Espresso Della Vita: Lunare é o disco de uma banda que nunca saiu dos trilhos

Maestrick coloca carvão na caldeira do prog moderno e repagina o estilo em seu álbum mais engenhoso

Quando o Solare terminou de tocar, a sensação era de completude. A viagem poderia acabar ali mesmo que todos os passageiros estariam satisfeitos com o trajeto. Era 2018 e o Maestrick, na minha desconhecida, irrelevante e apaixonada opinião, tinha feito o melhor disco daquele ano. Já estava mais do que na hora do grupo rio-pretense atravessar as fronteiras do metal e protagonizar sua própria história dentro de uma cena que soa quase como um monólogo de notoriedade para um único grupo e seus dissidentes, com suas infinitas bandas sugando até os últimos sais minerais de suas árvores genealógicas.

Porém, se sabia que o Espresso Della Vita: Solare era apenas a primeira parte do passeio de locomotiva pelos escombros do metal criado em terras brasileiras. A diferença é que o som do Maestrick não mora num arquétipo protocolar, logo, a experiência (e segue sendo) era impossível de ser confundida com outros trabalhos artísticos.

Isso trouxe uma responsabilidade considerável para o segundo ato de obra, que chegou agora, sete anos depois. Lançado no último dia 2 de maio, o Espresso Della Vita: Lunare conseguiu manter o ritmo e elevar a experiência de todos que seguiram firmes nos vagões. Saindo dos dias ensolarados por paisagens exuberantes, as próximas paradas são mais tempestuosas e intrigantes. Musicalmente falando, existe um salto significativo de produção e ideias em relação ao EDVS. Desde a intro “A Very Weird Beggining”, que cumpre o papel de abertura clássica para uma história e desemboca em “Upside Down”, energética e teatral, já dava pra notar que os caminhos estavam muito mais perigosos e, ao mesmo tempo, impossíveis de abandonar.

Mesmo com a atmosfera fantasmagórica-aventureira de “Boo!”, a maneira genial de incluir elementos burlescos nas composições reforça a assinatura da banda ao longo das faixas. É como se o Avenged Sevenfold tivesse ouvido a discografia inteira deles para escrever “A Little Piece of Heaven”. Só que o Maestrick tem uma linha de produção desse produto. Podem culpar o talentosíssimo Fábio Caldeira por toda essa visão conceitual que amarra as pontas com nó de marinheiro veterano.

“Ghost Casino” é um mergulho nessa técnica de unir uma feira circense teatral com guitarras se equilibrando em trompetes, corais marcantes que descontroem a Broadway e bumbos do mais virtuoso prog ao fim da faixa. Um espetáculo desafiador, capaz de desenhar um refrão deliciosamente cantável em meio a tantas cenas acontecendo ao mesmo tempo.

Esses elementos se intensificam, pendendo um pouco para o épico fantasioso, nos nove minutos e dois segundos de “Mad Witches”. Se acabasse tudo aqui, já merecia um aplauso de maio a dezembro, ininterruptamente. Preparem-se para um dueto de absurdo bom gosto e orquestração impecável.

O maquinista diminui a velocidade na lindíssima “Sunflower Eyes”, que começa como uma balada tradicional e ousa incluir temperos mais eletrônicos dentro de uma temática que parecia previsível. Existe um flerte com Brian May quando a música cresce e isso funciona como ponte para o ápice clássico.

Os tempos ficam mais intrínsecos em “The Root”, mostrando que o baterista Heitor Matos, o baixista Renato “Montanha” e o guitarrista Guilherme Carvalho sabem construir linhas que fariam fãs de Rush, Dream Theater e Haken se abraçarem por 12 minutos: curiosamente, é a duração dessa canção. Um épico que só não é maior os quase 18 minutos de “The Last Station (I A.M.Leaving)”, faixa que encerra o disco.

Mas antes disso, temos “Dance of Hassad”, “Lunar Vortex” e “Ethereal”, todas com seus poderes particulares que justificam suas inclusões nessa viagem.
Agora, “Agbara” é o tipo de música que só poderia ser feita no Brasil. Ponto altíssimo da audição, misturando metal e maracatu com letras em inglês e português, uma versatilidade de estilos e propostas que não deixam outra sensação a não ser reverenciar e fazer o possível para que esse trem ganhe asas e alcance estações além daquelas que a banda já visitou.

Espresso Della Vita: Lunare é um dos melhores lançamentos não apenas do prog, mas de uma cena de metal que precisava de algo que não fosse apenas
mais um disco no streaming. O Maestrick entrega um material com aura de clássico, daqueles que corremos pra colecionar e ostentar com orgulho ao lado de tantos outros álbuns inesquecíveis.


Faixas:

1.    A Very Weird Beginning    
2.    Upside Down    
3.    Boo!    
4.    Ghost Casino    
5.    Mad Witches    
6.    Sunflower Eyes    
7.    The Root    
8.    Dance of Hadassah    
9.    Agbara    
10.    Lunar Vortex    
11.    Ethereal    
12.    The Last Station (I a.m. Leaving)


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