14 de fevereiro de 2021
Bom dia, boa tarde e boa noite queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio. Na newsletter desta semana, nosso time destaca as principais notícias, curiosidades, acontecimentos relevantes e/ou inusitados do mundo da música ou, simplesmente, alguma curiosidade ou indicação. Claro que, cada um à sua maneira, e abordando sempre o universo musical de sua predileção.
NOTÍCIAS & VARIEDADES
Por Bruno Leo Ribeiro
HOMENAGEM MARAVILHOSA
Desde que começou a gravar vídeos fazendo covers de bateria (e outros instrumentos) no Twitter mostrando muito carisma e muita alegria, Nandi Bushell nos surpreendeu novamente.
Depois de desafiar até Dave Grohl e até parar no palco de um show do Foo Fighters, ela andava um pouco sumida no começo desse ano.
Parece que o motivo ficou bem claro. Ela estava treinando pra tocar Tom Sawyer do Rush.
Ela postou nas redes sociais, “Este é para você, professor. Eu queria tentar uma música do @rushtheband que realmente me desafiasse. Eu assisti a uma entrevista que o Neil Peart disse que Tom Sawyer “sempre foi difícil de tocar.”, então pensei em tentar. É realmente muito divertido tocar.”.
O vídeo rodou a internet inteira e claro que o Rush oficial não deixaria passar. Em sua conta oficial do Rush, o guitarrista Alex Lifeson respondeu a Nandi.
“Oh Nandi Bushell, você trouxe lágrimas aos meus olhos com essa homenagem! Tom Sawyer é uma música muito difícil de tocar a bateria e você a tornou muito divertida. Neil teria adorado sua performance e seu sorriso maravilhoso, assim como Geddy e eu! – Alex”.
Eu senti a mesma coisa que o Geddy e o Alex. Agora é hora de você também ver essa homenagem da Nandi.
Veja aqui o vídeo da Nandi Bushell
Por Vinícius Cabral
MUITO ALÉM DO SPOTIFY
Em 1999, a Motor Music, de BH, trouxe a banda Seaweed para uma turnê nacional. Eu fui no show deles no Garage, no Rio. Ninguém conhecia a banda, mas a casa estava lotada.
A treta está instalada. Há muitos anos, artistas e produtores vêm alertando para a falta de ética nas práticas comerciais do Spotify. Que a corda tenha estourado por causa de um conteúdo de desinformação veiculado pela plataforma, não me espanta mais. É um claro sinal de que, nos tempos de hoje, as tretas da pós-verdade valem mais do que as condições materiais objetivas. E é para isto que quero olhar agora: para as condições práticas da formatação do streaming como modelo.
Na verdade, o Spotify é, em geral, a mais abusiva destas plataformas. O que não significa, obviamente, que o problema seja especificamente da empresa. Há todo um desequilíbrio no modelo de negócios do streaming, como um todo. Como bem apontou o mestre Steve Albini neste fio ilustrativo no Twitter, o streaming perpetuou (ou ressuscitou) o controle das majors. Neste processo, há muita coisa sobre os mercados independentes que a gente simplesmente se esqueceu (e que Albini ressalta de maneira brilhante).
A partir de meados dos anos 80, as bandas independentes ganharam potência devido a um modelo de negócios estruturado com selos igualmente independentes. Com total controle sobre a produção e distribuição de seus produtos, as bandas indie, em geral, lucravam mais com suas obras do que outros grupos atrelados a grandes gravadoras. Os acordos no cenário independente não previam os escravizantes adiantamentos das majors, baseando seus modelos em uma divisão, em geral, 50-50 de investimentos e distribuição de receita. Não é à toa, afinal, que eu fale até babar da potência da década de 90, que viu uma profusão de bandas bastante fora da caixinha, com projeções comerciais razoáveis.
Há até hoje um verdadeiro ecossistema de selos independentes, responsável por 80% de tudo o que eu escuto (ou mais). Um ecossistema, claro, possibilitado por este contexto. É claro que hoje muitos desses selos foram incorporados por majors como distribuidoras internacionais (o que explica um apagão, por exemplo, no mercado lojista de CDs e vinis de artistas destes selos). Mas há também outro elemento importante para pensarmos aí. Toda a profusão de selos independentes chegou timidamente ao Brasil, onde algumas (poucas) iniciativas foram valentes e pioneiras, mas não duraram – talvez por terem atingido seus picos no período em que o mp3 começou a derrubar a venda de CDs, em meados dos 2000.
Se na gringa tivemos a consolidação dos selos referenciais do mercado alternativo (4AD, Domino, Matador, Sub Pop, Mexican Summer, Secretly Canadian, Merge, Rough Trade, Captured Tracks, Dead Oceans, entre muitos outros) o Brasil teve, entre final dos 90 e início dos 2000, iniciativas como Trama (e a pioneira Trama Virtual), Midsummer Madness, Motor Music e a Monstro. Foram poucos, e valentes, os projetos. Mas já chegaram causando, e esquentaram um contexto de profusão de bandas indie que, até hoje, deixam muita saudade.
Vocês devem estar se perguntando: bom, ok. Mas o que isso tudo tem a ver com os streamings? Objetivamente, estas plataformas destruíram (a partir de iniciativas pioneiras e mais democráticas, diga-se, como Trama Virtual e, mais tarde, o MySpace) a viabilidade dos selos independentes, embora eles continuem existindo de forma totalmente desfigurada (inclusive com a criação de múltiplos selos minúsculos, muitas vezes de uma banda só, ou de um conjunto de bandas de públicos reduzidíssimos). Com o surgimento das plataformas, de repente, toda e qualquer banda podia lançar seu próprio material online sem muitos custos. O que, de início, parecia a maior emancipação que o setor independente poderia desejar. Ledo engano. A suposta autonomia é, tão e somente, uma autonomia de fachada; você pode, sim, colocar seu álbum para ser ouvido em todas as plataformas gastando muito pouco. Mas, sem selos fortes, festivais de circulação e produtos físicos (as únicas fontes de receita para artistas independentes) e afundados em um mar de lançamentos em plataformas cujos algoritmos literalmente escondem quem não tem estrutura ($$), os artistas independentes estão desaparecendo. E, não, o Bandcamp, sozinho, não consegue segurar este cenário.
Falo sem exageros. Nunca tivemos tanto acesso a tanto artista, e nunca ouvimos tão poucos artistas independentes. Essa é a verdadeira treta, que vai muito além do Spotify. O que fazer para reverter o quadro? Eu não sei, mas proponho o debate para que possamos pensar algo juntos.
Contracapa do Brighten The Corners, do Pavement, lançado em 1997 no Brasil graças à Trama, em parceria com a Matador.
Por Márcio Viana
THEY SAY I’M DIFFERENT
Existem verdades muito duras de encarar. Uma delas é a de que vivemos em um mundo sem a presença física de pessoas que foram artífices de grande parte do que somos em termos de música. Temos uma vida para tocar sem David Bowie, Lou Reed, João Gilberto, Eddie Van Halen ou Itamar Assumpção. Mais recentemente, já neste ano, precisamos encarar um mundo sem Elza Soares, e o quanto ficamos menores desde sua partida.
Eis que, ainda longe de nos recuperarmos do choque, um duro golpe veio na sequência: em 9 de fevereiro perdemos Betty Davis, 77 anos, e também perdemos o rumo.
Betty Davis nasceu em Durham, na Carolina do Norte, e começou a escrever letras de canções aos dez anos. Aos 22, envolveu-se com ninguém menos do que Miles Davis, com quem permaneceu casada durante apenas um ano, e de quem ganhou o sobrenome, mas a quem deixou uma imensa influência sobre a concepção musical.
Livre da obsessão de Miles Davis – que chegou a colocar em dúvida sua fidelidade, acusando-a até de o estar traindo com Jimi Hendrix – Betty se dedicou ainda mais à música, lançando álbuns clássicos como Betty Davis (1973), They Say I’m Different (1974) e Nasty Gal (1975).
Além de pioneira na música soul e funk – há que se considerar que não haveria nomes como Prince sem que houvesse Betty Davis – a cantora foi também fundamental no discurso em defesa das causas raciais e de gênero. Isso, infelizmente, teve seu preço: as rádios não tocavam suas músicas, e suas obras primas acabaram por ter baixa vendagem.
Nada disso, porém, vai apagar todo o legado de Betty Davis. Vamos nos recuperar, porque temos que nos recuperar. Mas o mundo nunca mais será igual.
Ouça They say i’m different, de Betty Davis
Por Brunno Lopez
PÉS DESCALÇOS (E NÃO ESTOU FALANDO DE UM DISCO DA SHAKIRA)
Certos relatos transcendem as observações técnicas pois quando as coisas são feitas do mais profundo coração, fica impossível enxergar a música nos critérios tradicionais.
É assim que meus ouvidos receberam a voz de Joss Stone em seu novíssimo álbum, o “Never Forget My Love”. Como se você precisasse pedir, Joss. Claro que nunca vamos esquecer seu amor. Não podemos nos esquecer de algo que sempre lembramos, todos os dias. (Ao menos eu e o Celso, nosso apoiador que já teve a honra de ver essa cantora de perto).
O Raul Gil ensinou que quando uma coisa é boa a gente tira o chapéu. No caso da Joss, eu tiro os sapatos.
Álbum do ano? Pra mim, já está entre os 3.
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana