Goo do Sonic Youth faz 35 anos e continua essencial para entender o rock alternativo

Lançado em 26 de junho de 1990, Goo é um disco barulhento e elegante que ajudou a empurrar o rock alternativo do submundo para o centro da cultura pop.

Eu não seria o que sou sem todos os discos que ouvi na vida. Cada um deles me mudou de alguma maneira. Alguns mais, alguns menos. Alguns pelo contexto. Alguns pela inovação. Alguns por consolidarem meu gosto e outros por mudarem meu gosto. De todas essas mudanças, os que expandem meu gosto são os que mais me lembro com carinho e apreciação.

Graças ao Lado B da MTV Brasil, uma loja de CD e fitinhas dos amigos, conheci e tive contato com o Goo do Sonic Youth. Não sabia nada sobre a banda. Nem a história por trás da sua icônica capa ilustrada. Não sabia que a música que mais gostava tinha o Chuck D do Public Enemy fazendo participação, e nem o que aquelas interpretações da Kim Gordon significavam. Mas aquele som (ou barulheira) me encantou.

Completando 35 anos hoje, esse é um disco que não só mudou a minha vida. Foi um marco. Sem Goo, sem Nevermind do Nirvana. Ele poderia até existir, mas as portas para a sonoridade de guitarra distorcida ser aceita em gravadoras e rádios têm tudo a ver com esse disco. Bandas inúmeras não existiriam. Foi no Goo que o Sonic Youth lançou seu primeiro disco em uma grande gravadora. Coincidentemente ou não, foi a Geffen que também assinou o Nirvana logo depois.

Um dos papéis dos nossos textos aqui do Silêncio no Estúdio sobre clássicos é tentar explicar o contexto e os motivos de um álbum ser importante. Gostando ou não, é sempre bom catalogar esses discos fora da curva. Tanto pra gente pelo menos saber o que acontecia na música nos anos em que os discos foram lançados, quanto para entender como chegamos até aqui.

Quando escutamos “Tunic”, por exemplo, entendemos os sentimentos da época. “Ei, mãe! Estou aqui em cima. Eu finalmente consegui! Estou tocando bateria também! Não fique triste. Essa banda não soa tão ruim”. É com essa energia de liberdade e de irreverência artística que Kim Gordon, Lee Ranaldo, Steve Shelley e Thurston Moore entregam um disco emblemático.

Em “Kool Thing”, o grande hino do disco, com um riff de guitarra que explodiu minha cabeça quando ouvi a primeira vez, há uma participação de Chuck D do Public Enemy. A música faz uma sátira feminista do machismo no rock e no hip hop.

A capa do disco poderia ter uma tese própria. A capa foi criada pelo artista Raymond Pettibon, conhecido por suas ilustrações ligadas à cena punk de Los Angeles, principalmente pelas capas dos discos do Black Flag e flyers da SST Records. A arte da capa é uma ilustração em preto e branco, em estilo de quadrinhos, que mostra um casal em um carro e a frase:


“I stole my sister’s boyfriend. It was all whirlwind, heat, and flash. Within a week we killed my parents and hit the road.”

Em tradução criativa: “Eu roubei o namorado da minha irmã. Foi tiro, porrada e bomba. Em uma semana, matamos meus pais e fomos pra estrada.” Nada pode ser mais punk que isso. Tem sim. A Kim Gordon, além de maravilhosa, tem uma foto famosa usando uma camisa escrita: “As mulheres inventaram o punk, não a Inglaterra”. Rainha!

Voltando para a capa. Ela é uma ilustração baseada em uma fotografia real de 1966, do casal Maureen Hindley e David Smith, que testemunharam em um assassinato brutal. Em 6 de outubro de 1965, David Smith, Maureen Hindley, a irmã de Maureen chamada Myra Hindley e o namorado dela, Ian Brady, estavam juntos após beberem vinho na casa de Maureen. David foi acompanhar o casal até a casa deles e, quando entrou, viu Ian Brady atacar um homem chamado Edward Evans com um machado.

Em choque, David Smith ajudou os assassinos a limpar o local e, com medo de ser envolvido, voltou para casa, contou o que viu para Maureen Hindley e ligou para a polícia. David virou testemunha principal no julgamento, e a foto famosa que virou ilustração do Goo é do casal dentro do carro chegando no tribunal na época do julgamento.

O álbum Goo do Sonic Youth é um marco essencial na história do rock alternativo por vários motivos, tanto musicais quanto simbólicos. Mostrou que uma banda com raízes no punk, no noise rock e no experimentalismo podia alcançar reconhecimento mantendo suas características estéticas. O disco espalhou temas intelectuais, políticos e artísticos que eram pouco discutidos fora do punk e do art rock.

Esse disco não só mudou a minha percepção sobre o rock, como também foi influência direta de bandas como Nirvana, Smashing Pumpkins, Hole, Pixies e My Bloody Valentine. Goo abriu espaço nas rádios e na MTV para um som mais barulhento e distorcido, diferente do hard rock e do pop que dominavam o final dos anos 80. O Goo mostra que rebeldia sonora não precisa ser periférica. Ela pode e deve estar na vitrine, sem perder sua força.

Feliz 35 anos pra essa obra prima do Rock.


Ouça o Goo do Sonic Youth


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