Na newsletter desta semana nosso time fuça seus apps de streaming e suas discotecas (físicas) especiais para revelar o que anda nos plays recentes, embalando seus dias. São dicas especialíssimas que revelam os gostos pessoais do grupo e reforçam toda a diversidade apresentada semanalmente em nosso podcast.
RECENT PLAYS
Por Bruno Leo Ribeiro
TODOS NASCEM GRITANDO
A St. Vincent sempre criou obras provocativas mas que não passam do limite do inexplicável. Suas características que mais gosto são sua versatilidade, referências e o humor nas suas músicas. Seu mais recente álbum, “All Born Screaming”, exemplifica isso perfeitamente. Ela mistura sonoridade que vai de Prince até Björk, passando até por Nine Inche Nails. Em seu lado mais Rock do disco, ela conta até com a participação do Dave Grohl e o Josh Freese (novo baterista do Foo Fighters) na bateria.
A faixa-título estabelece um tom inesperado com uma energia contagiante, embalada por um refrão que traz uma vibe new wave com temperos de Talking Heads. A música “Violent Times” tem um toque de tema de abertura de filme do James Bond. A consistência do disco só prova o talento da St. Vincent, misturando milhares de ideias e referências criando uma identidade totalmente singular e contagiante.
“All Born Screaming” não apenas desafia limites, mas também convida o ouvinte a uma jornada lúdica através da imaginação da St. Vincent, que pela primeira vez, produziu o disco completamente sozinha. O álbum se destaca por sua capacidade de flutuar por diferentes gêneros e ideias. Um disco que gostei bem mais do que o Daddy’s Home, seu última trabalho antes desse. Vale demais o play e sua jornada.
Por Vinícius Cabral
O FIM DA MÚSICA
O título é bait (como se isso funcionasse pra gente). A música resiste ao Twitter, ao Spotify e às alucinações coletivas perpetradas por fandoms, “críticos influenciadores” e demais bizarrices.
O lance é que temos que admitir quando é demais pra gente. Nosso parceiro Bruno Leo ouviu mais de 200 álbuns em 2021, e fritou. Eu já sou mais modesto, mas em 2021 também exagerei, e ouvi mais de 100. Fui me equilibrando, e ano passado ouvi pouquíssima coisa (ainda assim, mais do que eu gostaria, ou poderia). O lastro não é dos melhores; da minha lista de 20 melhores álbuns de 2023 talvez apenas 5 eu tenha ouvido suficientemente. Desta mesma lista, os álbuns que eu ainda ouço talvez sejam só uns dois. Porque é simples fazer a matemática. Simplesmente não temos tempo.
Não é tanto sobre o quanto a mais de informação é lançada no mundo. Isso, obviamente, já é ponto pacífico. O ponto é que nós nunca conseguimos absorver mais do que um certo limite de coisas. Quando fazemos as “cronologias” do Silêncio no Estúdio podemos focar em um ano específico. Fica sempre muito claro pra mim o quanto o distanciamento importa na hora de levantar o que realmente marcou o período. Alguns álbuns a gente esquece, e são lindos. Outros a gente comenta a vida inteira, e são superestimados. O tempo resolve muita coisa.
Em alguns anos, como 2020, com Fiona Apple, e provavelmente 2024 (ainda não revelarei com qual artista), é fácil observar que estamos diante de obras que já nasceram clássicas, e transcenderão o período. Dos nossos “melhores do ano”, tenho percebido também que quando compro o vinil ou o CD de alguns dos álbuns, consigo absorvê-los melhor nos anos que se passam. De resto, pouco se salva da lama virtual que viraram nossas bibliotecas de aplicativos. E, como tenho dito, não é que seja tudo descartável. Estamos em um período bastante fértil musicalmente, no mundo.
É preciso lembrar que, em um mundo de nuvens e uploads ilimitados, entramos em confronto com nossa cognição e memória, estas sim, limitadas a uma quantidade controlável de estímulos. O quanto é controlável ou não vai depender, é claro, da rigidez cognitiva e do “espaço” cerebral de cada um em cada momento. O Bruno, por exemplo, já conseguiu ouvir mais de 200 discos em 12 meses, mas admite que, destes 200, poucos permaneceram com ele nos anos seguintes. Minha tolerância com o excesso sempre foi menor, mas este ano passo por um desafio adicional. Em um processo profundamente imersivo de composição, não tenho conseguido ouvir os lançamentos que não param de pipocar semanalmente. Fui salvando tudo para depois, mas esse depois pode ser assustador. Quando sair do estúdio com o próximo álbum da godofredo gravado, pode ser que seja tarde demais para ficar a par de tudo.
Mas aí é que está outra coisa que tenho falado muito por aqui: nem tudo é importante. Por trás da Taylor Swift torturando os poetas e Anitta ou Ludmilla exportando o funk, existe um público exausto. Eu já entendi há muito tempo que preciso me dedicar somente ao que faz sentido pra mim.
Nesta edição de recent plays, pela primeira vez não recomendarei nenhum play. Às vezes é importante deixar o silêncio tomar conta, ouvir as canções da nossa cabeça e desintoxicar. Mesmo que eu não estivesse compondo, pelo ritmo que as coisas tem tomado em 2024 me parece ser necessário um super filtro, para não perdermos tempo com baboseiras hiper comerciais, disfarçadas com o verniz de uma relevância que não possuem. Que ajudemos a ser esse filtro.
Por uma semana, ou algumas, eu não recomendo nada para vocês ouvirem.
Por Márcio Viana
THE BOOK IS ON THE TABLE
É um tanto perigoso e não recomendável se deixar levar por hypes, seja lá de onde venham, mas usando a premissa popular de que até relógio parado acerta duas vezes ao dia, fui ouvir a incensada estreia da banda britânica English Teacher, This Could Be Texas (nota 7.4 no Pitchfork, se notas te movem a consumir algo).
Fato é que a banda, formada por colegas do Conservatório de Leeds, tem a proficiência que se espera de bacharéis em música, mas tem também uma verdade aí que agrada, e muito dela vem da personalidade de sua vocalista Lily Fontaine, que traz temas e títulos espertos para as canções, como I’m Not Crying, You’re Crying, Not Everybody Gets Go To Space e The Best Tears of Your Life.
Também faz sentido – ao menos para mim – a referência que a maioria das resenhas marca, comparando-os a Dry Cleaning e (principalmente) Black Country, New Road, mas sinto neles uma segurança maior em relação ao trabalho, talvez uma segurança de quem domina conceitos complexos de teoria musical, mas permite-se experimentar texturas mais simples.
Talvez essa segurança seja cortesia da produção de Marta Saloni, que acumula bons trabalhos com Björk, M.I.A. e Bon Iver. Ainda assim, me agradou a versatilidade e o domínio nos arranjos. O hype da crítica, neste caso, parece estar bem direcionado. Vejamos até onde esse álbum chega dentro das listas de melhores do ano.
Ouça no Bandcamp:
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Por Brunno Lopez
THANK YOU, GOODNIGHT
40 anos de banda. Ou o que sobrou dela.
Em ‘What’s Left Of Me’, faixa do último disco do grupo com Richie Sambora, Jon já deixava no ar o preço que se paga para se apresentar pelo mundo todo por tanto tempo. Um pouco disso é observado logo no início do documentário que estreou no Star+ e em outros streamings.
É curioso ver New Jersey sob o ponto de vista de alguém pós- Bruce Springsteen – que também participa do doc – e tenta se manter em atividade com o esforço que a idade cobra.
Vale a pena conhecer os caminhos doloridos do vocalista até a explosão de Runaway, um tiro no escuro que culminou na formação da banda e o que era pra ser um punhado de apresentações para divulgar o single acabou se transformando em 15 discos de estúdio.
Pra quem é fã, cada detalhezinho é um sopro de acalento. E por mais que a versão atual do grupo seja uma espécie de sobreviventes de um evento apocalíptico, o legado já foi feito.
O que vale nos quatro episódios é a parte que podemos olhar pra trás. Quando os 5 eram os 5 (podemos até dizer 6, pois Hugh tem seus dedos desde o próprio primeiro hit).
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana