Newsletter Vol. 246

Na newsletter desta semana nosso time destaca lançamentos que têm feito suas cabeças. A coluna também permanecerá em aberto para que nossos colaboradores possam trazer pautas livres, caso o ritmo de lançamentos não seja satisfatório. 


LANÇAMENTOS/PAUTA LIVRE

Por Vinícius Cabral

SÓ DEUS NA CAUSA

É necessário abrir esse texto com a constatação inevitável: Only God Was Above Us é impecável. Irretocável. Perfeito.

O melhor álbum do Vampire Weekend, sem a menor dúvida, desde a obra prima Modern Vampires of The City, de 2013. Mais de uma década depois, a banda volta à forma que a catapultou definitivamente na cena. E eu diria que vai um pouco além. À primeira audição o disco parece uma coletânea. As músicas gritam os próprios maneirismos (já tradicionais) da banda, o que me levou a achar inicialmente que o disco era apenas um mais do mesmo. Não é. A banda usufrui do legado de seu próprio estilo, certamente. Mas o faz com uma energia nova, que se manifesta em alguns dos melhores arranjos e dinâmicas já explorados em seu catálogo.

E isso já começa com a múltipla e fragmentada faixa de abertura, Ice Cream Piano. A música sobe, desce, cresce. Enfim, tem uma dinâmica toda própria. E já começa a construir o conceito do disco de uma forma espetacular: “‘Fuck the world’ – you said it quietly”. Um diálogo entre cinismo e esperança. O spoiler é: a esperança não necessariamente vence. É o que se houve nos versos (repetidos à exaustão) da última faixa, Hope: “I hope you let it go / The enemy is invincible / I hope you let it go”.

Neste momento é importante contar que esse disco foi construído a muitas mãos, ao longo de mais de 7 anos. Como Ezra Koening conta nessa incrível entrevista em um faixa a faixa do disco, a banda foi coletando e amarrando ideias ao longo destes anos, e achando as imagens que iriam compor a identidade visual do trabalho. A foto da capa é de Steven Siegal, fotógrafo nova iorquino que se notabilizou por experimentações óticas com resultados surreais. A capa traz, sem nenhuma edição, uma fotografia muito forte, com um homem lendo a manchete de um jornal em 1988 estampando o título do álbum, escolhido a partir da imagem: “Only God Was Above Us”. Quando Koening foi investigar do que se tratava a manchete, descobriu que era uma matéria sobre um voo comercial que sofreu um acidente – o teto do avião desfaleceu. A frase da manchete é o depoimento de um dos sobreviventes do voo: “só tinha deus acima de nós”.

É um pouco essa sensação de desamparo que nos guia pelo álbum, apesar da aparente good vibe das canções. Há sempre algo agridoce nas letras, ou nas inflexões melódicas que Koening traz (como na ponte da ótima Pravda). Adentrando no universo estritamente musical, é muito difícil achar destaques em um álbum que não tem uma única faixa dispensável. Após três hits absolutamente irresistíveis, as experimentações começam a se acentuar na quarta faixa, Connect. Ezra a define como uma espécie de Gershwin psicodélico, mas eu vou além: a canção parece um encontro entre Stan Getz e Flying Lotus. Um arranjo escandaloso de arrojado, para uma canção melodicamente muito simples. É a mesma lógica de The Surfer, canção que conta com um beat que reverbera o hiphop clássico noventista, mas que assenta o arranjo em algo que remete a uma parede sonora digna de Spector.

O disco ainda traz clássicos mais “tipicamente” indie, como Prep-School Gangsters e Gen-X Cops – ambas com conceitos espetaculares -, e se arrisca em mais uma viagem de paredes sofisticadas (desta vez com uma batida em sampler) na ótima Mary Boone. Como falei anteriormente, não há faixa para pular neste trabalho espetacular.

Lançado há poucos dias, Only God Was Above Us já é um dos maiores destaques de 2024. Reflete uma energia resiliente, diante da visão de decadência e derrota que se desenha irreversivelmente no mundo ocidental. É arte para assentar (ao menos um pouco) o caos e o desconforto.

Não dá pra parar de ouvir, com entusiasmo.

Ouça Only God Was Above Us aqui


Por Márcio Viana

O ESPETÁCULO CONSTANTE

Gosto de artistas com assinatura. Pelo termo, neste caso, entenda-se uma característica que faça com que a obra destes artistas sejam facilmente reconhecíveis e inspiradoras. Pense por exemplo nos timbres de Hendrix, nas texturas do Nine Inch Nails, na distorção do Sonic Youth.

Guardadas as proporções, Jane Weaver é uma musicista com assinatura. Sua mistura de folk com eletrônico e experimentalismo é algo que, mesmo que não facilmente associável para quem não acompanha sua obra, a torna única. Prova disso é o uso de sua voz sampleada por um ícone como o Coldplay, que em sua Another´s Arms traz um trecho de Silver Chord da cantora, que recebeu diretamente de Chris Martin um telefonema pedindo autorização para uso.

Em Love In Constant Spectacle, Weaver dobra a aposta no clima folk, trazendo um pouco mais de harmonias do gênero, somadas a algumas sonoridades jazzísticas entremeadas a sintetizadores e algumas guitarras com efeitos menos tradicionais.

Em Univers, ela implora: não me culpe, é o universo que está errado, e isso dá o tom emocional que permeia o álbum todo em relação às letras.

No álbum, Jane Weaver traz a colaboração de John Parish, velho parceiro de PJ Harvey, e isso talvez explique um pouco essa combinação sonora do eletrônico (que ela já praticava) com uma maior presença de sons orgânicos.

O que se vê aqui é que, para Jane Weaver, este espetáculo constante do amor nem sempre vai merecer aplausos, mas sempre será espetacular.

Ouça aqui


Por Bruno Leo Ribeiro

TÁ LIBERADO CANTAR FORA DO TOM?

Despite what you've been told, you CAN sing.

O poeta, compositor e músico David Berman, infelizmente falecido aos 52 anos em 2019, cantou lindamente na música We Are Real do super grupo Silver Jews, “All my favorite singers couldn’t sing”. Todos os meus cantores favoritos não sabiam cantar. Isso é lindo.

Eu sou o maior defensor de música com defeitos. Notinhas um pouco fora do tempo. Andamento sem metrônomo e que a música começa em um BPM e termina em outro. Que afinar demais a voz perde a naturalidade e que bateria totalmente no grid fica tudo robótico. Mas tudo isso dentro de alguns contextos.

Quando a gente fala de Punk, Indie, Rock Alternativo, Soul, Funk, Blues e mais alguns outros estilos, soar real é fundamental. Mas dentro de subnichos do Rock como por exemplo o Metal Moderno, estar tudo no grid, editado e perfeito é fundamental também.

Cantar bem é outra coisa muito pessoal. O que é cantar mal? Ter o timbre simples? Não usar técnica? Desafinar um pouco? Cantar fora do tom?

Pra mim, cantar mal é cantar fora do tom.

Temos Chico Buarque, Bob Dylan, Ringo Starr e muitos outros com vozes limitadas mas que cantam PELO MENOS no tom.

Desafinar na linha melódia é normal. Semi-tons também dão certo charme e realidade pra música, mas se você se propõe a cantar Pop mainstreaming e não consegue cantar no tom ao vivo… isso é vergonhoso.

Sábado teve a grande volta do No Doubt no Coachella e a Olivia Rodrigo subiu no palco pra cantar junto com a Gwen Stefani “Bathwater”. O trechinho que passou na minha TL no twitter é desesperador. E não é a primeira vez que vejo um vídeo da Rodriga Rodrigo ao vivo que ela parece que tem fôlego de um fumante de Derby vermelho e que não acerta nenhuma nota do tom de primeira.

Ela tem apenas 21 anos, gente. Tem tempo e dinheiro pra fazer umas aulinhas e se esforçar mais.

O mais legal dessa história é que os fãs a defendem com todo aquele amor fora do tom (no pun intended), inventando umas desculpas horríveis como “deixar a música perfeita faz a música virar de exatas e não de humanas”, “não dá pra comparar uma menina com 2 discos e a Gwen com uma carreira longa”, “Ela pode ser igual o Punk e cantar errado também!”.

A maioria das ofensas que recebi foram em tom de etarismo. Fui chamado de ala geriátrica, “seu velho” e vovô. Mas tudo bem. O jovem vai envelhecer um dia e a vida vai mostrar o quão ele foi idiota. Faz parte.

O que eu falei pra eles é que tudo bem gostar de coisas ruins. Eu também gosto. Mas parece que isso não ajudou muito.

Acho que exagerei e pedi demais né? Exigir uma cantora de Pop, montada com dinheiro de Marketing e background da Disney, fazendo pastiche de Pop Rock do passado pra vender disco e tocar na rádio, cante no tom foi demais pra eles.


Por Brunno Lopez

FEMMES FATALES


Supergrupos estão aí para provarem glória ou fracasso o tempo todo. O Exit Eden começou o ano com uma baixa poderosa já conhecida (ninguém menos que Amanda Somerville) mas também apostou num lançamento muito interessante, o Femmes Fatales.

Misturando covers e canções originais, o agora trio consegue deixar as vozes mais equilibradas, fazendo Clémentine Delauney (Visions of Atlantis), Anna Brunner (League of Distortion) e Marina La Torraca (Phantom Elite) brilharem numa liberdade que empolga sem parecer exagerado.

Registro recomendadíssimo, com versões de muito bom gosto e inéditas que sustentam o disco numa posição alta entre os materiais lançados até o momento em 2024.

Pra quem quiser ver os covers antes do play…

01. Femme Fatale
02. It’s A Sin (PET SHOP BOYS cover)
03. Run! (feat. Marko Hietala)
04. Separate Ways (JOURNEY cover)
05. Buried In The Past
06. Désenchantée (MYLÈNE FARMER cover)
07. Dying In My Dreams
08. Poison (ALICE COOPER cover) ISSO AQUI FICOU BOM DEMAIS
09. Alone (HEART cover)
10. Hold Back Your Fear
11. Kayleigh (MARILION cover)
12. Elysium

Ouça aqui


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana

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