Na newsletter desta semana, nosso time destaca as principais notícias, curiosidades, acontecimentos relevantes e/ou inusitados do mundo da música ou, simplesmente, alguma curiosidade ou indicação. Claro que, cada um à sua maneira, e abordando sempre o universo musical de sua predileção.
NOTÍCIAS & VARIEDADES
Por Bruno Leo Ribeiro
SE NÃO ACONTECER ASSIM, NÃO ME CONTEM
Primavera de 2025. O Sepultura que conhecemos terminou sua turnê “Celebrating Life Through Death”. Derrick Green voltou a morar nos Estados Unidos e se dedica à vida pública. Greyson Nekrutman segue fazendo sucesso na internet e se lança em um projeto de Jazz com apenas super músicos de Metal. Paulo está 100% focado em seus empreendimentos (bares e restaurantes) e é visto com muita frequência jogando sinuca e tirando fotos super simpáticas com os fãs. Andreas Kisser passa boa parte do seu tempo em podcasts e fazendo canjas com artistas que vão desde a MPB até o Sertanejo, e várias matérias saem com seu nome no G1.
Depois de terminarem a turnê como Cavalera Conspiracy (tocando o Schizophrenia), Iggor volta para Londres e toca em algumas festas com seu projeto Mixhell. Max, sempre ele, grava vídeos de aniversário no Cameo e faz algumas lives tocando riffs, mas desta vez a Gloria não vai mais no Walmart sem o Max, para ele não chamar mais os ex-colegas de banda de impostores. (Ele ainda não tem telefone).
Em maio de 2025, Gloria Cavalera recebe uma ligação do Mike Patton, do Faith No More, dizendo: “Gloria, eu não queria ser intermediário, mas eu cansei de fazer um evento e pensar se chamo o Max e o Iggor ou o Andreas nas minhas festas. A gente precisa acabar com essa palhaçada logo.” Depois de alguns minutos de conversa, Gloria faz algumas ligações e uma reunião de emergência via Zoom é marcada.
Na reunião temos Max, Iggor, Paulo e Andreas. Gloria fica de intermediária e logo quebra o gelo: “Não estou aqui exigindo desculpas ou lavagem de roupa suja. Vamos ser profissionais um pouquinho? E sou profissional e minha proposta é a seguinte: um grande show de vocês quatro juntos em BH e outro grande show aqui em Phoenix. Se der bom, a gente faz os festivais na Europa e talvez shows pelo Brasil. É sim ou não. Sem pensar muito. Eu me viro e organizo isso junto com a Sharon Osbourne em 20 minutos.”
Todos os quatro falam juntos: “Ahh porra! Bora! Foda-se!”
…
Em 2026, o Sepultura continua tocando em festivais e fazendo alguns shows. A banda volta, mas sem voltar.
Cada um com seu projeto, mas com alguns shows aqui e ali. Soulfly segue firme, Cavalera Conspiracy segue firme e lançando discos com músicas novas, e o Sepultura que a gente conhecia até o “Quadra” não existe mais. O Sepultura como a gente conhecia até o “Roots” voltou, mas puramente pelo prazer de tocar aquelas músicas.
Cada um chega na sua van e se encontram no palco. Funciona para muitas bandas e nesse Sepultura do futuro, também vai funcionar. Eles até tocam no Knotfest, ideia do Eloy Casagrande.
Em um dos shows do Knotfest, Eloy e Iggor tocam juntos Territory e quem sobe no palco pra cantar com o Max é o Corey Taylor.
Grande momento da história! Eu tava lá! Foi um dos melhores dias da minha vida.
…
Essa é uma das melhores fanfics que criei na minha cabeça sobre o processo da volta do Sepultura com os irmãos Cavalera. Tudo isso sendo provocado pelas inúmeras notícias que têm saído por aí nos últimos meses. Primeiro, saiu uma matéria com o Max dizendo que não negaria uma volta, mas desde que fosse feita do jeito correto (certamente é com a Gloria tomando conta). Já o Andreas falou logo depois que seria demais ter os dois irmãos no último show da turnê de despedida da banda (ele quer é tocar e se manter relevante).
Acreditem no que vocês quiserem. Na minha cabeça vai acontecer como na minha fanfic.
Por Vinícius Cabral
O NICHO MÚSICA?
A que ponto chegamos?
Nossos debates deixaram de ser sobre gosto vs. relevância ou sobre a crise da crítica, para se voltar a um dilema: em alguns anos saberemos diferenciar o que foi produzido por um humano ou por uma máquina? Eu tenho um argumento, e o dividirei em duas partes: o mercado; a criação.
O mercado
Já cansei de descrever aqui nessas linhas o horror que a indústria pode produzir, ancorada na pirataria legalizada (streamings). O que já deveria assustar os motoristas de aplicativos, que há anos treinam as IAs para os carros autônomos que irão substituí-los em breve, finalmente vira uma preocupação para os artistas, e músicos em especial. Depois de muito aviso desesperado e inútil de várias pessoas (eu incluso), a classe artística finalmente começa a entender isso. Circulam tutoriais, por exemplo, para artistas e designers sobre como desativar o consentimento para fornecimento de imagens para os bancos de IA do Instagram.
Mas é tarde demais. Mesmo antes de conseguirmos enfrentar o primeiro enorme problema (os streamings e redes sociais extrativistas) agora temos que enfrentar outro, acumulado: o de como nossos conteúdos podem ser usados como matéria prima por empresas que os utilizarão contra nós. Pois bem. O primeiro problema ainda não foi endereçado porque ninguém conseguiu fornecer uma alternativa cabível de geração de renda (ou minimamente, de divulgação) para os artistas que se rendem às plataformas. Doação via paypal, regime de assinatura para banda, etc etc. Nada fecha as contas. Bandas até grandes, gringas, seguem fazendo meses a fio de turnês para conseguir alguma receita, e talvez não estejam conseguindo. Nem receita nem ouvintes o suficiente. Já falei sobre isso recentemente então nem vale estender. O resumo é que nos estrangularam, acabaram com as receitas, sequestraram o público, tornaram a música algo plástico, de fundo, desimportante.
Como Beato fala nesse vídeo que circulou em nosso grupo recentemente, há uma trajetória que começou quando as gravadoras perceberam que as bandas custavam demais, e que a web iria desconstruir tudo. Nunca chegaram a falir, mas esse retorno da Fênix da indústria musical é algo notório. Agora estamos aí, com uma média de 100 mil músicas sendo colocadas POR DIA nos streamings. Esse é um contexto em que sua música não faz sentido, nem a minha. Fica dado o primeiro ponto.
Estou há quase 6 meses terminando um álbum (o último deles já em estúdio) me dedicando a um processo de gravação muito delicado e criativo. Hoje eu não sei, sinceramente, se vale a pena lançar um trabalho destes. O que, finalmente, faz valer nosso “meme interno” de que “o Vini não gosta de bandas que tenham lançado álbuns”. Olha, eu até gosto, e bastante (tenho centenas deles em casa). Mas nesse contexto todo aí, realmente não sei mais o que faz sentido.
A criação
A segunda parte do meu argumento é para ser desenvolvida mais tarde, mas começa aqui com uma pergunta muito simples. Uma pergunta voltada para o nosso próprio umbigo (do rock nacional):
Há algum lançamento do nosso rock nos últimos, digamos, 20 anos, que foi fora da curva? No sentido de mudar mesmo o “game”, arrebentar as convenções estabelecidas e apontar para novas direções (tal qual um Fellini, e tantos outros, nos anos 80, ou um Chico Science nos 90, ou mesmo Los Hermanos no início dos 00s)?
Se conseguirmos responder essa pergunta eu continuo.
Por Márcio Viana
EU NÃO SEI A RESPOSTA
Sim, eu estou dialogando com o texto acima, e seja lá um sinal de maturidade ou de que na realidade eu nunca soube muita coisa, hoje em dia tenho mais dúvidas do que certezas.
O fato é que, para além do triplex que o Vini alugou na minha – e talvez na de vocês a partir do momento em que esta newsletter baixar nos seus e-mails e apps – eu já estava pensando no rock nacional. Mas não no dos últimos 20 anos.
Na minha conversa com o Alf Sá, no episódio #216, em dois momentos falamos sobre uma safra do rock brasileiro que não aconteceu, mercadologicamente falando: a segunda onda do rock de Brasília, com Finis Africae, Arte no Escuro, Escola de Escândalo, Detrito Federal, entre outros; e também o rock paulista de bandas como Luni, Skowa & a Máfia, Gueto (cuja foto ilustra este texto), Os Mulheres Negras e vários outros surgidos ali entre o meio e o final dos anos 80, quando os efeitos da abertura econômica e do Plano Cruzado já se traduziam em hiperinflação, e talvez o Deus Mercado já estivesse mais a fim de arrochar salários do que permitir que as pessoas se divertissem.
A chegada da MTV ao Brasil, em 1990, talvez tenha, ao mesmo tempo em que permitiu alguma divulgação para estas bandas, também acelerado a busca por novas ondas imediatamente posteriores a esta, que pode não ter tido tempo para mostrar sua relevância. Em contrapartida, várias destas bandas foram muito influentes e ajudaram a forjar o som que viria depois, basta pensarmos por exemplo no quanto Chico Science idolatrava o mencionado Fellini, por exemplo (a banda, não o cineasta, no caso). Se pensarmos nesta cena underground, temos também Akira S. e As Garotas que Erraram, Chance, 3 Hombres, entre muitos outros.
Não podemos deixar de citar também bandas como Picassos Falsos (já contemplados com um episódio Hinos da Música no Silêncio no Estúdio), Hojerizah, Black Future, Último Número e Sexo Explícito (que depois viraria Sexplícito). Mas estou sendo raso, há muitas outras bandas que estiveram em evidência moderada, mas nenhuma que tenha explodido. Teria esta geração sido fadada a somente figurar numa entressafra, e quando muito, levar alguns de seus integrantes para novas empreitadas de maior sucesso (John Ulhôa, por exemplo, integrou o Sexplícito antes de montar o Pato Fu)?
Talvez seja o momento de começar a fazer um apanhado deste período de bandas “só” influentes, mas não suficientemente evidentes. Eu vou avisando.
Ouça a coletânea Não São Paulo aqui
Ouça a coletânea Não São Paulo 2 aqui
Por Brunno Lopez
HOJE SEREMOS STEREOTEMÁTICOS
Em distopias futuristas, das mais elaboradas até as menos inspiradas, nunca se retratou a aniquilação da música. Seca rio, seca mar, mas sempre dão um jeito de existir um mecanismo capaz de reproduzir alguma canção – geralmente dos anos 70.
Engraçado que, por mais ‘avançada’ que seja a civilização (ou o que sobrou dela), todos estão sempre olhando pra trás. É bem possível que isso não exista muito em breve, já que não existe quase nada atual que terá poder de virar o passado pra algum futuro.
Tudo está ficando longe demais, a lacuna da produtividade marcante se espaça e, devemos concordar, temos apenas classificados de ‘disco novo’, ‘música nova’, ‘single recente’, por puro protocolo artístico.
Vejam, o Bruno Leo abriu a news numa fic deliciosa, falando de uma banda poderosa de anos passados. Da época que música era como artesanato, tinha que criar e lapidar, passar por crivos diversos, percorrer um caminho doloroso até chegar aos ouvidos de alguém.
O Vini levanta o ponto da própria razão de existir da música, nesse processo autofágico de preencher um Radar de Novidades para fazer bonito pro fã algoritmo.
Na esteira do rock nacional, o Márcio vai na veia e aborda o lado que deixamos de ver, também, de um período anterior.
Seria mesmo o apocalipse musical sendo experienciado por todos nós com nossos planos de dados e fones de ouvido com um lado só funcionando? Quem vai escrever sobre essa geração atual, quem vai conseguir ouvir os discos – ops, singles – dos artistas contemporâneos?
Antes as pessoas enjoavam do velho e ansiavam pelo novo, pois o novo trazia uma perspectiva que o antigo não tinha mostrado. Hoje, as pessoas enjoam do novo e correm pra se proteger no velho.
Curioso que, num passado recente, discutíamos se o rock tinha morrido.
Era a música.
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana