Newsletter Vol. 211

Na newsletter desta semana, nosso time destaca as principais notícias, curiosidades, acontecimentos relevantes e/ou inusitados do mundo da música ou, simplesmente, alguma curiosidade ou indicação. Claro que, cada um à sua maneira, e abordando sempre o universo musical de sua predileção.  


NOTÍCIAS & VARIEDADES

Por Vinícius Cabral

O ROCK É O NOVO ROCK PT. 2

Estava eu quieto no meu canto, indo buscar a Clara na aula de dança e ouvindo o disco sensacional da banda Wednesday (do qual já falei aqui recentemente), quando me veio o inevitável pensamento: “Sim. O rock venceu”. Um amigo meu recentemente utilizou um vídeo da Arca tocando riffs em um violão para comprovar esse mesmo ponto. Mas a questão é que há muitas evidências mais eloquentes. O próprio disco da Wednesday, que mistura grunge, indie-folk e porradaria moderna (sim, isso já existe), prova bem o ponto. O rock voltou, “ressuscitou”, ressurgiu. Enfim, venceu.

A esta altura, a Clara entrou no carro, aproveitando minha atual onda de trap, e prometendo me mostrar “a mais braba de todas”. Truquei, claro. Mas o que ela colocou fez minha cabeça girar. Tratava-se de Só Rock 2, do selo/mob/grupo de trap Rock Danger. A música começa com os chimbais e adlibs tradicionais do trap, para irromper em uma progressão “menor” em um 808 absolutamente distorcido, mais grave e profundo do que os detritos do Titanic. Uma porrada sonora.

Faz anos que eu comparo um certo tipo de trap, extremo e hiper-grave, ao punk rock. Ao invés de guitarras desafinadas com distorção e baterias toscas de garagem, temos hoje produtores de beats com laptops surrados, Fruity Loops (o software “oficial” do trap) e compressores de áudio pirateados. Só Rock 2 soa assim. Como um punk-eletrônico moderno, onde o grave e os gritos dos cantores se sobressaem como que em uma catarse. A música persegue, afinal, o “espírito do rock”, desde a sátira até a contravenção, com uma letra que percorre essa trajetória de forma muito simples.

Há desde cutucadas em símbolos clássicos do rock, como no clipe, que satiriza a banda Kiss, até referências engraçadas a artistas como Beatles e Guns N’ Roses. Como no verso antológico:

Sexta é rock na minha guitarra/ela quica, ela sarra/meu pinto é o Slash“.

Os caras fazem trap-rock para satirizar o rock. Há também uma cutucada no pop-bundamolíssimo brasileiro atual:

Eu não sei quem que é Jão/nem porque ele tá moscando“.

E, em outros momentos, uma rebeldia clara (que também remete ao “espírito do rock”):

Nas minhas férias, vou pro Rio/que é só pra lavar dinheiro/governo também me rouba, agora eu roubo eles primeiro“.

Jovens pretos trapstars fazendo apologia à lavagem de dinheiro é uma das maiores rebeldias que consigo imaginar no Brazilstão-Neo-pentecostal-Miliciano que ainda nos encara.

Não é disso, afinal, que o rock é feito? Do espírito desafiador de uma juventude que quer chacoalhar o status quo? Em entrevista recente, o pesquisador Jonathan Crary, um dos mais certeiros intérpretes da contemporaneidade, apresentou um pensamento excelente, e super preciso:

Sou professor há quase 30 anos, convivo com jovens e percebo que, embora eles estejam saturados pela mídia de massas, por filmes e videogames violentos, a música ainda permite a autodescoberta. Talvez isso se deva à intangibilidade da música, ao fato de que ela prescinde de imagens. A música não me parece estar a serviço de uma agenda específica“.

A música interrompe o hackeamento cognitivo completo de nossa juventude. Apresenta camadas e fissuras que são intangíveis, e “inhackeavéis”, em um certo sentido. O rock, que em inúmeras ocasiões esteve na dianteira dessas “fissuras intangíveis”, recupera atualmente a rebeldia e o peso em produções como Só Rock 2. Uma canção que não tem guitarras estridentes e outros elementos estereotipados do rock, mas que alude a eles, com o peso dos graves, a visceralidade das interpretações vocais e a rebeldia da letra. Mais rock do que muito rock.

Mas claro que, mesmo o rock de guitarras típicas e demais signos tradicionais do gênero, tem sido revisto e renovado. Mas isso é o assunto da edição anterior (a pt. 1 desta série).

Ouça Só Rock 2 aqui


Por Márcio Viana

NADA SE COMPARA

Não é incomum vermos por aí, especialmente quando se trata de artistas mulheres (foi assim com Nina Simone e com Amy Winehouse, tem sido assim com Britney Spears e com tantas outras artistas), publicações as tacharem como “polêmicas”, “controversas”, donas de uma vida “conturbada”.

É sempre assim quando elas ousam serem donas de suas obras, de suas opiniões, seus corpos e suas vidas.

Sinéad O’ Connor chegou ao mainstream com seu primeiro disco, The Lion and The Cobra, de 1987, e seu hit Mandinka rodou bastante pelas rádios. O mega-estrelato bateu à sua porta no disco seguinte, de 1989, I Do Not Want What I Haven’t Got, que levou à MTV e às FMs Nothing Compares 2 U, de autoria de Prince, mas muito mais dela do que dele, convenhamos.

Mas o fato é que ela não se sentia à vontade nesse espaço, e ao longo de sua carreira observa-se a artista tentando sobreviver em um local menos sufocante do que o showbizz. E nesses percalços foi que ela, numa atitude plenamente justificável (protesto contra atos de pedofilia na cúpula da igreja católica), mas que chocou, rasgou a foto do então Papa João Paulo II ao vivo no Saturday Night Live. E novamente vieram o julgamento, os rótulos, a tachação, a artista polêmica (adicione aqui quantas aspas puder) e seu cancelamento.

Do tanto que se falou nos últimos dias sobre sua morte, suas perdas, suas atitudes e sua herança, nos vimos obrigados até a concordar com Morrissey, que num raro momento de bom senso, criticou o imediatismo para render homenagens à artista, agora que já é tarde para tal.

Admito que não acompanhei com atenção a discografia de Sinéad após os dois primeiros discos, mas sinto que em algum momento precisarei fazê-lo. Talvez quando este turbilhão passar. Para o momento, vamos com seu primeiro sucesso.

Ouça Mandinka aqui


Por Bruno Leo Ribeiro

TEM LUGAR PRA SENTAR?

Nos dias 28 e 29 de julho, aconteceram os dois shows da Taylor Swift no estádio do San Francisco 49ers em Santa Clara no famoso Vale do Silício. O estádio fica na baía de San Francisco, mais ou menos 45 minutos de distância ao sul de San Francisco. E lá fui eu e minha filha pro show de sábado.

Os ingressos que consegui foram os que deram pra pegar. Na hora que chegou minha vez na fila de compra online da nossa antiquerida Ticketmaster, não tinha mais quase nada. Acabei pegando o famoso setor com “vista parcial”.

Muita gente reclamou e xingou e acha um absurdo, mas eu só queria viver aquele ritual e levar minha filha pra se divertir e criar memórias. Tirando um ou outro momento do show, a Taylor fica no meio da plataforma com um diamante que fica no meio do estádio, então 90% do tempo você tem ela ali no campo de visão, mesmo pequena, mas isso até com vista de frente na arquibancada lá em cima seria igual.

Na hora que ela tá no piano e duas músicas que ela faz coreografia no palco principal, tem que assistir pelo telão que fica do lado do palco. Poderia ser melhor? Claro que poderia. Mas é melhor do que ficar em casa chorando porque não foi no show.

No fim, minha filha não ligou nenhum pouco de ver a Taylor pequenininha ou sumindo de vez em quando. Ela amou. A energia de todo mundo cantando, o som alto enclaro, as luzes, a pulseirinha que pisca e todo aquele sol se pondo e aquelas músicas que a gente tanto gosta, fizeram ser um show maravilhoso. A visão parcial é ruim? Claro que é, mas é como disse pra minha filha no fim do show quando ela perguntou qual foi a melhor coisa do show pra mim, eu disse: “ter vindo no show com você”.

Como bônus, fiz uma thread no Twitter com meu relato do show e acabei sendo entrevistado pro site da Band em uma matéria sobre a visão parcial. Você pode ler aqui: “O único lugar ruim é em casa chorando”, diz fã após show de Taylor Swift.


Por Brunno Lopez

PANQUECAS + MANTEIGA = MÚSICA GOSTOSA

Nosso querido Mr. AZ parece não se cansar de brincar seriamente com as palavras e continua criando músicas únicas com sua assinatura provocativa, irreverente e saborosa. Jason, que sempre quebrou as linhas de melodia e escrita musical desde a canção ‘Wordplay’ agora traz mais um ato de genialidade satírica, com pitadas saborosas de uma falsa inocência, dentro de uma roupagem meio sessentista.

‘Pancakes&Butter’ é exatamente essa mistura de essências e não é exagerado dizer que dá pra sentir cheiro e gosto além do som. O single do seu mais recente álbum, o Mystical Magical Rhythmical Radical Ride, mostra que baladas com groove convidativo para playlists XXX podem ser igualmente engraçadas sem perder a envolvência.

Toda a percepção que se constrói com a audição da faixa ganha fascínio quando se acompanha o clipe. Acertou demais no conceito, trouxe um panorama conflitante ao groove suave e arrastado e enriqueceu ainda mais um material que já se mostrava impecável.

“I’ll be your G, G, G”
Isso vai ficar tão forte na mente de todos que ouvirem, da mesma forma que incluirão panquecas e manteiga nos próximos cafés da manhã de suas vidas.

Assista aqui.


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana