Newsletter – Silêncio no Estúdio Vol. 92

26 de Abril de 2021


Bom dia, boa tarde e boa noite queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio. A newsletter desta semana é especial apenas com clássicos que se destacam na discoteca dos nossos colaboradores. Muita coisa velha, outras nem tanto, mas sempre com algo em comum: aquele “gostinho” de clássico. Discos que não saem da nossa cabeça e dos nossos corações, independente da época em que foram lançados!


IT’S A CLASSIC

Por Bruno Leo Ribeiro

UM PASSO GIGANTE

Em 1959, o grande saxofonista e compositor John Coltrane fez história participando de dois dos maiores e mais importantes discos de Jazz de todos os tempos. O Kind of Blue do Miles Davis e talvez o disco mais virtuoso, rápido e intenso disco de Jazz de todos os tempos, o seu próprio disco, o Giant Steps.

Jazz é um estilo de vida que eu venho entrando em doses homeopáticas de tempos em tempos. Eu vou indo nos discos mais clássicos que os especialistas recomendam e vou ouvindo de pouco em pouco pra não me perder nesse mundo desconhecido do Jazz. Imagina um músico de Jazz dos anos 50 ser congelado e acordar hoje em dia e tudo que ele tem que ouvir é Heavy Metal. Iria demorar um bom tempo pra ele se acostumar com o som e entender a história que começou lá com o Black Sabbath e hoje tem o Gojira como grande representante.

Comigo é quase isso. Eu nunca tinha parado pra ouvir Jazz quando era mais novo. Muito por ter medo de entrar nesse universo e ser julgado por quem entende. Quando parei de me importar com o que vão falar, eu tomei coragem e fui no Miles Davis e no John Coltrane. Pra mim, eles são o Led Zeppelin e o Black Sabbath do Jazz. Claro que a história do Jazz vai bem mais pra trás e tem artistas como Chet Baker, Charles Mingus, Herbie Hancock, Louis Armstrong, Ella Fitzgerald, Billie Holiday e muitos outros, mas o Miles Davis e o John Coltrane foram os que me senti mais confortável de começar. 

Esse fim de semana consegui achar uma cópia do vinil do Giants Steps e trouxe pra casa. Meu primeiro disco propriamente de Jazz. 

Não me senti mais importante por causa disso, me senti simplesmente feliz por ter me libertado do julgamentos pra ouvir esse disco em casa, com calma e com o fone bem alto. 

É um disco que me trouxe emoções complexas e conflituosas. É perfeito.

É um disco que com certeza mudou o Jazz e me mudou também. Quem sabe ele não muda você também? O importante é dar o primeiro passo.

Ouça aqui o Giant Steps


Por Vinícius Cabral

A GRANDE CIÊNCIA

Em um desses leilões pela internet, nosso querido amigo e apoiador Christian Bravo descobriu uma oferta inusitada. Por uma bagatela de 35 reais (dinheiro que, em 2021 não dá pra comprar nem um saco de arroz + duas caixas de ovos no Brasil) uma obra-prima seminal da história da música: um daqueles discos que você acha tão enormes e inacessíveis que não espera, nunca, que apareça em um leilão por esse preço. Você não espera, nunca, que apareça em um leilão online. Ponto. 

Mas o que faz esse disco tão especial, ou ainda, quem é Laurie Anderson? Em poucas palavras, podemos só deixar registrado que, além de violonista, compositora, performer, videomaker, cineasta, ou seja, multiartista (com dois doutorados em arte e reconhecimento de instituições como o Guggenheim), Laurie marcou a história da música em definitivo com este disco Big Science, pico de uma carreira musical de certa maneira celebrada ao lado de figuras como Peter Gabriel, Allen Ginsberg e John Cage na clássica videoarte de Nam June Paik, Good Morning Mr. Orwell, exibida em plena televisão no ano-novo de 1984. Como se não bastasse esse breve curriculum já notório, Laurie trabalhou com Andy Kaufman nos anos 70, e se casou com Lou Reed em 1992 (com quem ficou até o falecimento do rockstar em 2013). E essas são só algumas de suas conexões inusitadas e históricas. Laurie só é a mulher por trás dos homens na triste historiografia artística vigente. Para qualquer um que, como eu, conheça o mínimo de sua trajetória, ela é a mulher à frente de todos os homens. 

É o que se anuncia nesse disco, já nos primeiros acordes de From The Air, canção que faz os Talking Heads parecerem amadores com seu loop de sintetizador, Sax e ocasionais vocoder invadindo o espaço de forma bizarra, acompanhados pela “narração” de Laurie como capitã de um avião que vai cair. Aviões de guerra que, no fim, parecem estar sem pilotos (apertem seus cintos!). Laurie não antecipa somente a energia densa do tecno-fascismo bélico do século XXI, com a derrocada inevitável do império em falência. Ela coloca, também, a música pop eletrônica em perspectiva, com a canção central do disco e hit improvável (chegou à segunda posição nas paradas inglesas), O Superman. Composta por uma sinfonia minimalista de vocoder e sintetizadores, a canção é gráfica, inovadora, e traz a artista declamando em voz robótica versos como: “Hello? This is your Mother Are you there? Are you coming home?”. A “mamãe” da canção avisa sobre a chegada dos temidos “aviões americanos”, em uma gravação na secretária eletrônica. Tarde demais! Pena que não se ouviu o recado de Laurie no Afeganistão, na Síria ou na Palestina.

Qualquer que tenha sido o futuro idealizado por Laurie em seu tempo, a ideia de Big Science permanece como um paradigma, uma cisão e um dilema. Queríamos máquinas que servissem como auxiliares, e uma economia baseada na ciência (e na produção de utensílios práticos e indispensáveis). Ao invés disso, criamos máquinas que suprimem o pensamento científico (o humano, claro). Era pra ser um futuro híbrido, com a mente humana guiando o curso das coisas com auxílio da ciência, mas preferimos 1984 (o de Orwell). Laurie, visionária, nos apresenta as duas visões, em uma obra maravilhosamente guiada pela ciência e pela arte, em um desses encontros inesquecíveis entre as duas matérias. 

Ouça Big Science aqui


Por Márcio Viana

SMELLS LIKE THIN SPIRIT

O fato de eu ser jovem há muito tempo (tradução: o espírito juvenil que habita sob a minha pele dança uma valsa suave enquanto o corpo vai sofrendo as agruras da idade) fez com que eu consumisse música do jeito que dava. Já contei inúmeras vezes sobre a minha relação com os discos de vinil na infância, depois tive uma fase de ouvir muito conteúdo em fitas cassete, pela facilidade (naquela época era fácil, vai) de andar por aí com um walkman com um álbum rolando na fitinha (enquanto as pilhas aguentavam). Depois, claro, vieram o CD, o mp3 e por fim o streaming e eu não sei onde isso vai parar depois.

Fato é que, se por um lado eu tive acesso às bandas clássicas de alguma forma, algumas lacunas ficaram, e é com o streaming que eu vou tentando corrigir algumas falhas de percurso. Recentemente eu comentei nesta newsletter sobre o Grand Funk Railroad, cuja obra eu não conhecia bem (ainda não conheço tanto), mas sentia que era algo que eu precisava ouvir.

Certamente há muitas outras bandas nesta situação, e aos poucos eu vou tentando me inteirar a respeito delas. Mas a próxima grande banda a ser explorada é o Thin Lizzy, e eu sinto que tomei a decisão certa ao me propor uma imersão na obra do grupo.

Mas hoje vou falar sobre o que deve ser o grande clássico da banda, o álbum Jailbreak, de 1976. A banda, que já chegou a ter nomes como Gary Moore, John Sykes e – estranhamente – Midge Ure nas guitarras, à época contava com os guitarristas guitarristas Scott Gorham e Brian Robertson e o baterista Brian Downey, todos eles liderados pelo incrível cantor e baixista Phil Lynott, um fenômeno pouco notado na história do rock, ao menos não tão notado quanto deveria.

Jailbreak, o álbum, abre com Jailbreak, a canção, e daí por diante a gente já sabe o que esperar: guitarras que “conversam” entre si e uma – atenção que eu vou usar o clichê – cozinha nada tradicional, com Lynott bastante seguro nas linhas de baixo e Downey muito criativo nas levadas de bateria.

É curioso que, ainda que o som do grupo se aproxime do hard rock norte-americano, não é justo classificá-los desta forma. Talvez nenhuma classificação faça jus ao som da banda formada em Dublin (sim, o grupo é irlandês). Também não é muito justo tentar encaixá-los em alguma comparação com os grupos ingleses de hard rock, já que o Thin Lizzy tinha uma veia pop não muito parecida com a frieza britânica. Talvez até pelas origens de Phil Lynott, filho de pai guianês e mãe irlandesa.

Mesmo assim, a banda teve uma reputação muito mais forte no Reino Unido do que nos Estados Unidos, apesar da exposição de The Boys Are Back in Town como um megahit até hoje.

Por fim, um detalhe interessante sobre a formação com dois guitarristas tem um fator psicológico: criado pela avó em Dublin, enquanto a mãe morava em Manchester, Phil Lynott tinha um complexo de abandono, e ao ver guitarristas saindo da banda, resolveu contratar dois de uma vez, imaginando que se um saísse, sempre haveria outro. O fato é que essa justificativa inusitada forjou o som da banda a partir da entrada dos dois, já que combinaram guitarras “gêmeas” na maior parte das canções a partir desta formação, inclusive em solos.

Dentro e fora da banda, Phil Lynott teve uma carreira errática, tragicamente interrompida em 1986, com uma overdose de heroína. Ficou o legado de uma grande banda, que chegou a ser retomada pelo guitarrista John Sykes para algumas turnês, com o baixista Marco Mendoza substituindo Lynott e sem material inédito. Depois de 2011, o nome Thin Lizzy foi encerrado e o remanescente Scott Gorham montou uma nova banda com a formação que o acompanhava, com o nome de Black Star Riders, gravando material inédito.

Ouça Jailbreak aqui


Por Brunno Lopez

AN EVENING WITH BON JOVI

A década de 90 nunca se cansa de chutar o traseiro de qualquer outra, principalmente no âmbito musical. E entre tantas bandas e álbuns clássicos que surgiram nesse período dourado, é preciso destacar uma das performances ao vivo mais notáveis do quinteto de New Jersey.

No especial da MTV de 1992, o grupo contava com a sua formação original no auge da capacidade musical e despejou clássicos e covers com a autoridade de uma banda já grandiosa que sabia pra onde estava indo.

O show intimista foi às vésperas do lançamento do Keep The Faith, disco este que apresentava um novo direcionamento no próprio som do Bon Jovi. Porém, neste concerto, a impressão que podemos ter é que eles estão unindo as suas duas fases, abraçando o que os levou até ali ao mesmo tempo que dão boas vindas ao estilo renovado que seguiriam.

Preparem-se para a melhor versão de “A Little Help From My Friends” desde Joe Cocker.
E também para se despedir do baixista Alec John Such, que acabaria deixando a banda depois desse material.

Claro que eles lançariam anos depois a sua obra máxima, mais conhecida como These Days. Mas é aqui, nessa apresentação, que tivemos a última experiência de Bon Jovi com seus fundadores tocando juntos. 

Emociona de lembrar. Emociona de re-assistir. Emociona até de escrever.

Assista aqui


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana