Newsletter Silêncio no Estúdio Vol. 190

13  de março de 2023


Bom dia, boa tarde e boa noite queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio. Na newsletter desta semana, nosso time destaca as principais notícias, curiosidades, acontecimentos relevantes e/ou inusitados do mundo da música ou, simplesmente, alguma curiosidade ou indicação. Claro que, cada um à sua maneira, e abordando sempre o universo musical de sua predileção.  


NOTÍCIAS & VARIEDADES

Por Bruno Leo Ribeiro

O QUE GOSTO E O QUE ME INSPIRA

Na minha cabeça, existe uma subcategoria de música, que além de gostar, me inspira. Nem todo disco que escuto penso que seria um disco que eu adoraria ter feito. Algumas coisas apenas aprecia, amo, curto e me emociono. Outras eu quero ser parte. 

Cresci ouvindo Heavy Metal, Rock e MPB. Por mais doido que isso pareça, no quarto com meu irmão mais velho, eu ouvia Metal, no quarto da minha irmã ao lado estava tocando The Cure e na sala meus pais colocavam Roberto Carlos, Chico Buarque e Maria Bethânia. Deu pra curtir tudo um pouco, mas nem sempre me imaginei tendo uma banda e fazendo certos tipos de som.

Quando no meio dos anos 90 fui conhecendo bandas como Breeders, Oasis, Smashing Pumpkins e cia, parece que se abriu um portal no meu coração para o tipo de som que eu queria fazer e o som que eu simplesmente gostava. 

Os anos foram passando e fui aprendendo a criar minhas músicas e até a metade ali dos anos 2000 eu estava bastante decidido qual seria o meu som. Aquela inspiração que vinha de Blondie, The Cure e Tears For Fears, foi se misturando com o que estava aparecendo. Flaming Lips, Doves, PJ Harvey, Cardigans e The Killers. Não necessariamente eu sou mega fã das bandas e artistas citados, mas todos tem um lugar nas minhas inspirações.

No festival do meu imaginário, a noite que eu vou tocar vai ter The Cure, Tears For Fears e Blondie pra fechar a noite. Em sequência, o Keane, Snow Patrol, Cardigans e Flaming Lips vão agitar o fim de tarde do pessoal, mas não antes de todo mundo curtir um show do Pato Fu, Gram, Plebe Rude, Los Hermanos e Marisa Monte.

Abrindo o dia, eu faria meu show feliz da vida, quase homenageando todos esses grandes que tocariam depois de mim. Porque a música e criatividade é sobre isso. Referências, gostos e inspirações. E cada dia que passa, consigo entender melhor onde estão os meus gostos e onde estão minhas ideias.

E você? Como seria o Festival se você fosse um artista abrindo o dia? 

PS: Pra fechar dando dicas. O último disco que ouvi e amei foi o novo do Periphery chamado Periphery V: Djent Is Not a Genre (Ouça aqui)

O último disco que ouvi e pensei, “nossa, esse é um disco que eu gostaria de ter feito foi o Neon Noir do Vile Vallo (ex-HIM). (Ouça aqui)

Será que dá pra sentir a diferença? 🙂


Por Vinícius Cabral

O INSTRUMENTO FEMININO?

Como vocês já devem saber, a godofredo agora tem uma baixista. O fato revelou uma série de questões por pessoas próximas. A principal talvez seja: “será que mulher no baixo é um clichê do rock alternativo?”. 

Isso certamente faz sentido se considerarmos a “dinastia Kim” (Kim Gordon*, Kim Deal e … Kim Jon-Un, kkkk, brincs), mas talvez não seja uma verdade tão universal assim. Alguns cânones deste nicho, como The Velvet Underground, Beat Happening ou Yo La Tengo, todas tinham mulheres na formação. Mas na bateria. O shoegaze e o dreampop também destacam a presença feminina, mas muitas vezes nos vocais, na guitarra, e/ou nos teclados. Tem sido cada vez mais comum, também (ainda bem), as mulheres assumirem todos os instrumentos em bandas dos gêneros. Talvez não exista, então, um padrão. Certo?

Não sei. Dada a imensa quantidade de bandas com mulheres baixistas, em outros gêneros também, fomos mais fundo. Em conversa com a Camila Soares, baixista da godofredo, chegamos até a lenda, Carol Kaye. Para quem não a conhece, Carol foi musicista profissional de sessões musicais nos EUA durante décadas. Participou de mais de 10.000 gravações, incluindo seções da Motown, entre muitas outras. Foi responsável por linhas de baixo antológicas, como a de These Boots Are Made For Walkin’, gravada por Nancy Sinatra, e Good Vibrations, clássico absoluto dos The Beach Boys

É a parceria com os The Beach Boys, exatamente, que se destaca para os indie heads como a gente. Os baixos precisos e marcantes de Pet Sounds (para mim até hoje o maior álbum que existe) foram tocados pela Carol. Provavelmente vigiada de perto pelo também baixista (e obsessivo, claro) Brian Wilson, que dirigiu toda a gravação como um maestro maluco. A identidade de Kaye, porém, se ressalta grandemente em Pet Sounds, quando analisado o conjunto das gravações e linhas de baixo da musicista. Seria um disco bem diferente com o Wilson assumindo os baixos. 

Mas não. O baixo não é um instrumento tipicamente feminino. Claramente, esse tipo de determinação de que um certo estilo, ou instrumento, é mais afeito às mulheres, é tão machista quanto excluí-las de uma análise histórica sobre qualquer gênero. Porém, é importante lembrar que a história do baixo no rock tem a participação fundamental de mulheres em sua construção. E que há tradições do gênero (com seus múltiplos subgêneros) que foram construídas com mulheres em total condição de protagonismo. 

Em tempo: este texto foi escrito no Dia Internacional Das Mulheres. Mas sua ideia surgiu na semana anterior, a partir do show da godofredo. Não sendo, assim, uma homenagem genérica em função da data. Acho que as mulheres precisam de direitos fundamentais equânimes. Precisam ter o controle reprodutivo e condições iguais de salário e participação política. O fato de não termos atingido tais marcos civilizatórios é apenas um enorme indicativo do quanto falhamos como sociedade. Este texto é, portanto, apenas uma homenagem à Carol Kaye, e à impressionante participação das mulheres, em geral, na história do rock alternativo

*Em sua autobiografia, A Garota Da Banda, Kim Gordon argumenta que a guitarra seria um privilégio dos caras. Ela sempre quis tocar guitarra também, e é aí que toda essa reflexão se aprofunda: quantas mulheres não foram parar no baixo, simplesmente, porque as guitarras eram instrumentos “de garotos”? Ainda bem que isso está mudando. Haja visto a crescente venda de guitarras focada no público feminino. 

Veja um compilado das melhores linhas de baixo de Carol Kaye aqui 


Por Márcio Viana

A OUTRA KIM

Quem acompanha esta newsletter há um tempo razoável já deve ter se deparado com algumas situações em que os textos de cada um dos integrantes dialogam entre si. Com uma frequência mais comum, volta e meia opto por complementar alguma informação levantada pelo Vini, meu vizinho de cima neste condomínio de ideias.

Aproveitando a bola levantada sobre mulheres baixistas, quero falar sobre Kim Shattuck.

Entre 1985 e 1990, Kim foi baixista do grupo The Pandoras, e depois formou o The Muffs, no qual foi vocalista e guitarrista de 1993 a 2019, ano em que faleceu, aos 56 anos, vítima de ELA (esclerose lateral amiotrófica).

Em 2013, sem interferir no trabalho com o The Muffs, a musicista foi recrutada para ser a nova Kim dos Pixies, após a saída da lendária Kim Deal, assumindo o baixo do grupo em junho daquele ano.

Talvez por seu comportamento extrovertido, até pela empolgação em estar fazendo parte de uma banda icônica do indie, a artista não durou muito no cargo, tendo sido repreendida pelo empresário da banda por ter feito um stage diving em um show. Ao final da turnê de 2013, sem explicações, o mesmo empresário a demitiu por meio de um telefonema, e ela seguiu em frente com The Muffs. Tocando guitarra.

Quanto aos Pixies, a banda foi (literalmente) em busca de paz, que encontrou na ex-Perfect Circle e Zwan, Paz Lechantin, baixista que segue ainda hoje com a banda, tendo se apresentado recentemente no Brasil, inclusive. Talvez a longevidade se explique pelo fato de Lechantin não praticar stage diving.

Fica então a reflexão complementar ao que o Vini já tratou muito bem: além de se limitar a um determinado instrumento, uma garota precisa se limitar a um determinado comportamento se quiser estar em uma banda com homens?

Ouça o primeiro álbum do The Muffs (1993)


Por Brunno Lopez

VOLTAS E VOLTAS

Estamos celebrando quebras de hiatos em todas as esferas artísticas, principalmente na música e no cinema. E isso traz aquela reflexão irresistível que sempre paira sobre esse tipo de acontecimento: “O novo tem a chance de fazer sua própria história para futuramente ganhar uma sequência ou está fadado a sucumbir diante de sucessos de outrora que voltam repaginados?”

Bom, talvez possa ser algo puramente geracional. Reviver uma banda ou filme com a bagagem que possuímos em dias atuais traz aquela sensação nova de experimentar o passado com os traços do presente. Isso explica o Paramore espalhar o frescor de sua música para fãs de outrora, evidentemente embalando canções clássicas nesse resgate de identidade. Estamos viajando no tempo sem sair de 2023 e essa onda está cada vez mais incontrolável. 

Tivemos a reunião do Titãs para shows, o anúncio da continuação de “O Auto da Compadecida”, tivemos a quarta versão de Matrix e um vindouro álbum do Extreme. São sequências de acontecimentos, junto com Hayley Williams e sua turma, que certamente aquece os corações de uns em detrimento de outros. Não existe mais saudade quando podemos matá-la de tempos em tempos. Isso pode matar os novos álbuns e os novos longas de artistas que sequer sabemos se poderemos amá-los na mesma intensidade?

Fica a interrogação em forma de exclamação.


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana