09 de Dezembro de 2019
Bom dia, boa tarde e boa noite queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio. Na newsletter dessa semana é especial apenas com clássicos que se destacam na discoteca dos nossos colaboradores. Muita coisa velha, outras nem tanto, mas sempre com algo em comum: aquele “gostinho” de clássico. Discos que não saem da nossa cabeça e dos nossos corações, independente da época em que foram lançados!
IT’S A CLASSIC
Bruno Leo Ribeiro
ALOW… ALOW… TESTANDO… ECO… ECO… ECO…
Quando paro pra pensar e me pergunto o que é um disco clássico, acabo indo sempre pro lado emocional. Em 1996, lembro perfeitamente do dia e da loja que fui pra comprar esse disco que vou recomendar pra vocês. Trata-se do maravilhoooooso, Test for Echo (1996) do Rush.
Esse disco é um dos mais subestimados da banda, não por não ser bom, mas porque parece que não se fala dele mesmo. Logo depois da grande turnê do ótimo Counterparts (1993), a banda acabou dando uma pausa pro baixista Geddy Lee ficar em casa com sua filha. Nesse mesmo tempo, um dos maiores bateristas de todos os tempos, o incrível Neil Peart resolveu que precisava aprender a tocar bateria melhor.
É isso mesmo que você leu. O cara que todos os bateristas de rock progressivo tem como um herói, resolveu estudar e melhorar. Então ele foi ter aulas com o baterista de Jazz Freddie Gruber. Ele aprendeu dinâmicas diferentes e jeitos mais econômicos de se tocar as mesmas coisas sem gastar tanta energia, mudando até sua pegada e o jeito de segurar as baquetas.
A banda como um todo mudou. Simplificou o que não era necessário complicar e fez um disco consistente e com ótimas músicas, como “Driven”, a super acessível “Half the World” e as minhas favoritas do disco, “Totem” e “The Color of Right”.
É um disco de Rock, sem soar muito progressivo. Inclusive eu sempre recomendo esse disco pra quem quer começar a ouvir Rush (que é uma das minhas bandas da vida). Não é um disco cheio de firula, é um disco direto de uma banda que amadureceu, se importava mais com a família e também não cansou de aprender ser a melhor versão dela mesma.
Depois do lançamento desse disco, a banda saiu em turnê e duas tragédias aconteceram. No final de 97 a filha do Neil Peart morreu num acidente de carro e em menos de 6 meses, sua esposa morreu de câncer. Neil ficou sozinho no mundo e a banda simplesmente parou, só voltando a ativa com um novo disco em 2002 com o Vapor Trails.
Vamos prestar uma homenagem ao grande Neil Peart e ouvir o maravilhoso Test For Echo.
Vinícius Cabral
AND THOUGH THEY WERE SAD, THEY RESCUED EVERYONE*
A banda The Flaming Lips já estava na ativa a uma década quando lançou seu primeiro grande hit radiofônico, She Don’t Use Jelly, do álbum de 1993, Transmissions From The Satellite Heart. Era o auge do Rock Alternativo sendo comercialmente viável após a explosão de bandas como Smashing Pumpkins e Nirvana, e tudo que a poderosa Warner Bros. (gravadora da banda desde 1990) esperava dos Flaming Lips era, finalmente, um breaktrhough. E ele veio, mas foi breve: após o sucesso de vendas do disco de 1993, em 1995 a banda lança o sucessor Clouds Taste Metallic, que não emplaca nenhum hit e vira um fracasso comercial.
Pressionada, por um lado, pela gravadora e, por outro, pelo danoso vício em heroína de seu principal compositor, o baterista e multi-instrumentista, Steven Drozd, a banda também vê seu guitarrista principal, Roland Jones, partir em 1996. Era hora de uma reinvenção. Com toda essa experiência de frustrações acumuladas, o inquieto, criativo e inovador frontman, Wayne Coyne, conduz a partir de 1996 os Parking Lot Experiments, que consistiam em audições públicas onde se tocavam CDs de diferentes toca-discos, compondo uma sinfonia espacial em locais inusitados, como estacionamentos privados. A experiência leva, em 1997, ao Zaikeera, um disco quádruplo lançado com o intuito de que todas as mídias fossem tocadas simultaneamente, para uma experiência Surround quase sinfônica. O disco, obviamente, não vendeu horrores, mas foi o suficiente para criar um burburinho em torno da banda, que desafiava definitivamente o “espírito do tempo”, rejeitando ser uma banda de guitarras Indie e partindo para ideias mais ousadas.
É na esteira desta experiência que começa a surgir o transcendental The Soft Bulletin que é, para mim, provavelmente o melhor álbum dos anos 90. Lançado em 1999, o disco aposta em paredes quase orquestrais, mas sem arranjos de cordas: as experiências com loops de fita e sintetizadores manipulados é o que garante timbres inusitados, como os que abrem o álbum, com a clássica Race For The Prize. Daí em diante, o disco se constrói com riffs de piano, melodias decrescentes com os vocais esganados de Wayne Coyne em falsete e letras ora surrealistas, ora desafiadoras, descrevendo acidentes de carro, a relação com a morte, a vida, o vício. Temas amplos, temas humanos, em canções incríveis como Waintin’ For a Superman (“É pesado demais, para um Superman levantar”… existem, afinal, super-homens?). A sequência inicial do disco (Race For The Prize, A Spoonful Weighs a Ton, The Spark That Bled – The Softest Bullet Ever Shot – e The Spiderbite Song) é escandalosa, e deixou a todos na época com a sensação de estarem diante de um clássico, ainda que não se entendesse muito bem (ainda) de onde aquele som tinha saído.
Além de “ressuscitar” a banda e lançá-la a um novo patamar de excelência artística, The Soft Bulletin projeta os Flaming Lips à celebração comercial e de crítica, apontando novos caminhos e sonoridades possíveis para o cenário Alternativo, aqui já desgastado do formato de Banda Indie. A manipulação de samplers, o tom orquestral e as canções de estruturas incomuns e densas camadas de paredes trazem ao álbum associações com cânones da história do Rock (é sempre comparado, guardadas as devidas proporções, com Pet Sounds, por exemplo), e indica os caminhos que o Rock Alternativo poderia tomar nos anos seguintes. Menos guitarras, mais manipulação (analógica e eletrônica) na base das canções, letras densas e surreais (sem perder o humor). De uma maneira ou de outra, The Soft Bulletin encerra a miscelânea dos anos 90 antecipando o trauma millenial da década seguinte em construções melódicas e harmônicas incomuns e muito, muito particulares. Um clássico, que ainda faz muito sentido 20 anos depois.
*Verso inicial de A Spoonful Weighs a Ton. Em tradução livre: “Apesar de estarem tristes, resgataram a todos”.
Márcio Viana
ÀS VEZES NASCEM FLORES NO LODO
1989 foi obrigatoriamente um ano de mudança. Fadado a estar no fechamento da chamada década perdida, havia ali diversos movimentos que favoreciam tomadas de decisões difíceis e inevitáveis, não só no campo político, mas certamente também no artístico. Paul McCartney sabia disso. Vindo de um certo fracasso de vendas com Press to Play, de três anos antes, o ex-beatle queria trabalhar de um jeito diferente, e decidiu dedicar uma média de dezoito meses (portanto iniciando em 1988) para a produção de seu álbum Flowers in the Dirt. Decidiu também que queria ter uma parceria parecida com a que teve com John Lennon, e foi encontrar esta parceria num sujeito chamado Declan MacManus. Reconhece? Que tal então se o chamarmos pelo seu nome mais conhecido? Estamos falando do grande Elvis Costello, que se apresentou como parceiro de Macca em algumas canções deste Flowers in The Dirt e nos seus próprios álbuns Spike e Mighty Like a Rose.
A fórmula funcionou bem e nos deu My Brave Face, maior sucesso deste disco, seguida por Figure of Eight (esta só de Paul). Deu também em So Like Candy, lançada por Costello e presente em versão demo na edição deluxe comemorativa dos 30 anos de Flowers in The Dirt.
Para além destas canções da dupla McCartney/MacManus, vale destacar How Many People?, canção dedicada por Paul a Chico Mendes, depois que o cantor assistiu a um documentário sobre o seringueiro e ativista brutalmente assassinado em dezembro de 1988 em decorrência pela sua luta em defesa do meio ambiente.
Em Flowers in the Dirt, Macca optou por trabalhar com diversos produtores, entre eles o lendário produtor dos Beatles, George Martin. Além disso, o álbum conta com a participação de David Gilmour (que já havia feito o solo de No More Lonely Nights e viria a ser presença frequente em apresentações do ex-beatle) na faixa We Got Married.
Como depoimento pessoal, foi o primeiro álbum que ouvi de Paul McCartney, e é pra mim ainda hoje o melhor disco de sua carreira-solo.
Ouça o álbum Flowers in the Dirt
Brunno Lopez
OPALINE
Muitas bandas de rock que começaram a tocar nos anos 90 não ousaram sair muito do estilo que as consagraram a medida que os anos avançaram.
Mas não é o caso deste grupo californiano. Em Opaline, lançado num já longínquo 2002, o Dishwalla experimentou novos direcionamentos em seu som e letras, contradizendo o conservadorismo de grande parte dos grupos de sua época.
O resultado foi consideravelmente animador, pois, se por um lado as guitarras barulhentas e temáticas eufóricas foram suprimidas, por outro ganhamos levadas mais cadenciadas e letras maduras. E convenhamos: a voz JR Richards de encaixa perfeitamente em canções desaceleradas e interpretativas.
Várias faixas funcionam com sucesso em playlists intituladas “BALADAS DE BOM GOSTO”. Selecione sem medo de errar as faixas “Angels and Devils”, “Somewhere In The Middle” e “Every Litlle Thing”, finalizando o clima slow com “Today, Tonight”.
Na época, muito se perguntaram onde foi parar a banda que um dia entoou letras do tipo: “Everything about the world is sex”?
Bom, eles foram parar no rádio, na trilha sonora de filmes contestáveis como o “The Bang Sisters” – ou se preferir “Doidas Demais”, na versão brasileira Herbert Richers – e também foram convidados musicais num episódio da série Charmed.
Opaline é o resultado de uma banda querendo andar pra frente sem se apegar no que funcionou em seus dois álbuns anteriores.
Ouça o disco Opaline aqui
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana