Newsletter Silêncio no Estúdio Vol. 192

27 de março de 2023

27 de março de 2023


A newsletter desta semana é especial apenas com clássicos que se destacam na discoteca dos nossos colaboradores. Muita coisa velha, outras nem tanto, mas sempre com algo em comum: aquele “gostinho” de clássico. Discos que não saem da nossa cabeça e dos nossos corações, independente da época em que foram lançados!


IT’S A CLASSIC

Por Bruno Leo Ribeiro

ACUSTICAMENTE LINDO

Tivemos em algum momento na história da música a categoria de discos acústicos. Você entrava em uma loja de CDs (sim, fazíamos isso assim como os Etruscos) e tínhamos a sessão de Rock, MPB, Rap, Pop e também a sessão de Acústicos. 

Depois que essa coqueluche se estabeleceu no Brasil, depois da versão super simples da Legião Urbana e da super extravagante do Art Popular, muitos artistas se sentiam obrigados a terem uma versão acústica, mesmo que não fosse oficialmente da MTV.

Na MTV tivemos Titãs, Capital Inicial, Rita Lee, Gal Costa, Gilberto Gil e muitos outros, mas tem um que estará sempre no meu coração como o meu favorito. Cássia Eller de 2001.

É um disco versátil e que tem de tudo. Samba, Rock e Pop. É o famoso vira-lata caramelo dos acústicos e isso que faz ele ser lindo. Tem músicas do Chico Buarque, Gilberto Gil, Beatles e Edith Piaf. Convidados como o rapper Xis e a banda Nação Zumbi. Além da produção artística do Nando Reis, que também teve o seu momento.

É um disco com repertório excelente e um clima muito bonito. A voz da Cássia é poderosa e única e, certamente, esse disco é um clássico não só para o meu coração, mas pra toda a história da música Brasileira. 

Ouça aqui


Por Vinícius Cabral

SAUDADE DO QUE NUNCA COMEÇOU

Quem estava no Rio de Janeiro no final dos anos 90 acabou vivendo, sem querer, a utopia indie nacional em sua expressão mais melancólica. É claro que eu era apenas um moleque de 17 anos, e que relatos como o deste artigo do Carlos Eduardo Lima, protagonista daquela história e editor da finada revista Rock Press, são mais fiéis ao que aconteceu. Mesmo assim, eu vivi algo ali que só vejo começar a se repetir agora, quase 30 anos depois. 

Havia uma profusão de bandas em circulação, revistas, selos independentes, festivais começando. Mas o mais interessante disso tudo era a qualidade dos artistas. De uma leva da qual a Los Hermanos foi a única a se consolidar comercialmente, algumas bandas mudaram a vida de muita gente. A principal delas, certamente, foi a 4 Track Valsa, depois rebatizada Casino. O grupo foi trilhando todo o caminho das “bandas de culto”. Fez apresentações pequenas e antológicas em lugares toscos (como no antigo Garage), gravou duas demos, circulou e circulou até começar a sonhar com voos maiores. O selo Midsummer Madness, do Rodrigo Lariú, ajudou a tentar dar o salto. O ápice, talvez, tenha sido a abertura para o Stereolab em 2000, no Cine Íris. Um ano depois veio o único registro oficial e definitivo, o EP Casino, com 5 faixas. 

Não foi o suficiente. 

O EP fez um recorte das canções melhor acabadas da banda, mas era só o primeiro passo de uma história que foi tragicamente interrompida em 2003, depois de desentendimentos internos (e externos), que culminaram no fim da banda. A segunda demo do grupo, lançada ainda em 1999, acaba sendo um registro mais amplo, apesar do acabamento nitidamente caseiro do trabalho. Ainda assim, nenhum registro existente conseguiu capturar a potência do que era a 4 Track Valsa/Casino para quem teve a chance de ver a banda ao vivo. Era um daqueles fenômenos em que todo mundo se olhava e se cutucava. Um burburinho consensual de que se tratava de uma experiência nova, trazendo elementos do indie que só se ouvia, até ali, em inglês. A banda misturava a gênese do melhor indie gringo dos anos anteriores com um pouco de Os Mutantes e Bossa Nova, apontando para uma direção totalmente inédita. Nenhuma banda brasileira da época, incluindo as do maisntream (ou quase), como Pato Fu, havia ido tão longe. 

Mas nem a 4 Track Valsa/Casino foi longe, para a nossa tragédia. Vive, e se revive, até hoje, como uma eterna possibilidade que nunca vingou. A nossa sorte é que ainda é possível ouvir clássicos como Casa de Praia, Dia de Festa e Samba Dada espalhados pelos links que compartilho aqui. Se esforçando um pouco, é até possível reconstituir parte do impacto, lendo os textos, ouvindo as músicas. Catando, enfim, os pedaços de uma história que terminou antes mesmo de começar. Infelizmente, esta é uma das rotinas das cenas indie no Brasil. Já narrei por aqui como, na mesma época, a Motor Music tomou BH com uma possibilidade absolutamente fascinante de cena. Não durou nem uma década. Enfim…até quando? 

Ouça Casino EP aqui 


Por Márcio Viana

VOCÊ ME PAGA, STEVE ALBINI

É até difícil mensurar o tamanho da importância de um produtor como Steve Albini, e basta a gente buscar pela lista de artistas com quem ele trabalhou, sendo o trabalho mais mainstream a produção e a controversa mixagem de In Utero do Nirvana.

Mas eu quero falar hoje é sobre o feeling de Albini que atesta o quanto ele é um dos grandes produtores da história da música.

Tudo porque um único tweet foi capaz de alugar um tríplex na minha mente: um dia desses, Steve Albini resolveu falar sobre o grupo The B52’s e sobre como tudo na banda funcionava, com destaque para o guitarrista Ricky Wilson, apontado por ele como “o guitarrista mais original em uma década”. Eu, que nunca tinha prestado atenção na guitarra da banda, quase caí de costas, e resolvi ir ouvir e investigar o que fazia de Wilson (falecido em 1985, devido a complicações decorrentes do vírus HIV, do qual era portador) digno deste título dado pelo produtor.

Uma das coisas que eu não sabia e que de cara me fascinou foi que Wilson era adepto da filosofia do “menos é mais”, e removia de sua guitarra as cordas ré e sol, dedicando sua performance a tocar duas cordas mais graves (mi e lá) e duas agudas (si e mi). Isso em uma banda sem contrabaixo.

A outra coisa é que Rock Lobster, o icônico sucesso do disco de estreia da banda, de 1979, chamou a atenção de ninguém menos que John Lennon, que a partir dali se sentiu motivado a retomar a carreira no ano seguinte, com seu Double Fantasy, infelizmente um disco com cara de preparatório para coisas maiores, que não vieram por causa de um crime brutal.

A razão para Lennon ter se empolgado tanto com Rock Lobster é o fato de ela ser uma canção pop improvável, em estrutura e em discurso, lembrando as coisas produzidas por sua Yoko, não por acaso citada pela banda como influência. Dá pra imaginar o quanto o sucesso da canção causou o impacto de um sonho possível na mente do ex-beatle. Uma curiosidade é que Ricky Wilson apresentou a composição à vocalista e tecladista Kate Pierson dizendo: “acabei de escrever a linha de guitarra mais estúpida que você vai ouvir”.

Ainda no tweet de Albini, a sonoridade orgânica e com poucos elementos da banda (guitarra, teclados, bateria e vocais) é definida por ele como “um Taj Mahal feito de gravetos”, no sentido de que o papel de cada um é perfeitamente definido e facilmente audível e visualizável.

É bem compreensível, ainda, que uma banda essencialmente pop, vinda de Athens, na Georgia, mesma cidade que nos presenteou com o R.E.M., tenha sido tão influente no som de bandas indie, já que o disco de estreia trazia muito experimentalismo além do citado hit, sendo precursor até das riot grrls, com Hero Worship, por exemplo. Cortesia dos vocais maravilhosos de Cindy Wilson e Kate Pierson, divididos com Fred Schneider. Junto a eles, a crueza da bateria de Keith Strickland completava a receita de sucesso.

Depois da estreia, a banda viu o sucesso aumentar em seu segundo disco, Wild Planet, que trouxe a altamente energética Private Idaho, e seguiu empilhando hits ao longo da carreira. Em 1985, se apresentaram no Rock in Rio, que veio a ser a última aparição pública de Ricky Wilson.

Dito isso, Steve Albini ainda me paga por ocupar a minha mente com toda essa informação. E obrigado por isso, Steve Albini!

Ouça The B-52’s aqui 


Por Brunno Lopez

HORIZONTE DISTANTE 

Clássicos talvez não sejam, obrigatoriamente, uma unanimidade incontestável. Ao menos, espero que não sejam, pois assim é possível trazer exemplos mais pessoais desse conceito tão importante. 

Pensando além da própria música em si, lembrei-me do poder de um disco dentro de um contexto caótico em que vivia. “Horizonte Distante” me trouxe respostas já nos arranjos de ‘Sol da Meia-noite’. Guilherme de Sá sequer cantava as primeiras frases e aquilo tudo já fazia sentido. É engraçado pois, em termos técnicos, nem é o álbum com poder de soar clássico entre todos da banda. Mas por tantos turbilhões externos, ganhou um status absurdo de notoriedade.

Mesmo depois de tanto tempo, essa postura se reafirma com tranquilidade, mostrando que a força desse disco não morreu abraçado apenas no momento especial que foi experimentado. As tensões se resolveram e Horizonte Distante ficou mais próximo.

Ainda bem.

Ouça aqui 


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana