Colorado é muito grande. No rock, metal, glam e outros subgêneros do rock, sempre nos deparamos com bandas que se levam a sério demais e bandas com molecagem. Eu, particularmente, gosto mais das bandas com molecagem. Música é uma arte e toda arte nos leva para algum lugar dos sentimentos. Se for para ouvir coisa triste, é só colocar Jeff Buckley para tocar. Se for para me sentir feliz, nada melhor que um Earth, Wind & Fire tocando em setembro.
No rock nacional, temos todos os tipos de sentimentos, ainda bem. E melhor ainda quando essa energia feliz, irreverente e leve se renova. Acidez, distorções e barulho fazem parte do rock, rocão. Aquele rock rocado que faz sucesso nas festinhas caseiras e alternativas de todo o território nacional. E quem traz esse sentimento de uma forma bastante divertida é o novo lançamento da banda Maré Tardia.
“Sem Diversão Pra Mim”, lançado hoje pela Deck, é essa renovação. Uma banda que pegou a velocidade de Johnny Ramone em uma das guitarras e Dick Dale fazendo o melhor do surf music na outra. Um amálgama completamente imprevisível que faz muito sentido quando o disco começa. E ele vai nessa toada até o fim. Tem pitadas de Television e de Plebe Rude. Um disco de post-punk moleque, de new wave travessura e de surf music sapeca.

Maré Tardia começou em Vila Velha, no Espírito Santo, em 2019, por Bruno Lozório, na guitarra e voz, e Gus Lacerda, também nas guitarras e vocais. Depois, a banda fechou sua formação com Canni no baixo e Vazo na bateria. O disco, produzido em São Paulo no Estúdio Costella por Alexandre Capilé, da banda Sugar Kane, e pelo próprio guitarrista da banda Gus Lacerda, conta com 10 músicas e acaba sem você perceber. Daqueles discos que acabam e você quer ouvir de novo. A masterização foi feita no Estúdio Tambor, no Rio de Janeiro, por Fábio Roberto.
O disco começa com “Leviatã”, um monstro colossal com um timbre de guitarra em fuzz que já te dá uma rasteira e te pega de surpresa para o que vem no disco. “Já Sei Bem” chega cheia de reverb ácido e uma melodia leve que cria um ótimo contraste criativo. Já em “Sem Diversão Pra Mim”, título do álbum, nos leva para os anos 80 do rock nacional, com um baixo marcado que certamente foi divertidíssimo para o baixista Canni gravar.
“Tarde Demais” tem um clima de rock carioca e cheiro de praia. Já em “Azur”, pitadas de shoegaze são introduzidas ao som do disco, criando uma ótima jornada até essa primeira metade do álbum. Na segunda metade do disco, temos “Nadavai”, um rock, rocão que, para mim, é um dos grandes destaques do disco. Tem cara e sabor de hit. Na sequência, uma música Joy Divisioniana chamada “Ian Curtis”. Nada melhor do que a ousadia e alegria de colocar o nome do vocalista lendário do som que você é inspirado. Adorei a sacada.
Na reta final do disco, temos “Junkie Food”, com uma introdução de baixo ardido e muito bem mixado, que traz as harmonias do surf music para o mundo do punk. Em “Não Se Vá”, uma barulheira gostosa à la My Bloody Valentine, que navega em melodias etéreas de voz e melodias não previsíveis, que me levaram para trabalhos de Sondre Lerche e bandas de Britpop. Um grande épico do disco. Música lindíssima.
E para fechar essa jornada, a sexy e cheia de malemolência “Nunca Mais”. Uma música que tem a energia de um Monza dos anos 90, com o cinzeiro cheio de cigarro. Um clima de French pop com aquela doçura da Françoise Hardy e o excelente trabalho da guitarrista brasileira Tuca em “La Question”, de 1971.
Que grande jornada é essa da Maré Tardia em “Sem Diversão Pra Mim”. Não sei para quem não foi divertido, mas para mim e para todo mundo que der esse play, será divertido demais. O rock nacional vive! E está muito feliz.
Faixas
- Leviatã
- Já Sei Bem
- Sem Diversão Pra Mim
- Tarde Demais
- Azur
- Nadavai
- Ian Curtis
- Junkie Food
- Não Se Vá
- Nunca Mais
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