Newsletter Vol. 270

Na newsletter desta semana nosso time destaca lançamentos que têm feito suas cabeças. A coluna também permanecerá em aberto para que nossos colaboradores possam trazer pautas livres, caso o ritmo de lançamentos não seja satisfatório. 


LANÇAMENTOS/PAUTA LIVRE


Por Vinícius Cabral

LEVANDO O CACHORRO POR AÍ

Era uma quinta feira. Tinha acabado de sair de um dos cafés que chamo de escritório, com a missão de passar em dois supermercados diferentes antes de voltar pra casa. Ao sair do primeiro, caminhei por alguns quarteirões, até que cheguei à esquina da Afonso Pena com Getúlio Vargas. Com o sinal fechado para pedestres, vi um cachorrinho vira-lata (não era caramelo, por sinal, mas meio “grisalho”, preto e branco) parado na calçada, educadamente.

O sinal abriu e atravessei a rua. Para o meu espanto, com o doguinho caminhando comigo, lado a lado. Chegamos a outro cruzamento. Ele parou antes de mim, sem comando algum e, novamente, ficamos juntos esperando o sinal abrir. Assim foi por mais dois cruzamentos, quando comecei a me comunicar com ele com assobios e gestos, indicando quando parar e quando andar. Não precisava, eu sei. Ele já tinha a experiência de rua.

*A essa altura eu já estava perfeitamente convencido de que eu e aquele nobre vira-lata estávamos compartilhando algo muito íntimo. Eu, com uma música na cabeça, dando zigue-zague pela cidade com uma sacola na mão. Ele, me acompanhando e me seguindo.

Quando cheguei à Rua Paraíba, esquina com Getúlio Vargas, desci à direita. O doguinho seguiu reto. “Nos despedimos aqui”, pensei. Eu nem havia ainda dado um nome pra ele, mas a vida é assim mesmo. Às vezes a gente tem que saber desapegar mesmo antes de termos propriamente nos apegado. A melancolia não durou muito. Desci um quarteirão sozinho até que voltei a ouvir o som de patinhas atrás de mim; olhei pra trás e era ele.

*A essa altura eu já estava convencido de que ele havia me adotado, e não o contrário. Mas as surpresas não terminavam ali.

Segui dando voltas, com o cãozinho me segundo diligentemente, até o segundo supermercado da odisseia. “Agora ele vai embora, não é possível”, conjecturei. Afinal, já havíamos andado mais de dois quilômetros juntos, sem motivo aparente. Apenas andando e aprendendo a nos comunicar de um jeito muito particular. Fiz minhas compras e, ao sair do recinto, lá estava ele. Sentadinho me esperando.

Não havia nenhuma dúvida agora: éramos inseparáveis. E ele é que me adotou. Como eu ainda tenho algum juízo, o suficiente para não resolver adota-lo de volta, pensei em apenas recompensa-lo. Fui à lanchonete da esquina da minha casa. Comprei um café e um pastel de queijo, como sempre. O doguinho, que é muito mais esperto que muita gente, não entrava comigo nos lugares. Ele ficava esperando. Dessa vez, no que fui buscar uma cadeira pra sentar, o vi mais longe, distraindo-se com uns pombos. O chamei, e ele veio correndo pela calçada, abanando o rabinho.

Recompensei a companhia com alguns pedacinhos de pastel que ele não recusou, mas que também não parece ter apreciado tanto. Ele não me seguira todo esse tempo porque estava atrás de comida. Era algo maior. Algo que nem eu, nem ele, nunca saberemos explicar. Mas que vivemos juntos. Segui pra casa, ele se distraiu pelas esquinas. Talvez nunca mais eu veja aquele cachorrinho que eu sequer consegui nomear. Às vezes dar nomes é diminuir as ideias. Penso sempre nisso.

*E a música? Aquela que eu cantarolava mentalmente? É um lançamento? Ainda não, mas logo será. Era o próximo single da godofredo, que se chama “Guarda-Roupas”, e que conta a história de um rapaz com seu cachorro. Nós vamos contar a verdade para todo mundo: é uma música inspirada no Elias, nosso guitarrista, com seu cão Serginho (sim, o da foto desse texto). Mas, naquela tarde especial pelas ruas de Belo Horizonte, a música era toda sobre eu e o meu amigo inesperado. A canção começa assim:

“Ele se mudou / Levando o cachorro por aí”

Obrigado por ter chegado até aqui. 🙂


Por Bruno Leo Ribeiro

A VIDA É ESTRANHA E SORTUDA.

O ano era 1994. Eu tinha 13 anos e estava na sexta série. Eu juntava o dinheirinho para o lanche no colégio (deixava de comer) para economizar dinheiro e comprar CDs. Já era fascinado pela MTV e estava cada vez mais escutando coisas novas e comprando a famosa Rock Brigade para descobrir bandas.

Acabei herdando do meu irmão mais velho a paixão por duas bandas “clássicas”: Beatles e Pink Floyd. Mas o Beatles já era o Beatles, que já existia. Não tinha nada novo para eu descobrir. Já o Pink Floyd, eu ainda poderia conhecer coisas novas. O meu Pink Floyd foi o Pink Floyd do The Division Bell.

Com o CD na mão, aquelas músicas eram as músicas do meu Pink Floyd. Eu tinha mais senso de pertencimento com elas. “High Hopes”, “Take It Back”, “A Great Day for Freedom” e “Coming Back to Life” eram os meus hinos.

Em 1995, lembro que passou na TV Bandeirantes o show dessa turnê, que virou o disco PULSE. Esse CD, que vinha numa caixinha super bacana, tinha uma luz vermelha que piscava e você podia trocar a pilha. Era o máximo. Eu ficava encantado olhando aquelas capas. Não à toa, meu projeto de conclusão de faculdade foi a análise semiótica das capas dos discos do Pink Floyd.

A banda fazia parte da minha vida, mas nunca imaginei que um dia teria a chance de ver um deles ao vivo. Era tudo imaginário. Eu colocava o PULSE para tocar e me imaginava ali no meio do público. Eu fechava os olhos em “Coming Back to Life” e me via perto do David Gilmour, fazendo um solo de guitarra imaginário junto com ele nos três solos da música.

Agora, 30 anos depois, o surreal virou realidade. Quando David Gilmour anunciou um disco novo e que faria uma pequena turnê com shows em Londres, Roma, Nova York e Los Angeles, eu precisava dar um jeito. E consegui. Na terceira noite em Roma, lá estava eu, agora de olhos muito abertos e quase sem acreditar que aquilo era verdade. Ver ele tocando “High Hopes”, “A Great Day for Freedom” e minha música favorita do Pink Floyd, “Coming Back to Life”, foi emocionante.

Tudo foi perfeito. Cheguei cedo ao Circo Massimo para aproveitar a lojinha antes de ficar muito cheia e fui presenteado com a banda passando o som lá no fundo. Eles tocaram quatro músicas do novo disco e eu já comecei a chorar ali. Foi um fim de tarde mágico. Em Roma, no Circo Massimo, rodeado de fãs do Gilmour e com uma paisagem linda ao redor, cheia de história.

O show começou e eu ainda não conseguia processar tudo. Estou até agora digerindo as primeiras músicas. Tirei algumas fotos que nem lembro direito o motivo e filmei algumas partes curtas só para registrar e provar para mim mesmo que estive ali.

Certamente foi um dos melhores shows que já fui na vida.*

Ouça aqui o Luck and Strange (disco mais recente do David Gilmour)


Por Márcio Viana

A SOLIDÃO DE ROBERT SMITH

Tem um quê de heróico no ato de se lançar em 2024 uma canção em que os vocais aparecem somente após três minutos de seu início. Em tempos de skip, o The Cure reaparece após 16 anos de seu último álbum, 4:13 Dream, com o single Alone, que precede o novo disco, Songs of a Lost World.

Com 6’48 de duração, Alone passa mesmo essa característica de ausência de pressa, e segundo li, tem a ver com situações pessoais vivenciadas por Robert Smith, relacionadas a perdas familiares.

Ou seja, Alone encontra mais reflexo em canções de Disintegration e Pornography do que naquela alegria (ok, também um pouquinho melancólica) de Lovecats e Friday I’m in Love.

Songs of a Lost Word chega às plataformas em novembro, e a considerar por este “cartão de visita”, recomendo aos fãs que reservem a caixa de lenços.

Ouça Alone aqui


Por Brunno Lopez

LADY GAGARLEQUINA

The joker is me’.

Ela entoava, naquele timbre tão seu, como se fosse fácil. É apenas a oitava faixa e a srta. Stefani Joanne Angelina Germanotta já capturou a atenção por completo. Nem sei mais em que ano estamos. São tantas releituras em apenas 9, 10 minutos de audição que a sensação de máquina do tempo é inevitável.

Sim, são 10 covers aqui. Judy Garland e Mickey Rooney que se virem pra aplaudir a abertura. A gente não sabe que precisava de mais uma versão de ‘Good Morning’, ‘Get Happy’, ‘That’s Entertainment’ e ‘Oh, When The Saints’ até ouvir. Sim, talvez a gente precise.

Às vezes (ou sempre) a música é sentida pela forma que ela nos encontra. Não dá pra saber quando é que uma abertura de canção com um trompete pode significar a epifania que salva a semana toda.

Harlequin é isso. Uma provocação de uma artista envolvida num personagem que achou que apenas a atuação seria pouco pra externar o que sentiu.

Esse é o coringa da Lady Gaga.
E sequer estamos falando de Joaquin Phoenix.

Ouça aqui


Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana

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