Na newsletter desta semana nosso time destaca lançamentos que têm feito suas cabeças. A coluna também permanecerá em aberto para que nossos colaboradores possam trazer pautas livres, caso o ritmo de lançamentos não seja satisfatório.
LANÇAMENTOS/PAUTA LIVRE
Por Vinícius Cabral
NOS VESTINDO PARA UMA REVOLUÇÃO
Em Uncertainty Principle, Taja Cheek, líder do projeto L’Rain, canta: “É um novo dia e acreditarei em algo / Talvez um dia todos nós acreditaremos em algo“.
Os versos me batem como uma faísca de esperança. Não como uma alusão à qualquer crença vazia, mas como um lembrete da importância do consenso em relação a algumas verdades universais. Achar que a nossa única certeza pode ser a instabilidade e a incapacidade de compreender os objetos à nossa volta (que, sim, literalmente nunca poderão ser totalmente desvendados, mas não sejamos literais) é o que nos trouxe a esse buraco.
L’Rain parece querer nos puxar para fora do buraco, em um disco que parte de um delírio repugnante (o disco se chama I Killed Your Dog, e tem uma incrível faixa-título) para sinalizar que a repugnância é apenas isso mesmo: um delírio. O que a artista costura ao longo destas 16 faixas impecáveis (skits incluídos) é uma esperança de reconstrução que parte de uma espécie de funeral. Não à toa, depois de canções como Our Funeral e I Killed Your Dog, L’Rain canta em 5 to 8 Hours a Day (WWwaG) que “Pessoas no quintal estão se vestindo para uma revolução“. Já estamos vestidos. Estamos prontos.
Estamos prontos?
Musicalmente, L’Rain avança mil casas em relação ao antecessor, o já incrível Fatigue, com uma sonoridade cada vez mais única. Em uma entrevista recente, Taja Cheek cita como influências coisas como o R&B dos anos 90 e Animal Collective. Faz muito sentido pensar em seu som com uma espécie de síntese entre as duas coisas.
É certo que, em canções como Pet Rock, fica clara uma filiação a outros artistas, mais recentes, como Yves Tumor, mas L’Rain parte destas novas molduras para ir além. Bebe do rock, mas também acena à canção negra estadunidense e à algumas “modernices”, como na faixa-título, onde deixa as nuances melódicas da melodia se levarem por um auto-tune utilizado com rara consciência estética. E claro, os versos repugnantes, repetem “I Killed Your Dog”* como se fosse possível normalizar tal atrocidade.
Não é. E qual atrocidade é possível normalizar?
Na minha lista de melhores de 2021 eu disse, a respeito do Fatigue, que L’Rain era uma artista para prestar bastante atenção. Ainda bem que segui meu próprio conselho, pois não comi mosca em seu espetacular disco seguinte.
*A canção me remete a todo tempo a outra obra estadunidense bastante relevante: a série Atlanta. Em um dos episódios, o personagem mais enigmático da série, o Darius, vai a um estande de tiro com um cachorro desenhado no alvo, apenas para ser escorraçado do lugar por rednecks raivosos que preferem atirar em alvos imaginários humanos – em alguns casos, com níveis de descrição e particularidade assustadores. Talvez essa canção também seja sobre quais vidas são importantes e quais são desprezíveis, em um sistema que não preza pela lógica ou pelo bem comum.
Por Márcio Viana
O FATALISTA INOVADOR
Ser iconoclasta pode ser arriscado. Sobretudo quando falamos de gêneros musicais tão consolidados como o blues.
Mas Carlo “Buffalo” Nichols não parece se intimidar com isso. Em seu segundo álbum, The Fatalist, Nichols, criado no extremo norte de Milwaukee, Wisconsin, constrói um alicerce forte de voz e violão, mas experimenta alguns saltos para testar esta estrutura, mergulhando em experimentos com batidas eletrônicas, sintetizadores e outros recursos tecnológicos.
Se a princípio, pode-se considerar uma maculação de um ritmo tradicional, a real é que o resultado aqui soa muito natural de de bom gosto, adicionando climas de trip-hop, R&B e até de trap aos temas reflexivos das letras do bluesman Buffalo Nichols, como em You’re Gonna Need Somebody On Your Bond, ou mesmo na faixa-título, possivelmente a melhor do disco.
Há espaço para o blues tradicional, sem tanta invenção, mas ainda assim muito forte em sua temática. Long Journey Home, por exemplo, é uma viagem conduzida ao som de banjo e violino, onde Nichols brada: está escuro e chovendo e eu quero ir para casa. Um tema nada estranho dentro do gênero, mas com alguma carga renovada.
Daqueles discos que dão uma vontade de agradecer pela existência. Vale cada segundo de play.
Por Bruno Leo Ribeiro
KING ELECTRO GIZZARDS
Falar “novo disco do King Gizzard & the Lizard Wizard” é pleonasmo. Em praticamente 11 anos eles já lançaram 25. Esse ano já foram dois.
Cheguei na festa aleatória dessa banda irreverente da Austrália há pouco tempo e nem deu tempo de ouvir tudo. Fui aos poucos ouvindo alguns discos com a dica do meu amigo Daniel Motta, que é muito fã.
O que mais me impressiona nesse rolê aleatório não é só a quantidade de lançamentos, mas a mudança de um disco pra outro. É uma banda que eu gostaria de ter. Cada disco é uma coisa. Tem Dream Pop, Metal, Stone Rock e por aí vai.
No lançamento mais recente chamado The Silver Cord, a banda se joga no Electro Psicodéligo. Quase um Progressivo Eletrônico. E eu gostei bastante.
É como se cada disco deles fosse um disco de estreia de uma banda nova. Se você gosta de expandir seu gosto, criando carinho com algum artista, o King Gizzard é pra você.
O disco é basicamente feito de sintetizadores, sintetizadores, sintetizadores, sintetizadores, sintetizadores, sintetizadores e um pouco mais de sintetizadores. Amei.
O que mais me encantou nesse disco é que ele tem 7 músicas bem estruturadas em formato de canções e no disco 2, tem as mesmas músicas em versão extendidas (tipo Zack Snider) que você ouve e pensa, “Pelamor! Que loucura! Credo, que delícia”.
Recomendo ouvir o disco 1 com carinho, se curtir, se joga no disco dois pra ouvir as remixes que soam como viagens alucinantes e sonoras que vão te levar para lugares que você nem sabia que existiam.
Por Brunno Lopez
CICLOS DA DOR (DE COTOVELO)
O esperado sucessor de OMNI finalmente chegou nas prateleiras e nos streamings da vida com mais pontos de exclamação do que de interrogação. Ainda que setores preguiçosos da crítica musical de condomínio tenham se empenhado em diminuir o décimo disco da banda, o Angra entregou – com tranquilidade – o melhor material dessa formação.
Cycles of Pain machuca os puristas por, curiosamente, fazer o que a banda sempre fez: olhar pra frente. E olha pra frente sem deixar de carregar os pilares que os fizeram nascer, não é mesmo? Em todas as fases, por mais inéditos que fossem os caminhos, o combustível de cada nova viagem tinha sempre os mesmos componentes obrigatórios: brasilidade, música erudita e metal.
Com isso em mãos, o céu é o limite. Limite este que se atinge e ultrapassa quando se tem Dennis Ward na produção.
Lione, Valverde e Barbosa agora tem suas assinaturas no estilo do grupo. Isso dificilmente se consegue imediatamente num primeiro ou segundo álbum com novos integrantes. É perceptível que a engrenagem que se movia com desconfiança no Secret Garden e que ganhou óleo de qualidade no OMNI agora tem a precisão de um relógio atômico.
Dói? Dói.
Mas não é nos ouvidos.
É no cotovelo.
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana