
22 de Junho de 2020
Bom dia, boa tarde e boa noite queridos leitores / ouvintes do Silêncio no Estúdio. A newsletter desta semana é especial apenas com clássicos que se destacam na discoteca dos nossos colaboradores. Muita coisa velha, outras nem tanto, mas sempre com algo em comum: aquele “gostinho” de clássico. Discos que não saem da nossa cabeça e dos nossos corações, independente da época em que foram lançados!
IT’S A CLASSIC
Bruno Leo Ribeiro
LINHA DIVISÓRIA
Pra quem me conhece, sabe que eu adoro esses momentos de virada na música. Seja um disco que mudou um movimento ou uma banda que fez tudo virar de cabeça pra baixo.
O Opeth, banda de metal progressivo da Suécia, já foi citado em vários episódios do Silêncio no Estúdio. Desde melhores discos até o nosso “O que é Prog Metal?”. É uma das bandas que mais me impressionou no metal nos últimos 20 tantos anos.
A banda que lançou seu primeiro disco chamado Orchid lá em 1995, vem evoluindo cada vez mais. É uma banda que não tem medo de mudar. É uma banda com a cara e a coragem do vocalista e guitarrista Mikael Åkerfeldt.
Desde o disco Heritage de 2011, a banda tomou um outro rumo. Passou a ter um som mais Rock Progressivo dos anos 70 e os vocais do Mikael passaram a ser limpos do começo ao fim.
Mas antes do Heritage, queria falar sobre o disco Watershed, talvez o último (até então, já que a banda pode muito bem mudar de ideia e voltar a fazer um som mais Death Metal Progressivo) disco mais pesadão com vocais guturais.
O disco é um clássico dos metaleiros, mesmo sendo de 2008. O disco começa com uma música melancólica e triste chamada Coil. O disco começa com a voz limpa e belíssima do Mikael e apenas o violão fazer uma cama bem linda de fundo. Tem até participação da linda voz da vocalista da Suécia, que na época namorava o baterista da banda (momento fofoca), Nathalie Lorichs.
Você pensa que o disco vai seguir nessa pegada mais leve e melancólica até que na transição da faixa 1 para a faixa 2 a banda toda entrar numa pedrada chamada Heir Apparent, que é a última música do Opeth que o vocal é todo gutural do começo ao fim.
No decorrer do disco as músicas tem suas variações de vocais limpos e vocais guturais. Partes pesadíssimas quase que de metal extremo e macabro e partes lentas que parece que você está numa floresta encantada cheia de flores.
O Opeth é isso. É contraste, diferenças, histórias de dor e de amor. De saudade, vingança, agonia e beleza.
O Opeth é das maiores bandas do Metal moderno dos últimos 30 anos e o Watershed, como a própria expressão diz, é um divisor de águas. Dali pra frente a banda virou praticamente uma outra banda, sem perder a característica de ser Opeth.
É um disco que tem que ouvir com calma e sem nada te interrompendo. Pegue as letras e siga a jornada. Te garanto que vai virar um clássico pra você assim que a última faixa “Hex Omega” terminar com o último acorde de órgão.
(Aproveitando o episódio dessa semana que vamos falar sobre a Suécia, resolvi falar do Opeth)
Vinícius Cabral
ANTÓNIO, COM ACENTO AGUDO
No embalo de tudo o que tivemos o carinho de documentar em nosso episódio “O Rock de Portugal”, é impossível não me lembrar de certas histórias que construíram minha experiência com a música do país. Em visita à Louie Louie (que cito no episódio), nas “Escadinhas do Santo Espírito da Pedreira”, no Chiado, tive uma conversa muito interessante com o dono da loja, Hugo. Falamos de música brasileira e portuguesa; concordamos que RPM é horrível – e que os Heróis do Mar certamente são melhor referência para um Synth Pop cantado em português – ele me vendeu – literalmente – com muito entusiasmo o mítico Carlos Paredes e, por fim, muito contrariado, acabou me revelando o que eu mais queria saber:
“Afinal, qual é pra vocês o grande disco, hem? Heróis, UHF, Xutos, Sérgio Godinho … qual artista tem o maior disco da história do vosso Rock?”. Eu já tava forçando a barra, mas queria que ele saísse de cima do muro. E, “lusitanamente”, ele saiu; sem falar nada, apenas entregando em minhas mãos uma cópia em vinil de Dar & Receber, do gênio António Variações (cópia esta que eu não trouxe, pois já havia “torrado” tudo o que eu podia ainda nas primeiras semanas … sem comentários 😭😭😭 !! ).
Pois Hugo, ao sair de cima do muro, saiu-se muito bem. Descobri a partir de muitos feedbacks diferentes que, mesmo que Dar & Receber não seja consensualmente o melhor disco do Rock Português moderno ele é, certamente, o primeiro grande disco radicalmente moderno da música portuguesa. Já falamos bastante do artista no episódio, então irei me ater a comentar alguns elementos musicais, considerando que a trajetória única deste pequeno “meteoro” do Minho já está bem representada, principalmente, nas falas do nosso querido Gonçalo.
A modernidade deste álbum não repousa somente sobre a mistura única entre a tradição da canção tradicional portuguesa (do Vira ao Fado) e os elementos do Rock e do Pop internacional. Ela brota dos poros de canções viscerais como Canção de Engate (sendo engate aí o “engajamento” livre amoroso, em um verdadeiro grito de liberação – homo – sexual em um país apenas recentemente liberto do atraso do regime fascista de Salazar). Na mesma linha, a faixa-título ressoa até hoje como um manifesto; “dar o direito a toda voz / esse respeito que queremos para nós”. Sob o instrumental impecável dos Heróis do Mar (excetuando seu vocalista Rui Pregal, que fica responsável pela fotografia da capa do álbum) a canção que dá nome à obra é, sem dúvida, até hoje uma das canções em língua portuguesa que mais me tira do sério. Pura emoção, dos riffs modernos e provocativos da introdução à inflexão emotiva: “trocar / trocar / trocar”. Uma canção de liberdade, amor e anarquia. Nada mais moderno.
Se os ritmos tradicionais portugueses “saltam” em Canção, Quem feio ama… e …Que pena seres Vigarista, é para o final do álbum, em Olhei p’ra trás que volto a ter um nó na garganta. A música, que começa em ritmo de balada e se desdobra em um refrão pop contagiante é uma trajetória deste gênio do interior rural e provinciano de Portugal à capital Cosmopolita: “mala nova na mão / feita de madeira e papelão“. Lá se vai António viajante, António desbravador, Antônio revolucionário … rumo à cidade grande para ser o que quisesse ser; cantor, cabeleireiro, personalidade, símbolo de uma era e precursor de uma verdadeira transformação social ainda em curso – ó, o quanto nos assusta as mudanças, não é mesmo!? –
“E assim saí daí / De olhar para trás / Pensamento em frente / Em frente não havia mais nada não / Em frente não havia mais nada não, / Do que um comboio a cidade / Um navio e um avião”
Ao chegar em “avião”, já não me aguento. Choro toda vez e encerro esse texto com aquele nó na garganta de quem também largou suas raízes para sonhar com a emancipação e a liberdade; aqui cantada e chorada em um lamento tipicamente ibérico – mas que balança demais um coração brasileiro em cujas veias também corre a tradição genética de além-mar – . Viva este António gigantesco e universal. António revolucionário e intenso. Com acento agudo.
Márcio Viana
DAQUELA VEZ, COMO SE FOSSE A ÚLTIMA
Chico Buarque completou 76 anos em 19 de junho. E como houve nas redes sociais uma iniciativa de celebrar a data, nada mais justo do que eu pudesse também relembrar o seu talvez melhor álbum (para mim isso é um fato).
Curiosamente, eu li Construção muito antes de poder ouvi-la. Me lembro de ver a letra reproduzida em apostilas do ensino fundamental de meus irmãos, das aulas de língua portuguesa, com análises sobre sua estrutura de frases terminadas com palavras proparoxítonas, um velho clichê do estudo linguístico, mas nem por isso indigno. Muito pelo contrário.
O fato é que, sem saber como era a melodia, eu cantarolava a letra imaginando eu mesmo uma versão, às vezes punk, às vezes pop, da música.
Alguns anos depois, já no ensino médio, estava eu transformando a letra de Construção em um exercício de redação de uma notícia de jornal, e não nego que aquilo me ajudou a despertar a vontade de cursar jornalismo.
Mas ouvir Construção, o álbum, na sequência original, é em si um outro exercício, e esse muito necessário. Para além dos grandes arranjos, sobretudo o de sopros, e também o de vozes, como a participação do MPB4, a gente encontra já na abertura a irônica Deus lhe Pague, que introduz o tema da faixa-título, quando cita a cachaça, de graça, que a gente tem que engolir, e os andaimes, pingentes que a gente tem que cair. Não por acaso, a faixa de abertura volta como autorreferência lá na faixa-título.
Composto, e em parte gravado durante a fase de exílio de Chico na Itália, por conta da perseguição sofrida na ditadura militar, Construção é irônico, mordaz. Fala de rotina em Cotidiano, do próprio exílio e de outros em Samba de Orly e faz as vezes de contador de narrativas em Minha História. Vai do Desalento ao Acalanto.
Ao longo da existência do Silêncio no Estúdio, Chico sempre foi citado, nas mesas virtuais sobre músicas de protesto e sobre censura na música, citado também pelo Bruno Léo como um dos discos para levar para o espaço, e a música Construção até ganhou um especial nosso no Youtube.
A obra de Chico Buarque é muito rica e cheia de álbuns clássicos (quase todos), mas se eu tivesse que contar a alguém que não o conhece o que ele representa, seria esse o álbum que eu mostraria.
Brunno Lopez
MR. A-Z
“It takes a crane to build a crane”
A frase ainda ressoa com a mesma intensidade da primeira vez que se apresentou aos meus ouvidos. Parecia ser mais do que alguém brincando com frases que poderiam ser apenas poemas criativos. E de fato, era mesmo. Os desenhos das palavras se tornaram músicas e talvez fosse exatamente o tipo de canção que a minha versão de 2005 precisasse.
“Life is Wonderful” abria o disco com um sorriso, não só pela viés otimista, mas por soar verdadeira e despretensiosa. Era o jovem Jason Mraz abrindo a porta da sua casa e convidando pra um café da tarde. Eu certamente estava faminto por alimentos culturais novos e talvez esse álbum tenha sido um dos mais consumidos por mim naquela época.
E nem passei perto de qualquer possibilidade de indigestão.
Quando “Wordplay” começa, você começa a compreender a versatilidade do artista. Confesso que a forma embaralhada dele cantar as letras me influenciou nos materiais que eu escrevia na época. Era o acaso me mostrando o que eu nem sabia que precisava mas que depois se tornou indispensável.
Daqui pra frente, todas as faixas têm sua história própria.
Sugiro que vocês deixem a sequência acontecer, pois faz muito sentido da experiência.
Porém, quando chegar em “Bella Luna”, talvez seja preciso acionar o repeat incontáveis vezes.
Tem uma mágica nessa música. E o truque é escutá-la e incluí-la em suas playlists favoritas.
É isso pessoal! Espero que tenham gostado dos nossos comentários e dicas.
Abraços do nosso time!
Bruno Leo Ribeiro, Vinicius Cabral, Brunno Lopez e Márcio Viana