Newsletter Vol. 229

11 de dezembro de 2023

A newsletter desta semana é especial apenas com clássicos que se destacam na discoteca dos nossos colaboradores. Muita coisa velha, outras nem tanto, mas sempre com algo em comum: aquele “gostinho” de clássico. Discos que não saem da nossa cabeça e dos nossos corações, independente da época em que foram lançados!


IT’S A CLASSIC

Por Vinícius Cabral

O GIGANTESCO ESPECTRO DA COLAGEM EXPERIMENTAL DE PANDA BEAR

2007 foi um ano muito louco. Nossa vida ainda não estava completamente regulada por plataformas digitais, havia (muita) pirataria, e as bandas alternativas experimentavam pra valer.

Para ancorar isso tudo, haviam espaços virtuais que ainda falavam de música neste sentido; da experimentação, da diversidade e do risco. Um dos principais era a revista Pitchfork. Aproveitando o limbo de espaços virtuais de confiabilidade do início dos anos 00, o site tornou-se referência para nerds musicais que, antes, se organizavam em torno de zines, revistas impressas com listas de melhores do ano e shows underground em inferninhos regionalizados.

As listas de melhores do ano da Pitchfork se transformaram, de 2000 a 2018, praticamente (grosso modo, claro) em um farol de resistência para fãs de música mais experimental e arriscada. As coisas começaram a se complicar um pouco depois que Kanye West borrou demais as linhas entre o experimental e o mainstream a partir de 2010 – o que marcou a década que se seguiu foi uma apropriação sistemática de linguagens experimentadas em nichos inacessíveis por um pop-”rapa tudo”. Reflexos disso encontram-se fortemente na obra, por exemplo, das irmãs Knowles (Beyoncé e Solange) pós 2016 – ambas, por sinal, bebendo na fonte do artista que provoca este texto, o Panda Bear.

Mas o que tem a ver Pitchfork, mainstream, listas de final de ano e 2007, afinal? Pois bem. O melhor álbum de 2007, segundo o site, foi este Person Pitch, de Panda Bear. Um disco arriscado, do qual já falei inúmeras vezes, inclusive em nosso Raio X sobre o Animal Collective. Ganhando a posição de discos icônicos, que cruzavam melhor as linhas entre o pop e o underground (como a obra-prima Sound of Silver, do LCD Sounsystem, que amargou um 2º lugar na lista), Person Pitch era profundamente desagradável para qualquer um que buscasse um trabalho minimamente palatável. Seu principal “single” era uma canção de 12 minutos (a inesquecível Bros), e o artista utilizava toda a veia experimental estudada por sua banda (a Animal Collective) encharcada aqui em reverb, como se os Beach Boys estivessem curtindo uma piscina de plástico entupidos de Prozac (ouçam Take Pills para entender do quê estou falando).

A premiação representou uma certa ambivalência. Por um lado os curadores da revista estavam dizendo que aquele se tratava de um espaço para um certo tipo de música. Por outro, estavam direcionando a crescente audiência do site ao valor da experimentação, prestes a ser engolida. Tem mais ou menos uns três anos que a Pitchfork desistiu de lançar provocações vanguardistas em sua lista, e tem jogado para a torcida, abraçando headliners de festival, que vão de Lana Del Rey a, este ano, SZA. As listas do site neste período são quase indiscerníveis de outras, como as da Rolling Stone (que chuta o balde, claro, mas ainda assim joga pra torcida).

Seria este mais um indício do achatamento do “midstream” e da invizibilização do underground? Esta é minha hipótese. É preciso novos espaços, em todos os aspectos. Para não ficar apenas na lamentação, dou o play neste álbum que explodiu minha cabeça em 2007, e continua fazendo o mesmo 16 anos depois. Eu concordo com a decisão da Pitchfork à época. 2007 certamente foi um ano saturado de lançamentos inesquecíveis e, por isso mesmo, precisava ter coroado como melhor do ano um disco que expandisse as barreiras dos gêneros, em uma explosão arriscada de fragmentos musicais concatenados em um conjunto explorativo, particular e esquisito.

O aspecto superficial de “colagem” que o trabalho propõe se resolve brilhantemente nos agradecimentos do álbum, onde Noah Lennox (o Panda Bear) cita uma infinidade de artistas, de António Variações à Jay Z; de Tom Jobim à Daft Punk; Person Pitch se encontra em algum ponto desse gigantesco espectro estético. E é absolutamente brilhante por causa dessas (e outras, inúmeras) relações.

Ouça Person Pitch aqui 


Por Bruno Leo Ribeiro

PACIÊNCIA É FUNDAMENTAL.

Image

A vida de um colecionador de discos precisa ter uma coisa essencial. Não é ter os discos clássicos da história, nem completar a discografia dos Beatles. A maior virtude que aprendi montando uma coleção é ter paciência.

A grande maioria dos discos que tinha em CD durante os anos 90, são os discos que coloco como prioridade pra comprar em vinil. Me arrependi amargamente de ter vendido tudo o que tinha em CD. Sobrou pouquíssima coisa. Hoje usaria aqueles CDs como complemento dos vinis.

CD é uma realidade novamente. Já se vendeu mais CD nos últimos 2 anos do que nos 10 anos anteriores. CD tem sim a melhor qualidade de som. É digital, limpo, preciso e sem ruído. Vinil é sobre um ritual. É uma magia física de uma agulha passando pelos grooves do disco e saindo som. Se isso não é bruxaria, eu não sei o que é. Mas vinil pra mim hoje em dia é mais charmoso e mais fácil. Comprar vinil é caro e morar fora facilita demais a vida de quem ainda ama essa mídia. As lojas na Europa e aqui nos EUA não fecharam e tem disco novo até numa sessão especial dentro dos Walmarts de bairro por aqui.

Mas por que toda essa volta? Como falei, os CDs que tive e hoje quero ter em vinil, são os mais difíceis de comprar. As tiragens mais caras que se acham por aí, são as dos anos 90 por motivos claros. O CD estava vendendo bem mais e a tiragem de vinil era pequena. Hoje em dia está tudo sendo relançado, só basta ter paciência.

Até os discos mais recentes estão tendo seus momentos especiais. O Blonde do Frank Ocean, acabou de ter uma retiragem e tão sendo vendido por 60 doletas (achei caro demais, vou esperar ficar mais barato). O que se sabe é que foram mais ou menos 80 mil discos e, se você fizer a conta, dá por volta de 4 milhões e 800 mil dólares por um disco.

Mês passado foi anunciado o relançamento de vários discos da Fiona Apple e fiquei no dilema de qual pegar. O que mais ouvi (e gosto) dela é o Tidal. E fiz o pedido na pré-venda e chegou ontem aqui em casa. Coloquei pra tocar e pelo amor… valeu a pena demais esperar. A tiragens que se achava por aí no Discogs começavam em 130 doletas. Com essa nova remasterização em cima dos tapes originais tá soando lindamente. E as músicas, nem se fala.

O ritual de pegar um disco, parar tudo que você está fazendo e curtir lendo as letras, é das coisas que mais gosto de fazer como amante de música. Ainda bem que tenho paciência.

Cada disco que tenho na minha estante tem uma história, e a maioria delas é uma história sobre a espera pelo momento certo.

Ouça aqui 


Por Márcio Viana

DEIXA MEU VERSO PASSAR

Você talvez não saiba, mas certamente conhece pelo menos uma música de Sidney Miller. Uma que começa assim: vai, vai vai começar a brincadeira…

Pois é, O Circo é uma adaptação de cantiga de roda feita por Miller, assim como Passa Passa Gavião, Marré-de-Cy e Menina da Agulha.

Mas para além deste segmento, Sidney Miller é dono de uma obra infelizmente curta, mas bastante criativa. Conviveu com grandes nomes, como Nara Leão, Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, entre outros.

No disco Vento de Maio, de Nara Leão, por exemplo, metade das canções são de sua autoria, e outra metade de Chico Buarque.

Em 1974, Miller lançou seu terceiro disco, Línguas de Fogo, com uma linguagem um pouco mais poética e com sonoridade próxima ao jazz-rock, embora ainda tendo um apelo ao popular. Como era comum à época, o disco foi gravado com parte dos músicos que formaram o Som Imaginário, como Toninho Horta, Luiz Alves e Robertinho Silva.

Com a direção musical assinada pelo Toninho Horta, já dá pra imaginar que o que se ouve aqui é coisa fina. Junte-se a isso letras inspiradíssimas, com trechos como Pra onde vai o som depois que o escutamos? Pra onde vai a voz que vem de nós? Pra onde vamos? e temos um clássico.

Depois deste álbum, Sidney Miller acabou saindo um pouco de cena e trabalhando na Funarte. Ainda planejava retomar a carreira com um álbum que se chamaria Longo Circuito, mas sofreu um infarto fulminante em 1980, com apenas 35 anos de idade.

A sala onde Miller trabalhava passou a se chamar Sala Funarte Sidney Miller.

Ah, e talvez você conheça um outro sucesso dele: É isso aí, gravada por Paula Lima.

Ouça Línguas de Fogo aqui 


Por Brunno Lopez

LEAD BALLON

Rosie Golan é o timbre que fez de 2011 um ano bonito. Ou pelo menos deveria ter feito. A cantora israelense compõe com a alma e escreve com uma mão no coração e os dois pés no peito. Tudo tão suave que soa violento. É o leve que machuca mais do que palhetadas na velocidade da luz.

As doze faixas são infinitos abraços que esmagam nossas certezas e espremem o que sobrou de nossa humanidade. Talvez sua alma resolva abandonar seu corpo por se apaixonar pela atmosfera de ‘Everything is Brillhiant’. É uma reação perfeitamente aceitável pela impossibilidade de resistência aos versos musicados de suas peculiares cordas vocais.

Tudo está no lugar certo, desde arranjos de violão até a percussão despretensiosa da faixa título, que parece nos levar para um lugar onde o country tem um brilho diferente.

Simplesmente inevitável.

Ouça aqui 


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana

Thanks for reading Newsletter Silêncio no Estúdio! Subscribe for free to receive new posts and support my work.