Newsletter – Silêncio no Estúdio Vol. 139

21  de março de 2022


Bom dia, boa tarde e boa noite queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio. Na newsletter desta semana nosso time destaca lançamentos que têm feito suas cabeças. 


LANÇAMENTOS

Por Bruno Leo Ribeiro

MOTOMAMI

É sempre um desafio falar sobre um disco que você sabe que é ótimo, mas não te emocionou tanto. Gosto de deixar bem claro que minhas opiniões são sempre emocionadas e clubistas. Não quero fingir que sou um crítico musical.

A crítica musical tem que debater a obra e com o novo disco da Rosalía “Motomami”, tenho que debater sobre a obra.

Enquanto artistas estão aí se preocupando em entrar em Top Charts do Spotify global fazendo a música que é a onda do momento, usando os fãs pra ficarem mandando dinheiro pros gringos darem play e ter mais pontos na Billboard, outros artistas estão inovando.

Goste ou não do Motomami, Rosalía faz arte.

Ela poderia simplesmente usar sua mistura de música espanhola, meter uns beats de trap e criar refrões que colam e seguir para as paradas, mas ela escolheu ser artista.

Muita gente quer ser celebridade antes de criar suas músicas e a Rosalía ganha fãs fazendo arte. 

Talvez inspirada pelo tanto de artistas conhecidos pelo mundo vindos da Espanha, ela queira fazer arte e ser parte da história artística do seu país. E acho que ela está no caminho perfeito e ganhando respeito até de quem gritou nas redes sociais que a tal música Chicken Teryaki era ruim.

Pensando como obra, Motomami é um disco de Art Pop, com elementos de flamenco espanhol, com ritmos latinos, beats modernos e linhas de voz e melodias que são difíceis de identificar. Isso se chama inovação.

Meu único ponto, que não me fez gostar pessoalmente tanto assim do disco, é que as músicas são curtinhas demais. Faz sentido em toda a obra e sua sequência, mas pra mim, quando entrava na vibe da música, ela acabava. Não atoa que minha favorita do disco é G3 N15, que tem 4 minutos.

Mas é isso. É um disco que gostei, mas não me emocionou tanto, mas sei que é ótimo e que merece destaque no ano. Racionalmente é um disco nota 9. Se joga.

Ouça aqui o Motomami


Por Vinícius Cabral

O CANTO DE NILÜFER

Eis que surge um dos primeiros consensos de 2022. Toda a (assim chamada) mídia especializada está encantada com Painless, o sophomore da (bela e talentosíssima) britânica Nilüfer Yanya. E não é à toa. Trata-se de um disco que, no mínimo, expande as possibilidades do “novo indie” que tem se desenhado nos últimos anos. A mistura única que Nilüfer faz entre guitarras indie, violões ambient e batidas eletrônicas que ecoam o melhor das experiências noventistas em alternativo-experimental (Beck, Björk, Massive Attack), carregam sua voz (aveludada e densa, à lá Sade) a lugares de conforto – e confronto, a partir de letras autoconscientes e inquietas. 

Nilüfer atinge sínteses interessantíssimas, com camadas inteligentes e sofisticadas. É o que se ouve na belíssima Midnight Sun, ou em Shameless – uma obra-prima, que só se diminui um pouquinho por lembrar demais a ponte de Miss-Shapes, do Pulp. Aliás, há várias canções aqui que remetem a outras canções (Stabilize, alguém?!), o que, incrivelmente, não se trata de um ponto tão frágil do álbum – justamente porque Nilüfer mescla tudo em sínteses muito sofisticadas, que perdoam até esses pequenos “esbarrões” inconscientes. Isso tudo sem contar na gigantesca semelhança entre a faixa de abertura, The Dealer com a nossa … Marina Lima! Tudo ali lembra a compositora brasileira: batida, violão, melodia. Feliz acidente?

Para finalizar este pequeno ensaio, acho importante registrar também que se trata de um disco que cresce absurdamente – The Mystic, a penúltima faixa do disco, é uma das coisas mais incríveis deste ano. Seguida pela noventista Anotherlife, um upbeat inusitado, divertido e intenso, que fecha o disco com chave de ouro. Um trabalho a ser bem mastigadinho ao longo do ano. 

Ouça Painless aqui


Por Márcio Viana

TEM ANJOS VOANDO NESTE LUGAR

Existe uma tentação muito grande, e eu confesso aqui que cometi este pecado, de colocar o grupo australiano Gang of Youths na caixinha de “bandas que se parecem com U2”. Mas embora a voz do frontman Dave Le’aupepe em muitos momentos lembre a de Bono, e a sonoridade de angel in realtime traga algumas referências que remetem a um elo entre o U2 de The Joshua Tree e o de Pop, a banda é muito mais do que isso, e o disco em questão, grandioso.

Até porque, para além de uma semelhança advinda da crença religiosa de Le’aupepe, o conceito do álbum foca na perda do pai sofrida em 2018 pelo vocalista, e a descoberta de alguns segredos reveladas a ele no leito de morte: a existência de uma família a qual abandonou, enquanto vivia entre Samoa e Nova Zelândia.

A revelação fez com que o vocalista, acompanhado de sua esposa, fosse em busca de seus irmãos até então desconhecidos, e a tal jornada resultou nas composições de angel in realtime, além da coleta de alguns sons e corais das ilhas da Polinésia.

Sabendo de toda a história, o disco acaba por adquirir toda uma carga emocional relevante, e convida o ouvinte a escutar o álbum como um plano-sequência, desde as lembranças tristes da partida do pai em you in everything até a nostalgia das recordações sobre a relação com o futebol e sua admiração por Maradona, em hand of god (sacou a referência?) e goal of the century, passando pela delicadeza de como o cantor descreve seus irmãos em brothers.

Parece U2? Às vezes, mas coloque aí nessa mistura um pouco de Nick Cave, David Gray, Wilco, Sufjan Stevens, The National e outras referências, além de muita originalidade. Até aqui, um dos discos mais bonitos do ano. 

Ouça angel in realtime


Por Brunno Lopez

TRILHA SONORA DE QUATRO MÚSICAS

Falando bem a verdade, o primeiro play desse EP do Fastball não foi exatamente a coisa mais empolgante que escutei ultimamente. Ainda mais quando a canção que abre o material fica o tempo todo nos lembrando de “My Girl”. O próprio Márcio Viana fez essa observação em nosso grupo do podcast e, realmente, é um artifício sonoro que faz o som ficar rondando o The Temptations.

Mas depois de um tempo, ouvindo com mais calma e sem nenhuma pretensão, a faixa em questão “Soundtrack”, melhora muito. E não só ela.

As tracks seguintes, ainda que modernas, também conseguem nos fazer lembrar da banda que explodiu com “The Way” e que talvez devesse estar num lugar mais confortável dentro da cabeça das pessoas que amavam música no fim dos anos 90.

O fato é que, com pouco mais de 11 minutos e 17 segundos de tempo total, Tony Scalzo, Miles Zuniga e Joey Shuffield levam um pouco de frescor para essa geração tão indiferente à própria identidade. 

Ou seja, um disco que começou com uma atmosfera de que nem valeria seguir em frente, acabou com gosto de quero mais.

Ouça aqui


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana