Episódio #161 - Melhores Discos de 2021
Em mais um episódio, nosso time com Bruno Leo Ribeiro, Vinícius Cabral, Márcio Viana e Brunno Lopez, escolhem os melhores discos de 2021 com gostos variados. Tem muito Rock, Indie, Hard Rock, Pop, Metal e muito mais, tudo isso pra listar com muito clubismo, emoção e um pouco de razão, os discos que cada um mais gostou. Entre os mais de 80 discos citados estão, Lil Nas X, Billie Eilish, The War on Drugs, Snail Mail, Silk Sonic, Manic Street Preachers, Mastodon, Helloween, Jerry Cantrell, RA, Lillith Czar, St. Vincent, Dry Cleaning, Faye Webster, The Black Keys, Bonifrate, Pabllo Vittar, Amaro Freitas, Fresno, Juçara Marçal e muito muito mais. Separe o caderninho e anote todas essas dicas dos melhores lançamentos de 2021 e conheça o que talvez tenha passado batido pra você. Ouça, divirta-se e compartilhe. Abaixo leia nossos reviews e a lista completa.
O ANO EM QUE A MÚSICA MORREU
Muito foi dito, nos anos recentes, a respeito da morte do rock. Só que, neste pós-pandemia, o que parece estar em estado terminal não é nenhum gênero em específico, mas a música, de uma maneira geral. Alguns dirão: “que absurdo, a música nunca vai morrer!”. Isso é verdade, não tenham dúvidas. Mas o que pode morrer (e nós não queremos deixar de jeito nenhum) é a paixão pela música: a catalogação, o debate, a constante descoberta de novos (e velhos) artistas. Se isso tudo sobrevive, ainda que em nichos cada vez mais especializados, não é motivo para sair matando a música, não é mesmo? Talvez não.
Mas, em um contexto de hiper saturação de lançamentos, onde as novidades parecem engolir nossa energia rumo a uma espécie de entropia, fica nítida a impressão de que as pessoas não gostam mais de música. Elas parecem gostar de personalidades, novidades, tretas, cancelamentos e demais distrações virtuais, alimentadas por um ciclo infinito de novidades produzidas a toque de caixa e que disputam espaço diante de algoritmos automatizados - que adoram as polêmicas e controvérsias. Todo este contexto, agravado pela pandemia, da qual o mundo teima em não conseguir sair sem traumas, levou a música a se perder nos fluxos das nuvens. Nem mais shows pudemos ver e, enquanto os artistas se desdobravam em performances virtuais cada vez mais elaboradas, o público ia se dispersando, em um claro sinal de que é realmente o déficit de atenção que guia a nossa realidade.
Eis o nosso imenso desafio: registrar algo para a posteridade, em um mundo em que, no espaço de semanas (ou até dias), uma obra-prima pode ser ostracizada, enquanto uma porcaria pode ser elevada ao status de obra-prima. Mais do que nunca, contamos com uma linda resistência, de amantes de música que teimam em nos acompanhar e nos apoiar. Ainda que seja em micro comunidades como a do Silêncio no Estúdio, a música não morreu não. Continua cada vez mais viva e vibrante.
Afinal, não faltaram grandes álbuns em 2021. Nossa intenção com estas listas é, como sempre, revelar, de tudo aquilo que cada um conseguiu ouvir e assimilar devidamente, os grandes destaques. Quais tendências embalaram o ano (esteticamente falando), quais as surpresas, novidades, decepções. Catalogar, enfim, um conjunto de obras que julgamos ser relevantes. É claro que isso tudo está aberto, como sempre, a infindáveis debates. Porque, no fim das contas, o que mantém a música viva, além da paixão, é a vontade que temos de conversar sobre ela, em um diálogo construtivo, democrático e respeitoso, sem achismos ou determinações arbitrárias.
Obrigado a todos por mais um ano acompanhando nosso Silêncio no Estúdio!
BRUNO LEO RIBEIRO
Em algum momento da história, a música era uma mistura louca. Com o tempo os sub gêneros e gêneros foram se afastando e nichos e tribos foram se formando. Em algum momento, no final dos anos 70, a New Wave resolveu misturar tudo de novo. Reggae, R & B, Disco, Rock, Punk. Tudo misturado. Em 2000 aquele pop se pasteurizando nos anos 90 se consolidou e parece que todo mundo ficou mais acessível e mais fácil de gostar. Nos 2010s, os nichos foram se afastando novamente e agora em 2021, parece que estamos novamente em um momento vira-lata caramelo da música.
Tem artista Pop fazendo Dance, Rock, Trap, SynthPop e muito mais. Ao mesmo tempo, os artistas estão criando discos mais versáteis e inovadores. Alguns nichos ainda se mantêm, mas dá pra sentir que aquele purismo está cada vez mais sem sentido. Música é música.
2021 talvez tenha sido o ano que mais ouvi coisas diferentes e fora da minha zona de conforto. Vou do Metal ao K-Pop sem nenhum problema. De Pop Psicodélico ao Blues do Deserto passando pelo Jazz e pelo Rock Progressivo. A vida é assim. É bom entrar numa loja de discos e passear por todas as sessões. Sempre terá surpresas agradáveis em todos os cantos da música. Basta a gente estar aberto pra se emocionar.
É muito raro qualquer artista hoje em dia lançar dois discos no mesmo ano e confesso que torci o nariz quando a Lana anunciou que lançaria dois em 2021. O Chemtrails Over the Country Club lançado no primeiro semestre me pareceu sobras do Norman Fucking Rockwell, já o Blue Banisters eu vi uma evolução do método de um dos melhores discos da carreira dela. O Blue Banisters vai além das sobras. É cheio de emoção e aquela melancolia já conhecida, mas que me emocionou demais. Isso que importa no fim das contas. Vamos ver os próximos passos da Lana. Sempre bom ficar de olho.
Não conhecia o trabalho da Michelle Zauner até ouvir esse ano. Gostei demais desse Indie Pop que ela faz com criatividade e misturas que são difíceis de identificar. Um álbum que gosto de definir como um disco de música delícia de ouvir.
Já tinha ouvido falar deles, mas nunca tinha parado pra ouvir. Esse ano resolvi conferir e não me arrependi. Essa banda de Atlanta nos EUA (Oi?), faz um indie rock bem acessível e fácil de curtir de primeira. Destaque pra música "Angel of Death".
Se parece Bruce Springsteen, eu vou curtir. Assim é o The War On Drugs. Uma mistura de um Rock de Arena com melodias de voz inspiradas no The Boss e uma música grandiosa e bem feita. Muita gente chama de Daddy Rock. Bem… sou pai. Deve ser por isso que gostei tanto.
Uma das bandas de Prog / Metal mais legais dos últimos anos nunca errou na minha opinião. A primeira metade do disco é excelente. Riffs brutais, transições impecáveis e criativas e muita quebradeira de bateria. A segunda metade do disco fica mais melancólico e lento. O disco tem música demais na minha opinião, então cansa um pouco. Mas é incrível do mesmo jeito.
Desde o Sam's Town, o The Killers nunca mais tinha me emocionado, mas o Pressure Machine a banda conseguiu chegar na minha alma e foi um dos discos que mais ouvi no ano. Um álbum conceitual que vale acompanhar cada linha das letras e se conectar com as entrevistas e vinhetas entre as músicas. Parece que a banda assumiu de vez que ama Bruce Springsteen e se for pra se inspirar em alguém fazendo um disco sensacional, que seja o Bruce.
Wolf Alice fez um desses discos que você apenas se delicia com as melodias e ritmos melancólicos e não se importa muito se é inovador ou não. É muito bem feito e gostei demais. Um dos álbuns que mais ouvi no ano e vou continuar ouvindo. Ficou de fora do Top 10 por detalhe.
A mudança na formação da Nervosa fez um bem danado pra banda. A Prika Amaral mostra que é uma das melhores guitarristas do Metal da atualidade. Riffs criativos que a galera dos anos 80 do Thrash Metal da Bay Area gostaria de ter feito. Discáço! A voz da Diva Satânica é sensacional e a Eleni Nota na bateria é destruição demais. Thrash Metal no seu melhor.
A Lindsey Jordan, de 22 anos, fez duas das músicas que mais amei esse ano, "Valentine" e "Headlock". O resto do disco não tem o mesmo nível ou a mesma vibração, mas não deixa a desejar. Desses discos que a gente fica feliz em ver a nova geração brilhando com referências boas. Pra ficar de olho. Snail Mail é impressionantemente maduro.
Fascinante! Essa é a única palavra que consigo usar pra descrever Mdou Moctar. Se você tem curiosidade pra entrar de cabeça no tão falado Blues do Deserto, esse disco é pra você. Melodias e guitarras totalmente fora do que a gente conhece como tradicional e é por isso que Afrique Victime é tão bom!
10. SHINee - Atlantis
K-Pop é realidade e a gente tem que apreciar. Passou da hora da gente parar de olhar como uma coisa distante e pra apenas um determinado grupo de fãs. Ainda temos muito o que entender de toda a cultura do K-Pop, mas uma coisa é certa… as composições mais inovadoras do Pop atualmente estão saindo da Coreia do Sul. Claro que umas coisas vão agradar mais do que outras e é muito difícil acompanhar todos os Comebacks (lançamentos) do ano. Mas dentro do que ouvi em 2021, incluindo Seventeen, BTS, TXT e aespa, por exemplo, o Atlantis do SHINee foi o que mais me emocionou. O Pop de qualidade é feito de boas estruturas, melodias e transições e isso o SHINee faz com maestria. Um disco excelente do começo ao fim. Desses que citei, todos tem qualidade e recomendo procurar também, mas SHINee realmente eu gostei muito.
9. Jerry Cantrell - Brighten
O Jerry Cantrell nunca errou e eu posso provar. Ele é um dos maiores guitarristas da sua geração e muito famoso por comandar os riffs épicos no Alice in Chains. No seu terceiro disco solo, ele mostra um pouco mais das suas influências de Country e de compositores como Elton John. A música "Atone" já nasceu hino e vai ficar na memória dos fãs por muitos e muitos anos. Apesar de maravilhoso, algumas músicas do disco acabam não expandindo tanto assim o que a gente espera de um disco solo de um cara tão estabelecido e criativo. Mas valeu a espera de tantos anos depois do Degradation Trip Volumes 1 & 2 de 2002. Muitos riffs arrastados, melodias criativas, vozes dobradas e de bônus, ótimas linhas de baixo do Duff McKagan (Guns 'N Roses). Esse homem é tudo e eu sou clubista demais. Ele sempre terá um lugar separadinho no meu coração pra gostar de tudo que ele faz. Passo pano demais. Ele nunca errou.
8. CHVRCHES - Screen Violence
O trio Escocês Chvrches sempre figura entre os lançamentos que mais gosto no ano. Desde o primeiro single The Mother We Share de 2013, acompanho o trabalho da banda. Pra quem não conhece, eles fazem um Synth Pop Retrô de muito bom gosto. Usando estruturas musicais modernas usando timbres dos anos 80. A voz da Lauren Mayberry é super delicinha e a criatividade de Martin Doherty e Iain Cook ficam evidentes a cada lançamento.
No Screen Violence, a banda entrou de cabeça no conceito da violência sofrida através das telas dos telefones e computadores nas redes sociais. Um disco de pandemia que conversa com nossas dores e ofensas diárias nas caixas de comentários por aí. Além de ótimas músicas (destaque pra Final Girl), tem a participação do Robert Smith do The Cure na música How Not To Drown que já nasceu clássico. Adorei todas as músicas do começo ao fim. Não dá pra pular nada. Talvez o melhor disco da banda desde então.
7. St. Vincent - Daddy's Home
Alguns discos são da categoria "chegar em casa, colocar pra tocar na vitrola, abrir um vinho, sentar numa poltrona e curtir pra esquecer como foi o dia". E o Daddy 's Home da St. Vincent (Annie Clark) entrou pra essa lista de uma maneira fantástica. O disco pode ser considerado um disco retrô de Soul, R & B e Rock Psicodélico.
A St. Vincent misturou o melhor do "Songs in The Keys of Life", o "Wish You Were Here", o "Abbey Road", o "Hejira" e o "Goodbye Yellow Brick Road" pra fazer, pra mim, o melhor disco da sua carreira. Agora sou oficialmente fanboy.
6. Little Simz - Sometimes I Might Be Introvert
Os discos de Rap são aqueles que escuto e gosto, mas dificilmente eles explodem minha cabeça. Alguns álbuns são obras de arte e não tem como não amar, como é o caso do To Pimp a Butterfly do Kendrick Lamar. E aconteceu novamente. O Sometimes I Might Be Introvert da Little Simz é uma obra prima. Um disco de Rap primoroso que me pegou de jeito no primeiro play. Os samplers e ritmos são impecáveis e contagiantes e te dão agonia e raiva quando se precisa. As rimas e letras da Little Simz são excelentes e o flow dela é suave quando precisa e nervoso quando tem que ser. Um disco de Rap que coloco na minha lista pessoal de masterpieces do gênero. Não ter sido nem indicado ao melhor disco de Rap no Grammys, pra mim, foi a maior barrigada da premiação.
5. KEY - BAD LOVE - The 1st Mini Album
Fazendo um Synth Pop Retro Futurista, Key (integrante do SHINee que já citei na lista), faz seu disco solo com uma precisão brilhante. Usa uma linguagem do passado apontando para o futuro. É muito mais do que apenas uma nostalgia ou uma homenagem, o BAD LOVE leva o Pop para um outro nível de criatividade e inovação.
As 6 músicas do BAD LOVE são uma amostra de onde o Pop pode ir e provavelmente não vai parar por aí. Esse Mini Álbum é essencial pros amantes do Pop com energia, inovação, criatividade e ótimas melodias. Um dos melhores lançamentos do ano sem sombra de dúvidas.
4. Lil Nas X - MONTERO
Eu amo quando um artista mostra que é muito mais do que apenas uma celebridade ou criador de um hit só. Esse é meu sentimento com o Lil Nas X. Depois de emplacar em 2018 o hit Old Town Road e quebrar vários recordes, ficou a pergunta no ar. O que será que ele é capaz num disco completo com 10 músicas ou mais?
MONTERO veio pra mostrar que ele não só tem fôlego pra fazer 15 músicas num álbum, mas fazer 15 músicas excelentes com cara de vencedor de Grammys. Além de falar de coisas importantes, com alfinetadas e críticas sociais foda, o Lil Nas X é carismático, divertido, debochado e acima de tudo com muito bom gosto e talento.
Pra quem esperava um disco de Trap Country, vai se decepcionar. O MONTERO é um disco de Trap Pop, Trap Dance e até Trap Rock. É o tal do vira-lata caramelo que vivo comentando por aqui. Ele não ficou no pódio por muito pouco mesmo. Um clássico do Pop sem sombra de dúvidas.
3. Gojira - Fortitude
Eu sou clubista e emocionado sim, mas é por uma boa causa. O Gojira é a banda de metal que mais me emociona desde 2010. Do From Mars to Sirius de 2005 até hoje, a banda só lançou disco maravilhoso. Gosto de tudo. E se não me pegar de primeira, eu vou ouvir até curtir e entender todas as nuances das emoções e tecnicalidades da banda.
O Gojira pra mim é isso. Técnico, persistente, preciso e pura emoção ao mesmo tempo. É uma sensação que tenho ao ouvir o Chaos AD ou o Roots do Sepultura. São músicas que vão na minha alma de metaleirinho e volto a ter 15 anos.
O Fortitude é um disco que evoluiu do Magma de 2016 de uma maneira natural. Não houve uma grande mudança no som da banda, foi uma evolução orgânica e moderna. A banda se modernizou e consegue agradar não metaleiros. O Gojira é de longe a banda de metal pesado que mais vejo gente que nunca curtiu metal gostar.
O Fortitude é um disco que nasceu clássico e será lembrado como um dos grandes discos dos anos 2020s na história do metal. Coloque um fone bem alto e venha pra essa viagem de crítica social foda, riffs tribais e muita raça e groove. Como não amar uma banda que fez a música Amazonia, doando os lucros da música pra Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)? Eles envolveram as pessoas certas e fazem ativismo com maestria. Não basta ser uma banda ótima, é uma banda com ótimas pessoas que tão tentando salvar o planeta. E o Gojira faz isso desde sempre. Passando uma mensagem bacana pra todo mundo refletir sobre o nosso lugar nesse planeta.
2. Silk Sonic - An Evening With Silk Sonic
Alguém consegue inventar uma máquina do tempo e você ganhou uma viagem até os anos 70 pra uma festa cheia de fumaça no ar, tapetes brancos de plumas espalhados pelo chão e um monte de gente gostosa dançando. Esse é o disco An Evening With Silk Sonic.
Uma homenagem ao melhor do R & B e Soul dos anos 70 com muita sedução, molecagem, ousadia e alegria. Tudo isso mostrando que duas cabeças podem trabalhar melhor do que uma.
Anderson .Paak trouxe mais molecagem, verdade e paixão pro Bruno Mars e o Bruno Mars fez o Anderson .Paak ter mais foco e groove. Eles se complementam pra criar um dos melhores discos de 2021. Podem entregar todos os prêmios pros meninos. O Silk Sonic me fez ficar sem palavras. Tem que ouvir.
É uma lindíssima homenagem com pitadas de modernidade, mas que passa longe de ser apenas um exercício de linguagem como alguns sugerem. Tem groove, alegria, produção impecável, mixagem perfeita, melodias e transições épicas. Nasceu um clássico que vamos levar no coração. É basicamente isso. :)
1. Billie Eilish - Happier Than Ever
Dizem que gerenciamento de expectativas é o segredo pra não se decepcionar, mas com o Happier Than Ever eu não consegui me conter. O excelente disco de estreia "When We All Fall Asleep, Where Do We Go?", passou meio despercebido por mim. Fui ouvir com calma depois que o Márcio Viana indicou o disco de estreia da Billie Eilish como um dos seus favoritos de 2019. Dando o play sem nenhuma distração, fiquei fascinado e se pudesse fazer um adendo na minha lista daquele ano, esse disco entraria no meu Top 5.
Tudo isso pra dizer que quando ouvi o primeiro single do Happier Than Ever, "Your Power", eu criei uma expectativa gigantesca na minha cabeça e logo encomendei o disco de vinil edição especial marrom em pré-venda.
Quando deu meia noite daquela quinta feira para sexta feira, dei play e quase fechei os olhos pra curtir as 15 faixas do disco. Ouvi sem tentar criar opinião, fui curtindo e deixando toda aquela variedade de músicas, estilos e ritmos e melodias me levar pra um lugar bom. Na manhã seguinte, corri para a loja de discos pra pegar a minha cópia. Cheguei em casa e coloquei pra rodar o vinil.
Com o fone bem alto e encarte com as letras na mão, segui cada linha das ótimas letras da Billie e os detalhes da produção madura e mínima do seu irmão Finneas O'Connell.
Cada música foi uma nova surpresa. Um Pop, uma Bossa Nova, um Trance, um Rock de arena e um Folk e por aí vai. É um disco diverso, mas que se conecta de uma ótima maneira. Talvez a última música, "Male Fantasy", fique meio perdida depois que você ouve o grande Rock de arena épico "Happier Than Ever", mas depois de várias audições, até que faz sentido. Lembrando que minha opinião é sempre clubista e emocionada.
Pra muitos, pode ser um disco que vale nota 7.5/8 ou nem tenha chances de vencer no Grammys alguma coisa, mas foi um disco que me deu serenidade e conforto. Foi um dos meus discos favoritos do ano e desde que ele saiu, eu sabia que quase nada iria superar. É desses discos que batem de uma maneira que nada vai explicar. É pura emoção.
Destaque Nacional
Pabllo Vittar - Batidão Tropical
O Tecnobrega nunca foi minha praia, mas sempre achei divertido, mas nunca dei um play pra apenas curtir e passar o dia, mas com o Batidão Tropical tudo isso mudou. Pra mim, o maior lançamento Nacional do Ano. Talvez não seja o melhor e isso é discutível, mas no momento que ouvi a versão da Pabllo de Ânsia, eu sabia que tinha alguma coisa diferente ali. É quase como se uma banda de Tecnobrega fosse formada apenas de músicos com cabelos com permanente e fãs de Hard Rock Farofa. É assim que eu defino o disco. Um vira-lata caramelo do melhor do ritmo divertido do norte do Brasil com pitadas de metal farofa. Talvez por isso gostei tanto. É meu grande destaque nacional do ano.
Discos Nacionais para conferir também:
Dada Hotel - Dilúvio / Deserto
Leonardo Marques - Ilha do Corvo Sounds
Cesar MC, Pineapple StormTV, Tibery e Felipe Artioli - Dai a Cesar o Que É de Cesar.
VINÍCIUS CABRAL
Antes de mais nada preciso dizer que dedico este episódio (ou a parte que me cabe nele, claro) à memória da brilhante Marília Mendonça. Uma mulher que se manteve no topo das paradas populares brasileiras por anos a fio, sem se vender como um produto ou ser objeto de escrutínio comercial por parte de marcas e canais de televisão. Uma cantora e compositora que ficou conhecida por suas canções, acima de tudo. Um exemplo espetacular, e uma inspiração para todos, do mainstream ao mais obscuro underground.
Por falar em underground, ao longo de 2021 eu disse que ia me radicalizar, em termos do quê eu escolheria ouvir com mais atenção. Não deu outra. Fui quase que full indie na minha lista de melhores do ano.
Tomado por diversos tipos de piripaques (termo técnico para o assim chamado burnout, como bem lembra nosso assinante e amigo Pablo Saraiva), nada me desceu muito bem, em um ano já indigesto em inúmeros sentidos. Não tive ouvidos muito generosos com os modismos e sonoridades demasiadamente … pop (Marília Mendonça à parte, sempre). Não que eu tenha passado a rejeitar a música pop, como um conceito universal. Eu apenas comecei - ainda que de início, inconscientemente- a prestar mais atenção naquilo que realmente me move, e sempre me moveu: o indie, o esquisito. É claro que há muitos lugares nesta lista para crossovers e experiências mais, digamos, “acessíveis” (com alguns artistas até já bem famosos e consolidados), mas em geral ela se concentra em uma certa obscuridade, se não comercial, ao menos estética. Não por puro capricho, mas por pragmatismo. Já temos muita mídia, muita grana e muito afeto voltado para todo o tipo de clickbait que a gente possa imaginar (de Lorde à Juliette).
Não é necessário que eu, um compositor desconhecido e fã inveterado de música “diferente”, fique gastando tempo (que parece cada vez mais comprimido e escasso) com as bobagens midiáticas do momento. Preciso concentrar minhas energias e meu intelecto na reconstrução de contextos, verdadeiramente, alternativos.
O segundo álbum da revelação inglesa não é tão forte quanto o primeiro. Um pouco além da conta nas “viradas inusitadas”, mas ainda assim um bom álbum, com direito a uma das melhores músicas do ano: John L.
Genesis segue a linha de uma espécie de hip hop alternativo, que tem levado um respiro importante ao gênero. Filho, talvez, do mesmo contexto que nos trouxe feras como Yves Tumor, Genesis é uma excelente notícia e um talento raro.
A banda de Adam Ganduciel sempre me soou como uma versão indie do rock de arena de figuras como Bruce Springsteen. Neste disco, sensacional, isso está mais claro do que nunca. Um trabalho para agradar tanto quem gosta de um rockzão pop épico, quanto para os fãs inveterados de Kurt Vile (que inclusive já fez parte da banda).
17. Low - Hey What
Nunca fui muito fã de Low. Mas, neste último disco, a proposta estética do duo, de camadas de noise sobrepostas por vocais melodiosos, está mais coerente do que nunca. Destaques memoráveis, como os singles More e White Horses.
16. Turnstile- Glow
Em vários sentidos, Turnstile parece ser a revelação do ano. Um som pesado e melodioso, que cruza hardcore, new metal e um tiquinho de emo em uma porrada upbeat do início ao fim. Destaque para a perfeita UNDERWATER BOI.
O mais famoso representante do fenômeno das “Guitarras do Saara”, Mdou mostra a que veio em seu debut, uma coleção perfeita de canções que botam Jimi Hendrix pra passear no lombo dos camelos do deserto, com direito à melodias inspiradas típicas do norte da África.
Projeto da produtora experimental norueguesa Jenny Hval, Lost Girls foi um alívio imenso em 2021. Um disco experimental em essência, que cria uma conversa única entre guitarra, sintetizadores e vocais extremamente “crus”, produzindo uma química sonora absolutamente sublime.
13. L’Rain - Fatigue
Instigante segundo disco da compositora e cantora. Pelo clipe da melhor faixa do álbum, Find It, dá pra sentir o clima intimista e experimental, sem nos negar um refrão pop e forte. É a senha para um disco muito interessante, a ser melhor digerido ao longo do tempo. Uma artista para prestar bastante atenção.
Há muito a ser dito ainda sobre as letras, feats e samplers polêmicos deste disco, mas vou ficar na impressão pessoal: Call Me If You Get Lost é o retorno de Tyler à boa forma como produtor e rapper, depois de alguns desvios, a meu ver, meio brochantes. Um dos melhores (senão o melhor) álbum do prolífico e brilhante Tyler.
Não há outro adjetivo para descrever esse álbum, a não ser: sublime. Integrando uma cena que tem sido chamada de new jazz, ou jazz alternativo, Space 1.8 é uma obra-prima que apenas parte do jazz, com alguns elementos específicos (como o sax), para nos mergulhar em uma vibe totalmente transcendental. E que vibe!
10. Squid - Bright Green Field
Squid faz parte de uma certa cena de rock experimental inglesa (que eu definiria, rapidamente, como: post-alternative-math-jazzy) que tem dado o que falar. Com representantes já mais conhecidos como a black midi, essa cena conta agora com uma adição sensacional. A Squid, formada por garotos de Brighton, chega com um debut sensacional, que explora um pouco mais do que as demais conterrâneas influências de krautrock (ouve-se um tanto de Stereolab ou mesmo Radiohead, aqui e ali, ao longo das 11 faixas do álbum).
Com clássicos instantâneos, como G.S.K, Narrator e Pamphlets, Bright Green Field é simples, direto, coeso e inspirador. O upbeat motorik de Narrator não me deixa mentir: é algo realmente empolgante.
9. The Armed - Ultrapop
Parafraseando meu amigo Daniel Junqueira: “isso é ridículo de bom”. Não tenho muito mais a acrescentar. Ultrapop na verdade me chega assim: como um disco ridículo de tão interessante, embora eu não entenda perfeitamente o rolê, assim, logo de cara. Também pudera. Às vezes, como no caso da canção Average Death, é tanta camada barulhenta “em cima” dos vocais, que mal dá pra entender o que está acontecendo na canção. Mas acontece algo brilhante, mergulhado em barulho - seja das guitarras altamente comprimidas, seja da bateria de hardcore, com o pedal duplo comendo solto.
Essa é a mesma fórmula que constrói All Futures, outro destaque absoluto. Mas é em canções como An Iteration que a proposta deste baita disco fica mais clara: com um vocal que chega a lembrar Nine Inch Nails e uma boa dose de podridão sarcástica na letra, a música é um petardo, e um resumo do que eu mais curto nesse trabalho; barulho, invenção, sarcasmo, novidade.
8. Faye Webster - You Know I’m Funny haha
Em 41 minutos, a jovem Faye Webster, de apenas 23 anos, se apresenta com ares de veterana. Parece dominar totalmente a estética alt-folk que permeia o disco, com uma maturidade lírica e melódica que não aparece em qualquer esquina por aí. E digo alt-folk com muitos pés atrás, totalmente na falta de uma definição mais precisa. Em seus melhores momentos, como na faixa de abertura Better Distractions ou na faixa título, I Know I’m Funny haha, o disco evoca uma larga gama de clássicos, da altura de um Todd Rundgren, e de contemporâneos, como Kurt Vile, Courtney Barnett e Sharon Van Etten.
O espírito jovial (ainda que extremamente maduro) da estética de Faye fica marcado no clipe sensacional da faixa título, onde a cantora-compositora aparece, por exemplo, assinando CDs e LPs e brincando com um de seus iô-iôs (que parecem ser uma de suas marcas registradas).
Que Faye é talentosa muita gente já sabia. Mas que ela era capaz de um disco assim tão bom, tão cedo, acho que poucos acreditavam.
Mas ela era.
7. Snail Mail - Valentine
Mais uma cantora-compositora, também muito jovem, e também impressionante (percebam os padrões surgindo no rock independente contemporâneo). Lindsay Jordan, a mente por trás de Snail Mail, é, porém, um pouco mais afiada, rebelde e direta do que a artista que a antecede nesta lista. Se em seu primeiro disco, o impressionante e elogiado debut, Lush, Lindsay já havia demonstrado um senso indie rocker sensacional com seus riffs despretensiosos, vocais marcantes e letras afiadas, neste segundo disco a artista busca novas sonoridades. Ainda há espaço para as guitarras gritadas e/ou “tortas”, como na sensacional faixa-título ou em Headlock, mas as camadas e synths mais densos (como em Ben Franklin) parecem se impor no horizonte.
O disco dá uma caída com algumas faixas acústicas que soam como fillers pouco inspirados, mas a potência dos singles (Valentine, Ben Franklin e Madonna) já valem a colocação privilegiada em minha humilde lista. Foi ouvindo uma performance da canção Madonna, inclusive, que eu me peguei boquiaberto, me perguntando: “onde essa garota aprendeu a compor desse jeito?!”. É uma música perfeita em um disco irregular, mas ainda assim, profundamente instigante.
6. The Weather Station - Ignorance
À frente da banda The Weather Station, Tamara Lindeman - ou Tamara Hope, como a artista se identifica em sua carreira como atriz- chega ao seu ponto mais alto como compositora neste álbum, Ignorance. Sensacional, cheio de camadas e subtextos apaixonantes.
Ignorance é uma obra densa. Se a voz grave e profunda de Tamara, bem como algumas batidas meio 00s pós-punk, imediatamente lembram grupos como Yeah Yeah Yeahs, a riqueza dos arranjos e a performance de Tamara chutam a associação pra bem longe. E digo isso após assistir todos os clipes do disco também (tarefa que recomendo fortemente). No de Robber, por exemplo, temos imagens inesquecíveis de uma cena bizarramente contemporânea: a cantora em uma floresta, rodeada por personagens "da Internet" com seus celulares, e uma equipe de TV (liderada por um repórter que parece uma cruza de Donald Trump com Ben Shapiro), para quem Tamara canta os versos que marcam a canção: I Never Believed in The Robber. Forte pra caralho.
A tracklist traz destaques óbvios: Tried to Tell You, Parking Lot, Separated. De cara, parece que todas as canções são hits. Fruto, talvez, de uma familiaridade meio genérica que se observa nas melodias em primeiras audições. Conforme o disco vai “assentando”, porém, aí é que cai a ficha de que não se trata nem um pouco de algo genérico ou pasteurizado. É um disco gigante, tanto em arranjo, quanto em produção e performance.
5. Floating Points/ Pharoah Sanders/ The London Symphony Orchestra - Promises
O que acontece quando se junta um produtor de música eletrônica contemporânea (Floating Points) com um saxofonista jazzista “clássico” (Pharoah Sanders) e a Orquestra Sinfônica de Londres? Se você imaginou algo luxuoso, elaborado e extravagante, chegou perto. Mas é muito mais do que isso … Promises não é uma obra “posuda” ou pretensiosa. Trata-se de um disco simples, onde uma única melodia vai conduzindo as canções, que se dividem apenas pelos arranjos específicos. De fato, parece se tratar de uma só música, dividida em 9 movimentos (as faixas são intituladas, literalmente, como Movement 1, Movement 2, etc). Ao longo dessa trajetória, há espaço para tudo: alguns movimentos são mais orquestrados, outros mais minimalistas.
Pharoah arrisca alguns murmúrios cantados, há sintetizadores e elementos eletrônicos invadindo o “espaço” aqui e ali, e por aí vai.
Cada movimento é uma descoberta, com camadas belíssimas se projetando sobre uma base que, apesar de ser sempre a mesma, soa completamente diferente conforme os arranjos vão mudando. Uma obra-prima, de várias camadas e moods que formam um conjunto irrepreensível.
4. Indigo de Souza - Any Shape You Take
Índigo de Souza é outro desses meteoros. Até dois anos atrás, quase ninguém tinha ouvido falar dela. A artista inclusive relançou seu primeiro LP, I Love My Mom, de 2018, em 2021, meio que como uma maneira de chamar atenção para seu segundo disco, que sairia logo depois. Funcionou.
Para a nossa sorte.
Any Shape You Take era o disco que 2021 pedia: um trabalho sobre morte, dor, superação, juventude e união. Um disco de rock, mas que começa com um autotune distorcendo a voz de Índigo e um beat quase dançante. Um disco que se mete nas profundezas das paixões bipolares (como na maravilhosa Cry/Die), para depois se recobrar em esperança e ternura (como no single Hold U). Um disco que mostra uma artista iniciante, com banca de grande compositora. Inovadora, também, diga-se. Indigo vai de Courtney Love a Frank Ocean em poucos compassos, como na melhor faixa do álbum, que ela deixa felizmente para o final; Kill Me fecha o disco de maneira sublime. Meio indie pop, meio grunge. Meio sarcástica, meio (constrangedoramente) honesta. Uma música que resume o álbum, responsável pelo posto de um dos trabalhos mais surpreendentes e novos dos últimos anos.
3. Grouper - Shade
Há mais de uma década, Liz Harris lança, sob a alcunha de Grouper, discos intimistas, experimentais e essencialmente lofi. A artista tem suas marcas próprias: canções que afundam seus vocais em camadas de ruídos, noise, e muito reverb. Também costuma, nos shows, tocar sua guitarra sentada de pernas cruzadas no chão, rodeada de cabos, pedais e equipamentos. É tudo muito genuíno e alternativo ao redor de Liz Harris, mas em Shade é a primeira vez, em disco, que sua proposta parece clara o suficiente.
Quase se ouve sua voz (dá até pra entender partes da letra) em peças escandalosamente bonitas como Pale Interiors e The Way Her Hair Falls. Essa última resume tudo que eu mais amo na obra da Grouper: uma melodia inspirada, um violão minimalista, gravado “de perto” (ouve-se até o raspar dos dedos nas cordas do instrumento), os vocais, sutis e enterrados … Mas há algo a mais aqui; após repetir os versos 3 vezes, a artista parece errar as notas e, sem cortar o take, emendar as correções. É espontâneo, real, minimalista, direto e profundamente processual. Isso tudo, claro, adornado por melodias que parecem ter saído de uma sinfonia lofi celestial.
Se eu coloco esse disco na 3º posição, é por pura competência dos “concorrentes” do pódio. No meu coração, a cada audição que faço de Shade surge um grito interno, que diz: é esse o álbum do ano, porra. Pode não ser, mas no fim das contas, é o que mais me toca na intimidade e nas minhas idiossincrasias.
2. Spirit Of The Beehive - ENTERTAINMENT/DEATH
Este disco é estranho. E ainda bem! Lá pela terceira audição, já acostumado com as muitas camadas de fundo em canções belíssimas como The Server Is Immersed e Give Up Your Life, eu já estava completamente entregue. Trata-se de uma obra densa e rica, mas também extremamente simples. Um disco que retoma uma espécie de “legado interrompido” do indie dos anos 2000, muitas vezes imerso no (péssimo) rótulo freak-folk. Em função disso, talvez, lembre bandas como Dirty Projectors, Grizzly Bear e, principalmente, Animal Collective. Sobre esta última, as associações são bem claras, e ficaram marcadas recentemente pelo remix de Avey Tare para o último single do álbum da jovem banda. Wrong Circle é, talvez, a faixa onde a influência fica mais evidente: os violões graves e o vocal remontam bastante aos delírios estéticos inspirados de Avey Tare e companhia.
Mas Spirit Of The Beehive tem sua própria identidade. Nítida, por exemplo, em canções absurdas (em inúmeros sentidos) como I Suck The Devil ́s Cock, construída em três partes praticamente avulsas, que se conectam incrivelmente bem. Uma das melhores canções do ano. O disco, como um todo, segue essa linha entre o inusitado e o instigante. Se, como nas já citadas The Server Is Immersed, Give Up Your Life, ou na provocativa There's Nothing You Can't Do, as experimentações e texturas abrem espaço para belas melodias (tipicamente indie) e letras políticas e críticas da classe média estadunidense, é porque a banda sabe exatamente onde está pisando. E promete, com muito talento e sem medo de errar, levar o indie a novos patamares. Afinal, trata-se de um som que parece, por vezes, muito familiar, mas que sempre desperta alguma estranheza, projetando algo de novo para o rock alternativo underground.
1. Dry Cleaning - New Long Leg
Vamos começar do começo. Dry Cleaning é uma banda londrina estreante, que lançou seu debut em 2021 pela 4AD (casa de tantas bandas clássicas e indispensáveis do indie, como Pixies, The Breeders e, mais recentemente, Big Thief). Sim, é um debut. Eu não me lembro, nos anos recentes, de ter ouvido um disco de estreia tão consistente.
É claro que não faltam referências aqui (inclusive ligadas a uma certa tradição da 4AD). Com um conjunto básico e mortífero composto por guitarra, baixo, bateria e vocais declamados, superficialmente o que vêm à mente são, claro, as clássicas: um pouquinho de Pixies aqui, Dinossaur Jr. ali, uma relação forte com Sonic Youth (talvez em função das declamações “retas” e esquisitíssimas da vocalista, Florence Shaw) … até Patti Smith vem à mente. Mas o diferencial da banda é o melhor conjunto melódico instrumental que eu ouço em um bom tempo, com destaque enorme para as guitarras de Tom Dowse. Seus riffs seguram as músicas com destreza, e apontam para uma certa tradição de “guitarras britânicas”: de Johnny Marr a Bernard Butler e Graham Coxon.
A inusitada conexão com o britpop, a partir de uma sonoridade à princípio tão indie “crua” (mais associada, claro, às bandas clássicas que cito acima), é uma marca particular desse grupo, e talvez revele um pouco porque eles soam tão originais, apesar de não fazerem nada tão diferente assim. É apenas rock alternativo, simples, direto. Claro que o estilo vocal declamado (com letras incríveis, by the way) abre caminhos para que a cozinha instrumental conduza o ritmo e, ao mesmo tempo, defina os principais elementos melódicos das canções (daí o destaque aos riffs tão simples e marcantes da guitarra).
New Long Leg é absurdo, por tudo isso, e mais: A síntese, o conjunto, o charme, a performance da lânguida, estranha e talentosíssima Florence … Elementos todos absolutamente explícitos, por exemplo, em Scratchcard Lanyard, a faixa de abertura que é, pra mim, a melhor música de 2021. O disco tem outros destaques inesquecíveis, como Unsmart Ladies, Her Hippo ou a homônima New Long Leg, mas é, de novo, o conjunto que faz o trabalho.
Destaques Nacionais:
Don L - Roiteiro Para Aïnouz (Vol. 2)
Maiara & Maraisa e Marília Mendonça - Patroas 35%
Dada Hotel - Dilúvio / Deserto
Sonora Fantasma - Adeus Mundo Véio
Juçara Marçal - Delta Estácio Blues
Pabllo Vittar - Batidão Tropical
Fernando Motta - Ensaio pra Destruir
Mineiros da Lua - Memórias do Mundo Real
Charlotte Matou um Cara - Atentas
Crianças Católicas - Crianças Católicas EP
Destaques do ano passado que eu perdi, mas que reverberaram muito em 2021 e precisam ser lembrados:
MÁRCIO VIANA
Talvez seja pelo turbilhão em que fomos jogados já faz algum tempo, a quebra de alguns padrões aos quais estávamos acostumados - ouvir música no transporte público, por exemplo - e a construção de alguns outros, mas o fato é que para mim foi bem mais difícil tomar pé dos lançamentos de 2021, a ponto de eu achar que seria um ano fraco de lançamentos. Isso mudou quando comecei a pesquisar o que tinha saído e o que eu tinha escutado neste ano, e me caiu a ficha de que eu ouvi muita coisa. Aí o trabalho de seleção ficou mais difícil.
Bom, mas sempre existem as zonas de conforto, e a gente apela pro clubismo. É claro que mesmo o clubismo tem seus percalços, já que nem sempre nossos artistas preferidos produzem coisas memoráveis.
Se eu tivesse que definir minha seleção de melhores do ano e menções honrosas com uma cor, ela seria azul: além dos discos de blues que sempre escolho como porto seguro, em minha lista há vários álbuns cuja capa é desta cor, e um deles também tem blue no nome.
É o Cheap Trick sendo Cheap Trick, e ainda bem que é assim. É uma banda que não precisa se reinventar, a gente gosta que eles se repitam, e aqui tem mais do mesmo de uma qualidade muito boa. Another World é a baladinha pra acender o isqueiro nos shows.
Sem poder excursionar para promover seu disco de 2020, La Conquista del Espacio, Fito Páez resolveu criar uma trilogia, que começa com este Los Años Salvajes, passará por um disco instrumental com uma orquestra tcheca e culminará num álbum de piano e voz. Este aqui, mais rock and roll, chega bastante inspirado e focado na insatisfação pelas questões sociais da Argentina dos últimos anos.
Me sinto bastante representado pelos comentários feitos pelos colegas a respeito do álbum e da artista, e acrescento que em muitos momentos desse disco a voz me lembrou a Kim Carnes, de Bette Davis Eyes, com um toque de Regina Spektor, talvez.
Se o Black Country, New Road fosse um time de futebol, os jogadores entrariam em campo de terno. É pós punk pra quase ninguém botar defeito, e esse EP de seis faixas agrada bastante pela versatilidade. Vez ou outra botam um peso nas guitarras que soa meio grunge, mas a essência tá ali entre o fim da década de 70 e início dos 80.
Não é exatamente material novo, mas regravações para a trilha da série argentina Okupas, que entrou no catálogo da Netflix recentemente. Serve como cartão de visitas para quem não conhece a banda e como uma renovação para quem conhece as versões originais.
O Royal Blood me agradou muito com este álbum por conta dos riffs inspirados, ladeados pela sonoridade moderna. Termina mansinho com All we Have is Now.
Native Sons faz jus ao nome: o Los Lobos, que você deve se lembrar pela trilha de La Bamba, aqui paga tributo aos artistas de Los Angeles, incluindo Jackson Browne, The Beach Boys e Buffalo Springfield.
Eu gosto muito dessa dinâmica "pluga o instrumento, liga o gravador e sai tocando". Aqui, o duo e seus músicos de apoio homenageiam o blues do Mississipi com uma qualidade de som impressionante.
Faltou muito pouco pra esse disco pular para a lista de cima e desbancar algum outro álbum. É blues do Mississipi por quem manja do riscado. Não tem como não se emocionar com Love You Forever, que fecha o disco mostrando o imenso alcance vocal de Cedric Burnside.
Foi inevitável conhecer essa cantora galesa por intermédio de sua colaboração com os conterrâneos dos Manic Street Preachers. Na mistura de The Art of Losing, auto-irônico desde o título, entram o pop oitentista, o krautrock e aquele experimentalismo a la Scott Walker.
10. Fresno - Vou Ter Que Me Virar
Nunca tive muita identificação com a Fresno, apesar de reconhecer sua importância, sobretudo nos trabalhos mais recentes. As coisas começaram a mudar nesse sentido no disco anterior, Sua Alegria Foi Cancelada, e para minha surpresa, Vou Ter Que me Virar me ganhou logo de cara.
Mais direto que seu antecessor, o álbum traz algumas boas sacadas, como Já Faz Tanto Tempo, com participação de Lulu Santos, que faz da canção uma obra sua. Ponto positivo também por marcarem posição em canções cono FUDEU!!! e ELES ODEIAM GENTE COMO NÓS (em caixa-alta mesmo). Bacana que tenha gente mainstream chamando fascismo pelo nome neste momento em que ele mostra os dentes.
Destaco ainda Casa Assombrada. De negativo, achei a letra de Caminho Não Tem Fim repetitiva e pouco inspirada. Mas é certamente um disco importante para nossos tempos.
9. Jillette Johnson - It's a beautiful day and i love you
Jillette Johnson compõe desde os oito anos de idade. It’s a Beautiful Day and I Love You é seu terceiro disco, e possivelmente o mais coeso. Apesar disso, é um álbum de canções. E que canções!
O álbum abre com Many Moons, naquele clima psicodélico de seu piano e texturas, para ir ao longo de seus pouco mais de 30 minutos passear por estilos como o country pop em Annie, o soul em Graveyard Boyfriend, o rock alternativo com acento pop-rock em Jealous e uma pegada bluesy em What Would Jesus Do (essa, a melhor do disco).
Lembra os melhores momentos de Sheryl Crow, especialmente do disco The Globe Sessions, se me permitem a comparação.
8. Jerry Cantrell - Brighten
Vou me juntar ao Bruno Leo no clubismo e dizer que Jerry Cantrell acertou em cheio em Brighten. A parada aqui, um pouco mais hard rock do que o trabalho com o Alice in Chains, justifica a presença de Duff McKagan em algumas faixas, e pode agradar mesmo quem não é muito fã dos sons da banda liderada por Cantrell.
Black Hearts And Evil Done é uma balada e tanto! Prism of Doubt, a antecessora, também vem com um estilo balada country muito agradável. Bom disco pra se ouvir num sábado à tarde tomando uísque. Discaço.
7. Vapors of Morphine - Fear & Fantasy
Formada em 2009 pelos ex-integrantes do Morphine, o saxofonista Dana Colley e o baterista Jerome Deupree, cerca de dez anos após a morte do líder Mark Sandman, o Vapors of Morphine completou-se com a entrada do baixinho Jeremy Lyons, multi-instrumentista que acabou por aprender a tocar o baixo de duas cordas tal qual seu antecessor e juntou-se à banda para seguir tocando o repertório dos álbuns, além de novos sons.
O timbre vocal de Jeremy Lyons, aliás, é muito parecido com o de Sandman, o que trouxe bastante familiaridade para os fãs, que aparentemente aceitaram bem o que o trio ofereceu desde sua formação. A banda esteve no Brasil em três ocasiões, e pude acompanhar duas delas, em 2014 e em 2017.
Dito isso, o Vapors of Morphine em seu novo álbum, Fear & Fantasy, o trio explora, além da sonoridade vinda da banda original, outras influências e elementos. Lyons por exemplo toca outros instrumentos além do baixo de duas cordas, uma limitação de Sandman que acabou por virar uma referência. E os sons graves, do baixo e do sax barítono, também dividem espaço com sons mais agudos, tanto de cordas quanto de sopros.
Outra novidade, esta ainda mais significativa, fica por conta da anunciada saída de Jerome Deupree, substituído por Tom Arey. A mudança, no entanto, não é brusca: nos dois lados do disco físico, cada baterista tem o seu momento: Deupree toca em todo o lado A, e o B fica a cargo de Arey. Para a linguagem do streaming, isso representa que o baterista original toca nas 5 primeiras faixas, enquanto o novo baterista toca nas 7 seguintes.
6. Mdou Moctar - Afrique Victime
O blues do deserto é um gênero que ainda pretendemos explorar muito em nossas pesquisas, e um bom começo é esse disco fantástico, que derruba todo o conceito ocidental de música tonal e cromática, bota a guitarra pra cantar e faz a gente embarcar numa viagem musical até o Saara.
Antes de botar o turbante e montar no camelo, esqueça tudo o que aprendeu sobre melodia e harmonia. O artista conduz as canções com sua guitarra e o resto vem na cola.
5. St. Vincent - Daddy's Home
Gosto muito do modo como a Annie Clark lida com a guitarra, principalmente em relação à escolha dos timbres e efeitos, na maior parte das vezes com uma sonoridade mais puxada para o eletrônico. Isso, aliado às harmonias que ela produz e as influências que passeiam por Bowie, Beatles, Prince, um pouco de synthpop oitentista e soul/funk setentista, transforma seu trabalho em algo único. Em Daddy's Home ela abre uma caixa de recordações da infância e a envolve com estes sons. Pay Your Way in Pain, a faixa de abertura, meio que serve como spoiler do que se pode esperar ao longo das 14 faixas.
4. Tigercub - As Blue as Indigo
Descrevo o Tigercub como uma espécie de Muse que tenha colocado um guitarrista e um baterista de heavy metal (talvez uma cruza de Muse com Helmet).
O destaque inevitável é para Stop Beating on My Heart (Like a Bass Drum), tanto no título maravilhoso quanto na sonoridade, aquela coisa de misturar a calmaria com o som pesado e apoteótico.
Sleepwalker, por sua vez, é mais peso quase o tempo todo, enquanto Funeral é suavidade pura, com direito a assobio. E vai assim do início ao fim do disco, com alguns momentos emulando o melhor do som grunge até.
3. Manic Street Preachers - The Ultra Vivid Lament
Quem já conhece o Manic Street Preachers não vai ter surpresas neste disco. O grupo continua mesclando aquela sonoridade indie com melodias que remetem ao rock de arena. Nada disso é demérito, principalmente porque o trio galês continua afiado na habilidade para fazer boas canções e caprichar nos temas políticos, sendo o maior exemplo a faixa Orwellian, falando sobre a distopia em tempo real que o mundo vem se tornando nos últimos tempos. The Secret He Had Missed, com participação de Julia Cummings, segue uma tradição da banda de trazer cantoras para dividir vocais, como já feito antes com Nina Persson ou The Anchoress. Neste álbum, fazem também um dueto marcante com Mark Lanegan em Blank Diary Entry, minha predileta do disco. Excelente trilha sonora para nossos difíceis dias.
2. Carolina Donati - Arde
Descobri muito recentemente a música de Carolina Donati. Ainda que nós do Silêncio no Estúdio tenhamos tentado ao longo destes anos manter sempre o ouvido atento ao que está tão perto de nós, nos países vizinhos, é impressionante como as coisas chegam fragmentadas por aqui. Mas dessa vez o universo conspirou, e trouxe até mim um dos discos do ano.
Arde é o segundo disco da argentina, onde a cantora retoma o que iniciou em seu álbum de 2019, Lo Que Quedó, também com oito faixas.
Aqui, no entanto, Carolina vai mais além do indie-pop iniciado na jornada anterior, incorporando elementos de pop-rock que lembram os anos 80, umas guitarras com fuzz agradabilíssimas e traz até algumas referências à sonoridade dos Beatles, principalmente no encerramento, com Lo Que Viene Después, canção que não faria feio no repertório do Skank ou até mesmo no de Erasmo Carlos, já que - até um pouco por eu ter mergulhado na discografia do Gigante Gentil recentemente - é possível detectar na canção aquela simplicidade que é característica marcante na obra de Erasmo.
Mas não quero me prender tanto a comparações: a obra da artista vence por si só, tanto pela riqueza das composições quanto pela beleza dos vocais. A audição de Arde me levou a buscar o trabalho anterior, e isso representa muito no meu modo de lidar com a música. Carolina Donati veio para ficar entre minhas artistas favoritas, e eu espero que entre as suas também.
1. Bonifrate - Corisco
O nome Corisco remete a um cangaceiro do bando de Lampião. Porém, em sua concepção original, corisco tem relação com raios, e é inspirado nisso que Pedro Bonifrate narra na parte 1 da faixa-título a visão de uma tempestade elétrica, vista de sua casa em Paraty, no Rio de Janeiro. Casa esta que foi onde o cantor e multiinstrumentista, ex-Supercordas, gravou sozinho o disco, uma coleção de dez canções que alternam entre o caos da citada faixa que dá nome ao trabalho e a tranquilidade (e uma certa psicodelia) em músicas como Cara de Pano e Lunário.
Há espaço ainda para o rock basicão Grande Nó, com participação da cantora Betina, o único aceno para uma participação externa, mas nada que seja muito convencional: os vocais só aparecem aos dois minutos da canção, que tem redondos nove de duração.
Corisco começou a ser pensado pelo cantor há cinco anos, uma característica comum em Bonifrate, se formos ler os releases de seus discos anteriores. Talvez o artista sinta esta necessidade de deixar as canções maturando. Em tempos de isolamento forçado e diante de uma necessidade inadiável de repensar todos os nossos processos, quem é que pode condená-lo por dar tempo ao tempo?
Minha escolha desse disco como o maior de 2021 se deu por sentir que Bonifrate, assim como Fiona Apple no ano passado, parece muito familiarizado com esta situação de isolamento. Ambos fizeram muito com a estrutura que criaram para gravar discos em casa.
Destaque Nacional
Dario Julio & Os Franciscanos - Suíte Bipolar em Dó Maior
Dario Julio & Os Franciscanos - Suíte Bipolar em Dó Maior
Dada Hotel - Dilúvio / Deserto
Felipe dos Santos - Meu Amigo Tilelê Diz Que Sou Brega, Mas Eu Acho Isso Meio Problemático
RoliMan - Queria Ser Lô Borges (Mas Sou Só Lo-Fi)
João Donato e Jards Macalé - Síntese do Lance
BRUNNO LOPEZ
Se em 2020 a expectativa das produções artísticas era da altura do Burj Khalifa, neste ano, a impressão que se tem é que muitas bandas escreveram e lançaram apenas pra sobreviver, sem necessariamente terem algo substancial a dizer. Felizmente, isso não impediu de encontrarmos trabalhos capazes de desafiar o comum e provocar aquela sensação única de deslumbramento com algo genuinamente novo.
Tivemos retornos grandiosos e alguns debutes brilhantes, trazendo aquela esperança de continuidade em alto nível, além é claro de contribuir para a árdua tarefa de conquistar novos fãs dentro de um universo que sente uma brutal dificuldade de se despregar de seus dinossauros sonoros.
Vários gêneros reverberaram no mainstream, porém, não causaram o entusiasmo suficiente para adentrarem nesta lista de variação bem tímida nos estilos, priorizando - curiosamente ou não - artistas que transitam entre o Hard Rock, o Pop e o Prog. Esses três elementos são poderosos quando utilizados inteligente juntos.
Vivemos anos particularmente pesados, então, é quase que inevitável despejar nossas frustrações no abraço sincero de um disco bem feito. Ou num EP de quatro canções.
Desde a saída de Guilherme de Sá, a banda mais exponencial da esfera católica do país mudou um pouco a sua forma de abordagem, principalmente nas letras. O novo e competente vocalista Bruno Faglioni resgatou um pouco do foco dos discursos para a forma que a banda escrevia lá no seu início, sendo mais direto.
Em Baile das Máscaras, a banda volta a visitar as profundidades densas que Guilherme, com poesia mais marcante e um vocal que até ventila um pouco os ares do antigo frontman.
O pop punk é uma esteira muito disputada entre grandes nomes do gênero, desde que o estilo fervilhou. O We The Kings, com seus 15 anos de existência, já figurava com reconhecida autoridade nesse cenário e aproveitou este feito para trazer novamente os holofotes para a banda.
Saga é um EP de seis faixas, com cada uma refletindo cronologicamente o som da banda em sua respectiva época. O resultado não poderia ser mais positivo, afinal, revisitar tudo o que se passou com a refrescância de um material totalmente novo é quase o melhor dos mundos.
E o melhor dos mundos mesmo, é a absurdamente viciante “No 1 Like U”, que transporta a todos para os dourados anos 90 e sua atmosfera única. Dizem que a maioria das máquinas do tempo vão sempre para essa década.
Não à toa, cá estamos todos nós, só que em 2021. O pop punk segue fervilhante em nossos tempos, e o We The Kings segura essa coroa, evidentemente.
Uma sequência do Temple of Shadows é o tipo de acontecimento tão aguardado quanto As Branquelas 2, mas nem o Angra nem o Latrell conseguiram fazer esse delírio se tornar realidade. Honestamente, chamar Vera Cruz de uma continuação do álbum lendário da banda brasileira é não ser justo com todas as camadas que o disco atual oferece.
A atmosfera virtuosa pode até transitar em alguns momentos, mas a obra do vocalista é densa e representa um marco importante no metal nacional, sendo gravado nos estúdios do renomado produtor Liminha.
É, no mínimo, indispensável.
A Suécia trouxe um representante muito competente para tremular a bandeira do Hard Rock contemporâneo. O som poderoso e ao mesmo tempo acessível do debute desse grupo nasce de um curioso processo de composição da banda, que gosta de criar músicas pop para depois colocá-las na roupagem de rock. A receita pode não ser inédita, mas o resultado alcançado nas canções é refrescante.
Uma banda que consegue tirar Noel Gallagher do topo das paradas com um single aparentemente despretensioso já merece uma atenção diferenciada. Ainda mais se tratando de um debute. Mas essa banda galesa cria um som delicioso de ouvir e em alguns momentos pode fazer inveja aos momentos mais emocionantes do City And Colour.
O single "Tell Me How It Feels" é impressionante por si só, porém, quando nos debruçamos sobre as outras 3 canções do EP homônimo, descobrimos o motivo desses caras tirarem o eterno guitarrista do Oasis do lugar mais alto dos charts.
15. Anneke Van Giersbergen - The Darkest Skies Are The Brightest
Se o The Cure um dia fosse explicar a razão do nome da banda, a resposta seria a voz da Anneke Van Giersbergen. Ela tem o poder de curar, com apenas uma nota de suas adoráveis cordas vocais. É até ofensivo que uma cantora tão notável nunca tenha sido mencionada em nenhuma premiação - e se os motivos são seus trabalhos pouco mainstream voltados ao metal, aqui em The Darkest Skies Are The Brightest, essa desculpa termina.
Impecável, lindo, denso e, evidentemente, capaz de curar. Quem sabe até a indústria?
Seria exagero dizer que o filho da estrela se transformou no filho do soul? É bem provável que sim. De qualquer forma, a performance do frontman do Kiss flutuando por ares bem diferentes do Hark Rock é digna de uma profunda admiração. Seu timbre se encaixa com rara facilidade na interpretação de grandes clássicos do gênero, tornando a audição contagiante do início ao fim. Tem como não gostar de Paul Stanley?
A quarentena foi o combustível de muitos dos materiais que figuram nas listas de melhores por aí. Com Myles Kennedy, a história não foi diferente. Sem poder se apresentar com o Alter Bridge ou fazendo suas turnês com o Slash,o inconfundível vocalista aproveitou esse tempo de reclusão obrigatória (e necessária) pra escrever e gravar a tão esperada continuação do seu álbum solo de estreia, o Year of the Tiger.
Se no disco debute vimos uma retrospectiva da sua infância, em Ides of March encontramos um material muito reflexivo, mostrando como foi o período de 2020 pra todos nós.
As canções refletem justamente essas emoções inéditas que experimentamos.
Esse processo veio com uma sonoridade que misturou rock, blues e até country. É interessante perceber que, mesmo flexionando suas cordas vocais para outros gêneros, sua voz segue soando com a peculiaridade que lhe conferiu toda a sua notoriedade, encaixando-se em meio a doses saudáveis de slide de guitarra e letras no já comum storytelling.
São onze faixas muito inspiradas que trazem toda a personalidade que se espera de alguém tão versátil e produtivo.
Se esse ano pedia um hino, a música que dá nome ao álbum tem 7 minutos de um novo clássico do rock contemporâneo.
Soa pretensão dizer que um single é capaz de segurar um disco inteiro e render reverências incessantes em seus cinco minutos e vinte segundos de duração? A resposta seria não, mesmo que Hushed and Grim fosse apenas formado pela impecável “Teardrinker”.
O Mastodon elevou o sarrafo nessa produção, que veio com qualidade absurda e a temática envolta numa tristeza de beleza incomum, muito em razão ter sido criado na atmosfera da perda do empresário da banda, Nick John.
Em linhas gerais, é um autêntico soco profundo, denso e admiravelmente belo. Tanto que não é nenhum exagero posicioná-lo entre os melhores de sua própria história.
Supergrupos carregam sempre a responsabilidade de criarem algo grandioso. E aqui, não foi nem um pouco diferente. A união de Jeff Scott Sotto e Robert Sall mostrou-se gloriosa, levando o Hard Rock e o AOR para um estágio próprio.
Não é exagero dizer que este material representa a evolução dentro desse estilo, reunindo todos os elementos clássicos e maturando cada um deles para uma nova direção.
10. Concrete Castles - Wish I Missed U
Quem olhar distraído pode pensar que se trata de um lançamento do Rhapsody, ainda que o nome deste álbum tenha total inclinação para algo que o grupo italiano costuma fazer dentro de sua cena musical. Só que não. Trato aqui de uma banda de rock alternativo (?) da Pensylvânia que, assim como The Killers e Imagine Dragons, começou fazendo covers e marcando presença nas plataformas sociais, com mais de 1 milhão de inscritos no Youtube, por exemplo.
Ainda bem que eles não decidiram ficar apenas criando versões de canções de outros artistas. O trio mostrou com excelência que podia ir além dessas releituras e apresentou uma material autoral inspiradíssimo. E essa energia é percebida logo no single que batiza o disco, a viciante “Wish I Missed U”, que soa como um equilíbrio ousado entre aquele pop de bom gosto com o rock mais contemporâneo.
É evidente que rotular sempre limita mais do que exemplifica, portanto, talvez seja mais adequado imaginar que o som do grupo é apenas a mistura do que os integrantes cresceram ouvindo individualmente. Logo, o Concrete Castles tem no alicerce de sua fortaleza sonora o country da vocalista Audra Miller, passando pelo glorioso Hard Rock oitentista do guitarrista Matt Yost e terminando no classic rock e amo do baterista Sam Gilman.
Fato é que, independente de todo esse panorama de influências, a audição deste álbum mostra claramente que os três jovens possuem potencial suficiente para irem adiante do atual debute. Que é brilhante.
9. Styx - Crash Of The Crown
Este disco é ouro por suas transições que provocam sensações inesperadas, como se cristalizássemos os melhores momentos do Deep Purple, misturando com instantes geniais do Queen com tudo pulsando dentro da harmonia de um prog levemente setentista, só que moderno. E muito estiloso.
Só os arranjos de bateria já merecem aplausos isolados, de pé.
Até o mais pessimista daria 10/10. Os realistas dariam 11/10.
8. Smith/Kotzen - Smith/Kotzen
Esse lançamento poderia se chamar queijo branco com goiabada. Ou arroz e feijão. Ou frango com catupiry. Ou coca-cola gelada com limão e gelo. Fato é que a combinação desses dois soa perfeita do início ao fim e deveria se tornar uma expressão popular para andar lado a lado com estes outros exemplos.
Além das técnicas já admiráveis dos dois nas cordas, impressiona a qualidade dos vocais do eterno guitarrista do Iron Maiden. Um timbre que balanceia com sucesso ao já impressionante registro sonoro de Kotzen. 2021 precisava exatamente desse tipo de sonoridade com esse tipo de parceria. Depois de Allen/Lande, essa é a junção mais impressionante que o universo rock/metal pôde contemplar.
7. The Night Flight Orchestra - Aeromantic II
Essa banda é uma viagem irresistível no tempo, fazendo você se sentir em discotecas dos anos 70, mas com um toque de rock e demais elementos viciantes. Apesar desse direcionamento bem marcante, as faixas também conseguem soar peculiares, viajando para outras épocas com suas junções geniais de atmosferas. Destaque para "I Will Try" que tem a ousadia de misturar Journey, Genesis e uma toque especial de Tina Turner em sua concepção.
Agora, uma das músicas mais sensacionais desse disco é, sem dúvidas, "Amber Through a Window".
6. Thank You Scientist - Plague Accommodations
São raras bandas conseguem o feito quase impossível de soarem únicas. Mas únicas de verdade, sem parecer emular este ou aquele som. Esta é a razão do Thank You Scientist existir, sobrevivendo com elegância e virtuosidade dentro de um universo sonoro cada vez mais entediante e carregado de fórmulas preguiçosas de sucesso.
Por mais que eles continuem passeando livremente pela musicalidade exacerbada que edifica sua arte, a banda conseguiu, em apenas quatro atos, causar aquela sensação de deslumbramento misturada com endorfina.
É impossível não se impressionar com o prog/jazz/funk/rock que se intercalam pelas faixas, fazendo com que cada uma delas sejam verdadeiras viagens impossíveis de se prever o destino final.
Plague Accommodations é mais uma daquelas obras de arte que foram construídas durante a pandemia e que, com toda certeza, serão reverenciadas nesse futuro incerto para o qual todos estamos nos direcionando.
5. Leprous - Aphelion
Imagine que você está navegando numa embarcação de prog metal e avista um imponente iceberg nessa jornada. Este elemento tão característico em outras narrativas cinematográficas representa aqui, unicamente, este trabalho da competente banda norueguesa Leprous.
Em Aphelion, observando a superfície, enxergamos toda a consistência original e estimulante da sua musicalidade, com um exagero compreensível de beleza instrumental e composições que brincam com o significado da palavra impactante. Mas aí, quando mergulhamos um pouco mais, nos deparamos com uma quantidade gigantesca de trabalho pesado, toneladas de emoção e uma extensão imponente de criatividade que sustenta todo o monumento do produto final. Estes aspectos são um brilho único à toda expansão sonora que a banda experimenta desde o seu surgimento.
Ainda que o prog seja sua correnteza mais segura, não soa nem um pouco prepotente afirmar que, agora, eles fluíram para afluentes mais amplos, levando suas ondas para praias mais distantes. O estilo continua lá, só que dessa vez explora possibilidades além da zona de conforto, construindo ideias que dão braçadas pelo pop sem perder o fôlego no som desafiador que moldou o grupo.
Neste ponto, estamos diante de um disco que traz faixas equilibradas e elegantes. Com a união de componentes orquestrais intensificados com a sutileza já natural da banda, tudo se mistura com a magnitude vocal e, por que não, vulnerabilidade emocional do vocalista Einar Solberg.
Um material com virtudes distintas para ouvintes exigentes e também apreciadores casuais.
4. Lilith Czar - Created From Filth And Dust
Artistas são exemplos ambulantes de metamorfoses intermináveis. Às vezes, algumas de suas versões fazem mais sentido que outras e acabam prendendo de vez até os ouvintes mais distraídos. É o caso aqui.
Poderia estar falando de Juliet Simms. Talvez, de certa forma, eu esteja, mesmo que ela não seja mais conhecida assim. Hoje, ela é Lilith Czar e Created From Filth And Dust é sua contribuição autêntica para a esteira gigantesca de álbuns necessários para fazer valer a pena o sentido da audição.
Ela é a minha Donna Missal de 2021. Uma voz que desafia o mainstream preguiçoso e grita para se posicionar entre tantos sussurros subestimados. O universo musical precisa de ousadias assim: diretas, intensas e genuínas.
"Edge of Seventeen" é um hino incontestável que reverberaria sem fronteiras se fosse interpretado por quaisquer cantoras mais hypadas. Mas, de certa forma, é até melhor que não sejam. Assim, a descoberta se torna muito mais saborosa.
3. Reach - The Promise Of Life
Alguns seres humanos mais emocionados poderiam tentar sintetizar o trabalho do grupo sueco como uma fusão de Muse e Queen num liquidificador bivolt. Tal vitamina não seria algo irrecusável de se tomar no café da manhã, muito pelo contrário - conheço pessoas que adorariam acordar com tanta riqueza de ingredientes batidos em máxima potência e, evidentemente, em alto volume.
Mas a verdade é que o Reach abusa de influências e consegue criar um álbum energético, com construções que transitam por vários estilos e podem capturar ouvintes de várias cenas. Em alguns momentos, parecem ser um Panic! At The Disco com mais overdrive e não causaria nenhuma surpresa se Brendon Urie estiver em todas as pistas VIP dos shows deles.
Intercalando todas essas camadas plugadas de rock tradicional juntamente com passagens quase que teatrais, este álbum é definitivamente uma das melhores surpresas de 2021. Temos melodias inteligentes, refrões cativantes e um vocalista com a versatilidade cobiçada por tantos outros cantores que buscam um bom alcance vocal, um timbre chamativo e o carisma indispensável para transformar simples intérpretes em frontmans incontestáveis.
Se Higher Ground não estiver em nenhuma daquelas playlists de melhores músicas disso ou daquilo, desconfie de quem faz as playlists. Aqui, The Promise of Life está entre os 3 melhores discos desse ano.
2. Helloween - Helloween
O universo musical nem sempre é justo, e no metal a coisa tende a ficar ainda pior.
Só que a grandiosidade de uma banda não se importa com os rótulos e permanece firme para fazer, além de música, história.
Este álbum homônimo do Helloween é uma arma apontada para a cara do destino, atirando sem parar. E acerta tudo! Tudo, absolutamente tudo.
Quando Deris, Kiske e até Kai cantam juntos, o impossível é apenas uma palavra sem significado. Este disco é um legado, um presente, a oitava chave dos Keepers.
Num ano em que foi difícil colocar sorrisos na boca das pessoas, o Heavy Happy Helloween nunca foi tão necessário e assertivo.
Mesmo que nichado, o Helloween mostra que a maior banda de metal (não só da Alemanha) continua viva.
1. RA - Intercorrupted
Uma banda com apenas duas letras e um alfabeto inteiro de canções deslumbrantes. Um disco que consegue equilibrar virtuosidade com melodias invejáveis. Intercorrupted é de longe o melhor registro de um artista em 2021.
Chega a ser assustador a forma que as músicas favoritas vão mudando à medida que as faixas vão passando, é a sensação máxima de algo realmente encantador. Você simplesmente não sabe qual escolher, tal qual um baterista numa loja da DW.
Os integrantes do Ra, que existe desde 1996, ficaram inativos por seis anos desde o último disco e escolheram este ano para entregar esta obra-prima quase impossível de se classificar nas esferas musicais.
A inteligência de construir linhas melódicas que invejariam os maiores hitmakers do pop mescladas com arranjos imprevisíveis que fariam os dinossauros do prog assentirem com a cabeça positivamente faz desse material algo único.
"Let's Go To Mexico" é uma das coisas mais maravilhosas já compostas nos últimos tempos. Poderia ser tranquilamente a melhor música do ano. Mas aí chegamos a "Let it Lie" e somos obrigados a mudar de opinião. E depois, chega "Somewhere Beautiful" e percebemos que eles quebraram todas as estruturas de composição, criando um refrão absurdamente lindo seguido de uma sequência de viradas descompassadas do baterista Skoota Warner.
Numa época em que não temos saúde mental pra esperar muita coisa de coisa nenhuma, surpresas como essas são revigorantes e fazem a gente seguir na teimosia de acreditar que ainda é possível nos emocionarmos com o que ainda não conhecemos.
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