01 de Fevereiro de 2021
Feliz fevereiro queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio! A newsletter desta semana é especial apenas com clássicos que se destacam na discoteca dos nossos colaboradores. Muita coisa velha, outras nem tanto, mas sempre com algo em comum: aquele “gostinho” de clássico. Discos que não saem da nossa cabeça e dos nossos corações, independente da época em que foram lançados!
IT’S A CLASSIC
Bruno Leo Ribeiro
MOÇA LINDA
Em 1979, durante as gravações do terceiro disco do Fleetwood Mac com ela na banda, a Stevie Nicks começou a compor músicas que acabaram não sendo aproveitadas pela banda. Depois do grande sucesso que ela teve compondo o grande hit de 2020 (Dreams), a Stevie estava cada vez mais inspirada, mas não queria perder suas ideias.
Ela resolveu convidar amigos pra participarem do seu então primeiro disco solo chamado Bella Dona. O Produtor, muito conhecido e já citado várias vezes aqui nas newsletter e nos nossos episódios, o Jimmy Iovine, junto com o Tom Petty, resolveram então gravar as 10 faixas desse disco sensacional.
O disco passou 3 anos na Billboard top 200 (entre 1981 e 1984), chegando ao número 1. Se você não está reconhecendo esse disco, ouça “Edge of Seventeen”, que tenho certeza que você vai pensar, “Ahhhh essa eu conhecia!”
Pois foi assim que ano passado resolvi escutar os discos solo da Stevie Nicks e da Debbie Harry da Blondie pra dar uma moral pra essas mulheres maravilhosas que já admirava. Quando comecei com o Bella Dona, parei nele e escutei por várias semanas.
Agora em 2021, esse disco voltou pros meus ouvidos, sendo trilha sonora dos dias calmos e cheios de neve da Finlândia.
Um disco de uma das vozes mais reconhecíveis da música, com composições e convidados maravilhosos pra criar um clássico que todos precisam ouvir. Um desses clássicos esquecidos que estamos aqui para relembrar.
Talvez o melhor disco de 2021 pra você, seja um disco de 1981. Espero que esse aqui entre na sua lista 🙂
Ouça aqui o Bella Donna da Stevie Nicks
Vinícius Cabral
O FELIZ ACIDENTE DO ROCK BRASILEIRO
“Este disco é uma merda e não dá pra explicar uma merda dessas!”,
disse Zezinho, dono da gravadora Top Tape ao ouvir o álbum (lançado pela sua própria gravadora) Não Fale Com Paredes, da banda precursora do rock progressivo-psicodélico no Brasil, Módulo 1000. No que a gente se pergunta: como aconteceu uma coisa dessas? O dono da gravadora não sabia o que tinha contratado?
Exatamente.
Um dos produtores da empresa havia fechado com a banda após vê-los tocando ao vivo, e deu liberdade total para gravarem o seu debut, que não foi entendido aparentemente por ninguém. Nem pelos empresários da gravadora e nem pelo público. É um disco esquecido e digno de culto, que hoje conseguimos ouvir facilmente em alguns streamings, mas que durante muito tempo não foi sequer lembrado nem pelo jornalismo especializado.
É importante citar que esse “acidente” de disco aconteceu porque a banda, formada por Luiz Paulo Simas – notabilizado como o autor do irritante, porém inesquecível, “plim-plim” da Rede Globo -, Daniel, Eduardo e Candinho, vinha do contexto (bastante comum à época, no final dos anos 60) de festivais e apresentações de baile. O embrião do conjunto é, inclusive, a Brazilian Monkees, que fazia covers dos monkees tentando replicar o sucesso dos Brazilian Bitles, que ganhavam dinheiro com seus covers em festas e bailes.
Com a oportunidade da gravadora o projeto de banda à la carte para ganhar dinheiro foi pro espaço e os caras tiveram um estúdio à disposição para ensaiar algumas loucuras que basicamente introduzem o progressivo no brasil, mesmo que muito ligado ainda à psicodelia dos primeiros discos do Pink Floyd e ao progressivo “inicial”, muito cru de King Crimson.
Na verdade o Módulo 1000 vai além. Como se credenciou tocando em bailes, a banda tinha um arsenal estético ampliado, para, por exemplo, conseguir mesclar riffs a lá Black Sabbath com sintetizadores e órgãos mais “ambientes”. É nessa mistura especial que a banda constrói o disco, que começa com a canção mais longa do repertório, Turpe Est Sine Crine Caput: parecendo ter saído diretamente de um Piper At The Gates Of Dawn, a música é densa, cheia de inversões, efeitos de guitarra, beat lisérgico e tem apenas um verso aleatório, repetido em latim (que, claro, foi contestado pelo DOPS porque os jênios dos milicos não conseguiram traduzir a letra, que diz: “É um fato, é um fato, é horrível uma cabeça sem cabelos…”).
O disco segue com canções antológicas como a enérgica faixa título, psicodelia folk em Espêlho, solos de guitarra em loops raivosos (como nas incríveis Lem. Ed. Êcalg e Ôlho por Ôlho, Dente Por Dente) e muito, mas muito espaço para trucagens de estúdio, experimentações em timbres de guitarra, efeitos nos vocais, e outras inovações. Por falar em inovações, a canção Metrô Mental é uma das primeiras músicas gravadas no brasil a trazer sintetizadores (o disco acaba saindo em 1971, antes de existir ainda uma “cena” local de rock progressivo).
Com exceção do primeiro álbum da Som Imaginário (1970) e da coletânea Posições (que trazia duas músicas da Módulo 1000 que não entraram no álbum à época, mas que estão na versão que eu linko abaixo), Não Fale Com Paredes é um precursor, que talvez tenha mostrado a tantos outros malucos que era possível driblar as gravadoras e as definições comerciais para tentar criar algo autoral e novo ali no início dos contraditórios anos 70.
Bom, esse basicamente segue sendo até hoje nosso grande desafio no brasil: driblar os consensos medíocres e navegar por mares inéditos em busca de algo realmente original. Módulo 1000, por acidente ou não, nos mostra que isso é possível.
ps- esse texto é só um spoiler do que vem por aí em março. Aguardem!
Ouça Não Fale Com Paredes aqui
Márcio Viana
COM AMOR, COM TUDO DE REAL
No meio de uma pesquisa para um futuro episódio do Silêncio no Estúdio, me deparei com a citação de uma canção de Gilberto Gil presente no álbum Realce, um dos meus preferidos dele, e neste final de semana resolvi dedicar minha audição a ele, do início ao fim, repetindo algumas vezes.
O álbum, de 1979, é produzido por Marco Mazzola, produtor de muito prestígio em gravadoras como a Phillips, CBS e WEA, que no caso é por onde este disco foi lançado.
Realce é uma soma: o virtuosismo natural de Gil encontra a obstinação de Mazzola pelo aprimoramento de técnicas de gravação e produção e a participação de músicos norte-americanos, como o guitarrista Steve Lukather, do Toto. Tudo isso em Los Angeles, por onde Gil passou em turnê e onde Mazzola era frequente em suas visitas a estúdios. Todas as faixas foram gravadas no Westlake Audio Studios, com exceção de Não Chores Mais, versão para No Woman No Cry, de Bob Marley, gravada nos Estúdios Transamérica do Rio.
Quase todas as canções do disco são hits da carreira de Gil, com destaque para a faixa-título, gravada apenas com músicos estrangeiros e inspiradas na disco music. Superhomem – a canção foi inspirada no relato de Caetano Veloso sobre o filme protagonizado por Christopher Reeve, uma sensação daquela época.
A edição deluxe, presente nas plataformas de streaming, traz versões de Gil para clássicos do samba e da música regional. Se a ideia inicial era internacionalizar a obra do cantor, ninguém melhor do que ele para tratar de realçar essa internacionalização com um tempero genuinamente brasileiro. Coisa de gênio, sabe como é.
Brunno Lopez
QUANDO A KATY FOI MAIS ROCK DO QUE PERRY
O segundo ato da californiana Katheryn Elizabeth Hudson foi muito diferente do estilo que a faria reinar no futuro de sua própria música. Claro, alguns dos elementos pop podem ser observados em One of The Boys, de 2008, mas a temperatura desse disco é, em sua maioria, em altos graus de rock.
Isso é percebido de uma forma muito agradável, logo que nos desviamos dos hits “I Kiss A Girl” e “Hot n’ Cold”. Como um caçador de relíquias, as preciosidades vão surgindo e fica mais fácil entender as declarações da cantora quando afirma veementemente que Queen é uma das suas maiores influências – não que o disco tenha algo que lembre a clássica banda inglesa, longe disso. Mas é louvável a sonoridade com mais punch e personalidade do que as coisas que eram produzidas nessa linha naquela época.
E, de todas as amostras dessa vertente mais energética, somos brindados com a irresistível “Self Inflicted”, que merecia ser a canção mais conhecida da história da menina Katy.
Desafio qualquer um a não se encantar pela pulsação meio punk rock moderno, com uma atmosfera cativante e um refrão sublime, daqueles que você canta junto logo na primeira vez.
Enfim, este disco é um clássico pouco apreciado além de seus singles radiofônicos.
Por isso é sempre válido explorar a dimensão total das obras de qualquer artista.
Ouça aqui
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana