Newsletter Vol. 197

RECENT PLAYS

Por Bruno Leo Ribeiro

AÇÚCAR AZUL COBRE

Minha memória detalhada nos anos 90 é bem sem foco. Eu confundo os anos e não lembro exatamente da data de cenas que lembro bem na minha cabeça. Uma das cenas, que se repetiram vendo MTV, foi ver o clipe de “If I Can’t Change Your Mind” da banda chamada Sugar. Provavelmente foi no Lado B com o Fábio Massari. Não lembro de como foi, mas lembro bem do clipe.

Nessa época eu não tinha nem ideia de quem era Bob Mould. Quem era Hüsker Dü e qual a conexão dele com a história do Punk e do Rock Alternativo. Nem tinha ideia que ele era um gay no meio daquela cena completamente masculina.

Pra quem não conhece, o Bob Mould fundou o Hüsker Dü em 1979, sendo uma das bandas mais importantes do Punk da época. Depois da banda acabar, ele lançou alguns discos solo que não deram muito certo até que ele montou o Sugar. Depois ele se aventurou na Música Eletrônica e seguiu com sua carreira solo fazendo muito disco bacana.

Mas é no Sugar que ele me emociona mais. Talvez pela conexão nostálgica de lembrar do clipe de “If I Can’t Change Your Mind”. Confesso que ouvi Hüsker Dü bem menos do que eu deveria. Sugar acabou sendo uma das bandas que lembrei de baixar os discos quando a internet ficou acessível.

O disco Copper Blue é perfeito. Eu gosto demais e foi bom demais saber que ele me influenciou de uma forma tão natural. Recebi comentários que as guitarras de algumas das minhas músicas, lembravam as guitarras do Bob no Sugar. Fiquei feliz. 

Fui conferir se essa lembrança era real e definitivamente é. Ouvi o Copper Blue tanto nos últimos dias que acho que consegui me inspirar ainda mais nesse gênio chamado Bob Mould.      

Ouça aqui o Copper Blue


Por Vinícius Cabral

A SOCIEDADE DO ATRASO

Estou tentando tirar o atraso dos lançamentos de 2023. Mas o atraso não consegue me tirar, e tenho refletido que, de Sociedade do Cansaço, poderíamos passar logo a ser a Sociedade do Atraso (ou do Fracasso). Não seria nada mal. 

Então vamos por partes. 

A seguir, uma lista de discos da cena gringa que consegui ouvir recentemente (com muito esforço), e que me marcaram. Para o bem ou para o mal. 

Wednesday – Rat Saw God

Este disco é absolutamente espetacular. Dica da amiga Raíssa, que não sai da cabeça e impressiona bastante. Devo falar mais detidamente sobre ele na coluna de lançamentos, ainda este mês. Já adianto: para quem gosta de um rockcontemporâneo, é o melhor que tá tendo. 

Yves Tumor – Praise a Lord Who Chews But Which Does Not Consume (Or Simply: Hot Between Worlds)

Outra pedrada. O disco indubitavelmente mais roqueiro do artista é uma experiência linda. O compositor e intérprete parece consolidar definitivamente neste trabalho sua ousada cruza entre Prince e Smashing Pumpkins. Mistura que, diga-se, ele já vem cozinhando há algum tempo. O disco é redondíssimo, e só deixa dúvidas se o grande Yves tem para onde correr depois dele. Será que a fórmula, finalmente bem amadurecida, pode cansar?

boygenius – The Record

O aguardado projeto do incrível supergrupo (já reverenciado aqui algumas vezes) me decepcionou um pouco. Na modorrenta faixa de encerramento, Letter To An Old Poet, a própria Phoebe Bridgers se denuncia: “You said my music is mellow / Maybe I’m Just Exhausted”. Talvez ela esteja realmente exausta. Ou talvez eu esteja (não é a sociedade do cansaço, afinal?). Sendo justo, “O” Disco tem músicas espetaculares, como $20, Not Strong Enough e Satanist. Mas não me segura por muitas audições, graças ao arrastado de algumas indulgências de Bridgers e Dacus, principalmente. Tem espaço nestas até para um semi-plágio de Simon and Garfunkel, na canção Cool About It. Sei que estou sendo duro com o trabalho, mas grandes projetos acompanham grandes expectativas, e devem acompanhar também leituras críticas que não passem pano para os deslizes. Que falta algo neste lançamento do ambicioso supergrupo, ah, isso falta. 

Lana Del Rey – Did You Know That There’s a Tunnel Under Ocean Blvd

Fui ouvir o disco novo da La Del Rey, de 1h e 18 minutos de duração, e…

…a mimir…💤😴

Yaeji – With A Hammer

A coreana-americana entregou tudo em seu disco de estreia. Beats suaves, em uma cruza entre o melhor do K-Pop e o famigerado Hyperpop ocidental, melodias cativantes, em letras que misturam o inglês e o coreano, ganchos e refrões espetaculares, e por aí vai. Tudo isso se ancora em algumas canções chave como Passed By Me, uma espécie de Massive Attack contemporâneo bi-continental. Yaeji manipula os sons eletrônicos modernos com maestria, e os alia ao seu senso melódico e lírico tipicamente coreano. Uma delícia. Também dica da infalível Raíssa

Resumindo este texto todo: estamos atrasados e cansados, mas nunca surdos. 


Por Márcio Viana

CRÔNICAS DE UM AMOR QUE DÓI

Talvez seja muito errado depositar tanta expectativa em uma artista (“please don’t put your life in the hands of a rock and roll band”, já dizia aquela canção daquela banda), mas, para além de se esperar alguma riqueza lírica em um disco de uma poetisa laureada, há muito o que se depositar de confiança em um trabalho com o título Why Does the Earth Give Us People To Love?

Estou falando de Kara Jackson, artista de Chicago de 23 anos, agraciada pelo National Youth Poet Laureate de 2019–2020. 

Acontece que Kara, além de entregar poesia de qualidade em forma de canções, o faz promovendo uma quebra muito interessante de tonalidades e estruturas musicais, saindo do lugar-comum já desde a faixa de abertura, recognized, que ganha reprise lá pelo final. Minimalista e bela, lista as coisas a que as pessoas se sujeitam em nome de reconhecimento: 

some people get high to be recognized / some people roll dice to be recognized / some people look nice to be recognized / some people use knives to be recognized / some people snort lines to be recognized / some people tell lies to be recognized / some people take lives to be recognized / lot of people gonna die to be recognized…

Já em no fun / party, o single do disco, Kara reflete sobre o amor: é difícil ter paciência quando você está esperando a sorte / Como um caminhão dos correios, como um caminhão dos correios / Para trazer a você um amor tão duro quanto presas de elefante.

A faixa-título também fala de amor, mas não o amor romântico, é sobre perda de pessoas queridas – sua amiga Maya morreu de câncer em 2016 – e a parada aqui é pesada: ela questiona as razões pelas quais a vida nos coloca em contato com pessoas que eventualmente perderemos. Dói, e a gente sente a dor destes versos: estamos apenas esperando a nossa vez, chame isso de vida.

Em sua obra Fragmentos de um Discurso Amoroso, Roland Barthes aborda no capítulo O Mundo Siderado a questão da desrealidade, um mundo paralelo que representa a fuga da realidade promovida pelo ser apaixonado. Se encontramos em alguém como Morrissey representações deste tipo de fuga em suas letras, Kara Jackson corre para o lado contrário: em Why Does the Earth Give Us People To Love? ela bate de frente com a realidade e as dores e desilusões causadas pelo amor, tudo isso embalado por uma estética por vezes lo-fi, ainda que altamente trabalhada nos arranjos. Alternando trechos quase atonais com alguns falsetes, a voz da cantora também é um grande destaque. Voz, violão, alguns sintetizadores e pianos, arranjos de cordas aqui e ali fazem deste disco um potencial lugar de destaque nas listas de melhores do ano.

Ouça Why Does the Earth Give Us People To Love? aqui 


Por Brunno Lopez

TULIPA DO TEXAS

Absolutamente monotemático estou eu por esses dias. O metal apocalíptico sinfônico com o vocal de  Ashleigh Semkiw’s ganhou o repeat irresistível nesse 2023 que parece dedicado à voz feminina e suas performances irretocáveis.

O single “Near Death” mostra um pouco do potencial dessa banda com nome de flor que, com apenas uma tulipa, já construiu um jardim inteiro nos meus ouvidos.

Deixe sua semente nesse play.

Ouça aqui 


É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.  

Abraços do nosso time!

Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana