Bom dia, boa tarde e boa noite queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio. Na newsletter desta semana nosso time destaca lançamentos que têm feito suas cabeças. A coluna também permanecerá em aberto para que nossos colaboradores possam trazer pautas livres, caso o ritmo de lançamentos não seja satisfatório.
LANÇAMENTOS/PAUTA LIVRE
Por Vinícius Cabral
O SAMBA REDIME
Quem me acompanha por aqui já deve saber da minha birra com Caetano Veloso. Birra que se justifica por eu achar a performance do artista um tanto afetada mas, principalmente, pelo fato do baiano ser uma esponja que se apropria (rouba) excelentes ideias de parceiros ao seu redor e acabar sendo laureado por isso. É o que o o baiano fez com Jards Macalé, João Gilberto e tantos outros.
Mas com ou sem birra, eu não sou um idiota. Sei que Caetano tem a capacidade de compor excelentes canções, com métricas bastante particulares, letras inteligentíssimas e, eventualmente, com grandes melodias. É o que acontece nas 10 canções que o sambista Xande de Pilares interpreta neste surpreendente Xande canta Caetano. Xande devolve às métricas tortas (por vezes declamatórias) de Caetano suas origens sambistas. E faz um disco contemporâneo de samba. De samba com “s” maiúsculo. De samba tradicional. De samba sem firula.
Em Qualquer Coisa Xande reimagina a canção (que em sua versão original conta com ares ibéricos) com uma propriedade tão natural que é de se espantar que a ela nunca tenha sido gravada assim, como um samba-choro de rara potência melancólica. Cada sílaba que Xande pronuncia, manipula e desloca, parece doer na alma. O samba tem dessas, e o Xande é um mestre do gênero. Se já não era reconhecido propriamente por isso, agora será. Neste aspecto, Xande canta Caetano é muito mais do que um trabalho de covers. É, como já disse, uma obra de samba. Com tudo o que isso significa.
Até em Alegria, Alegria (que eu sempre detestei, por seus arranjos barangos e interpretações chatérrimas) Xande produz algum tipo de mágica. Parece devolver a força a uma canção já bastante surrada. Quem diria que era de samba que precisávamos, em pleno 2023? A arte tem dessas. Xande parece ter conciliado alguns anseios de um Brasil que anda meio perdido, simplesmente cantando, em arranjos sambistas, canções estereotipadas demais por uma certa esquerda-cirandeira-militante-virtual nos últimos anos. Revolucionou o Caetano.
A ponto deste que vos fala, que detesta o Caetano e detesta covers, indicar veementemente um álbum de covers do Caetano. Aproveitem este momento raro e, principalmente, o samba de Xande. Afinal, o samba redime. Até mesmo o Caetano.
Por Márcio Viana
O PASSEIO INTIMISTA DE NICKY WIRE
Dono da reputação de ser o baixista e principal letrista dos Manic Street Preachers, o que não é pouco, Nicky Wire este ano aproveitou algum tempo livre para finalizar seu segundo disco solo, Intimism, produzido lentamente ao longo da década – o antecessor, I Killed the Zeitgeist, é de 2006 – e lançado exclusivamente na plataforma Bandcamp, o que é bacana e complicado ao mesmo tempo.
Bacana porque talvez funcione como um incentivo à popularização do Bandcamp, plataforma bem mais democrática do que as demais. Complicado porque o seu aplicativo ainda capenga e limita os plays gratuitos, o que não funciona bem para se ouvir repetidamente bons álbuns, e Intimism é um deles.
Por vezes soando como os Manics e por outras totalmente diferente, Wire traz canções sem aquele climão de arena que é característica de sua banda, em grande parte por cortesia do vocalista e guitarrista James Dean Bradfield (que nome lindo!), que por sinal faz alguns solos de guitarra no disco do colega.
Mas Intimism abre mais o leque de influências, e se por vezes é bastante pop e er… “radiofônico”, como em Ballad For the Baby Blue ou Saudade (sim, o título – e só ele – é em português), também flerta com o jazz de Miles Davis nas duas versões de Migraine.
Raramente visto cantando em um microfone nas performances do MSP, Nicky Wire não compromete em sua atuação solo, em um estilo talvez comparável ao de Johnny Marr desde que encarou a missão de ser o vocalista de seu trabalho solo.
O ano ainda está no meio e talvez o Manic Street Preachers ainda lance um álbum até o final, mas para agora, Intimism é capaz de cumprir seu papel nas listas dos melhores.
Por Bruno Leo Ribeiro
ZERO TOM DE TRISTEZA
“Ah lá vem ele falar das fofocas recentes envolvendo a Crypta”. Claro! Vou falar do segundo e ótimo lançamento da banda. Tem fofoca mais edificante do que um disco novo de uma banda cheia de talento?
O nome do disco mais recente da Crypta se chama “Shades of Sorrow” e na real, não tem nenhum tom de tristeza nesse disco. O segundo álbum da banda veio com uma evolução imensa. Eu esperava um disco de continuidade, mas recebi um disco de mudança.
Ouvindo agora os dois discos em sequência, dá pra perceber exatamente o que não me pegou tanto no primeiro disco. Agora parece que elas encontraram um caminho único. No primeiro disco, existe um pequeno exagero nos duelos de guitarra e solos meio Iron Maideanos que não emocionaram tanto. Mas agora no segundo disco, as músicas são muito mais dinâmicas, com transições interessantes e influências temperadas com muito bom gosto. E pesado pra cacete!
O disco tem ótimos riffs e uma bela produção e certamente é um refresco pra quem gosta de Death Metal. Pra quem gosta de fazer exercício ouvindo porradaria no ouvido, não ouvi ainda um disco melhor no ano pra isso.
Meu destaque é pra música “Agents of Chaos”. Tem momentos Morbid Angel, tem momentos Opeth e tem momentos Death. E como canta da Fernanda Lira, hein? PQP!
Por Brunno Lopez
‘STORYTELLING’ DO BEM
Toda pessoa razoavelmente sadia, ao olhar o storytelling andando pela rua, troca de calçada. O conceito – que nasceu com boas intenções – acabou se enveredando pelo mesmo padrão estético do coach e assusta quando vemos trafegando pelas avenidas da atualidade. Entretanto, qual é a razão de mencionar o tal termo por aqui?
Bom, vamos imaginar que nem todos tenham essa nutrição repelente ao storytelling dessa geração, então, é conveniente trazê-lo aqui pra falar sobre construções de narrativa referentes ao primeiro single do novo disco do Angra.
‘Ride Into The Storm’, visualmente falando, faz bem o papel de apropriar-se de uma história maior para contar uma nova. São muitos elementos espalhados por todo o clipe que representam instantes de uma trajetória de significados.
Por enquanto, não farei nenhum tipo de análise semiótica ou decupagem do roteiro para identificar o que cada símbolo diz, o ponto aqui é apenas enaltecer a importância de se criar materiais que estabeleçam uma estrutura forte o bastante para que as pessoas possam se sentir naquilo.
E isso não é necessariamente storytelling, é sentimento. São iniciais de um personagem icônico, são estátuas de anjos, são esculturas de momentos que ganharam uma resposta orgânica a quem entra em contato.
Angra sempre fez isso muito bem, mesmo que não soubesse como as linhas se cruzariam lá na frente. Seria um dos ciclos da dor?
Veremos.
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana